Desde a virada do século entrava ano e saia ano e nada de surgir uma obra gay do cinema brasileiro. A primeira a figurar nesta década foi o visceral "Madame Satã", produzido em 2002 e dirigido pelo diretor cearense Karim Ainouz. Mas, depois deste, nada mais. Éramos obrigados a nos contentar com as obras estrangeiras.
Até países como Israel produziam inúmeros longas com a temática homossexual. Podemos destacar "Buble", do diretor Eytan Fox, que retrata o amor entre um palestino e um soldado israelense. Em 2008 Israel chegou a produzir mais de dez filmes gays. E o Brasil, tido como libertino e sem controle religioso, nada.
Mas 2009 pode ser considerado o ano em que o cinema brasileiro saiu do armário. Foram nada menos que cinco produções longa-metragens que passaram pelas salas brasileiras. Estas obras fizeram com que especialistas debatessem o tema e que a questão homossexual fosse estampada nos cartazes dos saguões dos cinemas.
Foram eles: "Festa da Menina Morta", de Matheus Natchergaele; "Do começo ao Fim", de Aluizio Abranches; "Quanto Dura o Amor", de Roberto Moreira; "Meu Amigo Claudia", de Dácio Pinheiro e "Elvis e Madona", de Marcelo Laffitte. Estas produções além de representarem a diversidade sexual na sétima arte brazuca, também revelaram a diversidade temática.
Incesto. Dois filmes abordaram este espinhoso tema: "Festa da Menina Morta", que retrata a história de Santinho (Daniel Oliveira) figura andrógina e santificada pela população do vilarejo onde o filme é retratado e que mantém uma relação incestuosa com o pai (Jackson Antunes) ao assumir o lugar da mãe (Cássia Kiss) que morreu. O filme de Matheus faturou dois importantes prêmios: melhor filme de ficção pela APCA (Associação Paulista de Críticos e Artes) e melhor filme no festival de Rotterdam, na Holanda.
Sem prêmios, mas não menos polêmico, o outro filme a abordar o incesto foi "Do Começo ao Fim", que conta a historia dos irmãos Thomas (Gabriel Kaufman) e Francisco (Lucas Cotrim) que vivem uma perfeita história do amor. Antes de ser lançado, o filme deu o que falar e foi campeão de audiência no You Tube. Porém, quando conhecido ficou do público dividiu opiniões: uns disseram que faltou conflito, pois no filme os personagens vivem o incesto sem serem questionados, com se fosse cotidiano irmãos viverem juntos como um casal. Do outro lado das opiniões disseram que a história é sobre amor e ponto. O diretor saiu pela tangente, "meu filme é pós-tabu".
Urbanidade é a palavra que caracteriza os outros três filmes da produção cinematográfica gay brasileira. O sucinto "Quanto dura o amor" conta a história de três personagens que tentam vivenciar o amor, seja de que maneira for, na louca pauliceia. Sua abordagem chega a ser lírica. "Meu Amigo Claudia" não é uma obra de ficção, mas conta a magnífica história de Claudia Wonder, ícone underground da cultura gay dos anos 80 e 90.
"Elvis e Madona" provavelmente é o mais colorido de todos da lista. Gírias do mundinho, travestilidade como ela é, ou seja, o mundo gay mais próximo do real. As atuações de Igor Cotrim como a travesti Madona e Simone Spoladore como a lésbica Elvis estão impagáveis. Este filme, com ares almodovarianos, ainda vai dar o que falar. Pode escrever.
Podemos dizer que o cinema brasileiro demorou a sair do armário, mas quando resolveu se assumir fez bonito e com estilo. Não podemos deixar de registrar, no entanto, a dificuldade que todos os realizadores das obras descritas encontraram para fazer os seus filmes. Patrocinadores e distribuidores que não querem veicular o seu nome a produções cuja tema é a cultura LGBT.
A sétima arte brasileira se jogou de cabeça no arco-íris, visto que em 2010 teremos três produções LGBT. Em uma delas Carolina Ferraz irá interpretar uma travesti; Ana Paula Arósio será uma lésbica em "Como esquecer". Ainda teremos a bafoneira produção baseada nos escritos de Bruna Surfistinha, que se não chega a ser gay, é pra lá de simpatizante, ou queer, ou bi, vai saber…