Um e-mail na minha caixa postal, um contato telefônico, acertos de preço, local e evento e lá vai Cindy Butterfly borboletear em mais um evento. Pega o modelão, meias, salto… Melhor bota, maquiagem, picumã, cílios, uma estola de pena que não pode faltar… Fita adesiva pra fazer "a borboleta" (se é que me entendem!), grampos, unhas postiças e brilho… Muito brilho. Soca tudo em duas malas e lá vamos nós… É, não posso negar: ser drag queen é algo formidável. O carinho que recebo das pessoas que acompanham meu trabalho, o sorriso que vejo no rosto de crianças e adultos e saber que posso ajudar alguém com minha experiência não tem preço. É escândalo… E eu adoro, meu bem!
Mas nem só de glamour vive uma drag. É claro que existe o brilho, o luxo, a beleza, o colorido, mas ninguém vive essa vida de Alice no país das maravilhas o tempo todo. Adaptando Shakespeare, eu diria: "Existem mais coisas entre uma peruca e um salto alto, do que nossa vã filosofia".
Muitos meninos (e até meninas!) me dizem que querem ser drags. E eu sempre respondo "Meu amor, você está certa disso?". Sim, porque drag é glam, mas não só. E aí eu logo saio listando os obstáculos que terão de ser superados:
1. Montagem: Duas horas de produção, no mínimo. Afinal, transformar uma lagarta peluda numa borboleta belíssima – no meu caso – é uma tarefa que demanda depilação, maquiagem, picumã, jóias e um modelito phiníssimo;
2. Preconceito: e ele vem de todas as partes, desde o taxista que se nega a levá-la ao seu destino até o morador de rua que vê e diz "olha lá o traveco";
3. Confusão: Não sem muito bem o porquê, mas alguns bofes fazem uma verdadeira confusão e acham que, porque você é drag queen, logo faz programa. Queria dizer, meus fofos, que não sou garota de programa. Eu sei, tá atá na moda e não tenho nadinha contra. Mas existe um lastro (olha a palavra culta) entre uma drag e uma profissional do sexo, vamos combinar?
4. Confusão 2: Muita gente acha que drag queen, transformista, travesti, transexual e crossdresser é tudo a mesma coisa. Hellooooo? Que mundo você vive meu amor? Vamos entender melhor o assunto, ou será que você é mesmo entendido? (Nossa… Ninguém mais usa esse termo, né? Ficou para trás junto com a década de 1990);
5. Namorado: Graças ao meu bom Deus eu não passo por isso, pois meu marido me apoia em todos os sentidos, mas, infelizmente, conheço muitas pessoas que não namoram com um cara se souber que ele trabalha como drag queen. Uma drag que conheço definiu isso muito bem quando disse: "Drag queens são como acidente de carro. Todo mundo quer ver, mas ninguém quer se envolver". Não entendo por que rola uma imagem tão negativa em torno das pessoas que trabalham na noite… Espero que isso mude um dia! Acho que esta é a pior coisa em ser drag…
Muitos já devem estar pensando se vale mesmo a pena ser drag. Afinal, depois de tantos obstáculos, as pessoas ainda querem te pagar uma miséria pelo seu trabalho. Não dá né, fofinhos? Lembrem-se que uma drag faz TODA diferença na sua boate, na sua festa, no seu evento e isso tem um preço que deve ser, no mínimo, justo.
No entanto, porém, entretanto… Ser drag queen é algo mágico. Nada me deixa mais feliz do que atrair os mais diversos e curiosos olhares. Me sinto plenamente realizada quando, depois de um dia de trabalho, com os pés doendo, com o peito marcado, com o corpo todo suado e com a cabeça doendo por conta da fita crepe e dos grampos, as pessoas carinhosamente elogiam o que fiz. Não há dinheiro no mundo que pague esta troca de energia tão gostosa. Ouvir de uma pessoa "conhecer você fez toda a diferença para compreender os sentimentos do meu filho" é a coisa mais gratificante que já tive o privilégio de ouvir. Foi escândalo…
Para o Bial, os BBBs são seus heróis… Pra mim, qualquer um que coloca uma picumã, um vestido escândalo e saí linda na noite é meu herói…
E deixe-me ir voada, porque o dever me chama… Preciso ganhar o aqué pra garantir o leite das crianças: os dois gatos do marido e o meu poodle!
Beijo, beijo, beijo… Fui…
in Cultura