in

A difícil saída do armário


 
Recebi o e-mail abaixo de um menino, cujo nome prefiro não dizer, que leu um texto que escrevi há quase 10 anos e que foi publicado no site Armário X (leia aqui). Vez ou outra recebo e-mails de gente que confessa ter sentido o mesmo que senti lá atrás, num momento da vida que é complicado para todos nós gays: a saída do armário.

Se tiver tempo, leia, vale a pena:

Oi, eu realmente não consigo imaginar alguma coisa sensata pra colocar no "assunto", embora o assunto geral seja homossexualidade. Meu nome é XXX, e espero que você possa me ajudar.

Eu preciso que alguém me ouça e só eu estar mandando esse email, mesmo que você nunca chegue a ler, já é um grande avanço.
Eu tenho 16 anos. Sou gay. Não sou o que possa chamar de frustrado, embora nunca tenha contado pra ninguém sobre a minha natureza, você será o primeiro =D.

Eu li uma matéria que você escreveu pra site ArmárioX sobre frustração. Não costumo ler muitas matérias sobre o assunto, mas hoje me bateu uma frustração e eu senti a necessidade de me abrir com alguém, você foi escolhido, aleatoriamente – quando vi sua foto, em cores, no site acreditei que poderia me abrir, ao menos um pouco, contigo.

Meus pais têm certos preconceitos, e, algo que me marcou muito foi quando ambos vieram até a mim perguntar se eu era gay, eu estava no ápice da minha infância, possivelmente com sete anos, não sabia o que responder, mas jurei que não. Soube que eles perguntaram a meu irmão o mesmo, embora ele nunca tenha aparentado.

Meus pais nunca me agradaram no que diz respeito a educação, minha mãe principalmente, que nunca respeitou meu espaço e minha individualidade. Nunca sofri por ser gay, preferia ter nascido hetero, mas nunca me culpei ou me deprimi por isso, apenas aceitei, desde sempre, que eu sou assim, e procurei tocar minha vida.

Nunca me apaixonei por ninguém – tirando paixõesites que, como foram, vieram: rapidamente – e por isso não acho que enfrentei grandes problemas. Meus amigos são normalmente garotas, embora tenha muitos amigos homens também, e nunca fui do tipo fechado ou super tímido.

Sei que a homossexualidade não é a raiz de meus problemas, sei que me frustro às vezes com a ideia de que não posso me apaixonar realmente por alguém, principalmente agora que eu sinto um pouco de necessidade de um pouco mais de carinho e proteção.
Já me apaixonei por meninas, mas, talvez porque eu fosse criança, não senti desejo ou atração, mas era engraçado que eu já tivesse a consciência de que não era hetero, embora nem conhecesse essa palavra.

Não acredito que minha sensibilidade e meus talentos para áreas que possam dizer serem femininas sejam frutos da minha homossexualidade, afinal fui, praticamente, criado pela minha avó – risos. Há vezes nas quais agradeço por ser gay, pois talvez tenha sido isso que fez minha mente ficar tão aberta e esclarecida, com apenas vestígios de preconceitos bobos que tento apagar a cada dia.

Uma vez me apaixonei por um menino que passou na minha frente, e depois chorei muito. Ele passou em um grupo perto de mim duas vezes, e, em ambas vezes, meu coração acelerou. Chorei por frustração de que, com ele, nunca teria uma chance real. Foi a segunda vez que me apaixonei por alguém aleatoriamente, e última. Nunca cheguei a ver mais eles, e se visse não me lembraria e, provavelmente, não ficaria eufórico novamente.

Nunca experimentei um real primeiro beijo, esse ano meus estudos acabam e eu já disse aos quatro ventos meu desejo de sair daqui, ir morar longe, experimentar uma vida só minha, na qual não dependa da vontade de ninguém. Escrever livros, fazer algo na área de comunicação – provavelmente publicidade – e ter sucesso com meu trabalho, dedicando toda minha força, determinação e muito tempo são meus sonhos. O único sonho que me frustra é o sonho, que há muito tenho, de ter filhos, de criar meu filho da forma na qual sempre quis que meus pais tivessem me criado, de criar alguém na forma mais justa possível e com muito amor que tenho.

Obrigado por ler até o final, mas eu ainda tenho um pedido: me responde. Apenas um "eu li" já me deixaria muito feliz e realmente muito grato. Aliás foi com você minha primeira vez – risos² – que eu contei tudo que sentia pra alguém. Embora não te conheça posso dizer que você foi especial pra mim. Um beijo, um browser e um aperto de mouse, do XXX.

Fiquei emocionado quando li essa mensagem e confesso ter sentido um misto de impotência e perplexidade. Fiquei sem palavras, não soube o que responder para ele, mas quero de alguma forma ajudá-lo, apesar de desconhecer as ferramentas para isso. No momento, a única coisa que posso dizer é: você não está sozinho.

The Dead Weather é o lançamento musical do ano

Eu sempre quis ser minha irmã