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“Acho irônico quando as minorias segregam umas às outras”, diz autor de quadrinhos gays

Will Solier tem 25 anos, é ilustrador, estudante de design gráfico e professor de inglês. Semanalmente, ele publica em seu blog uma série de tirinhas com a temática da diversidade sexual.

Entre as criações do autor estão Nick Duvidoso, um garoto bissexual cheio de incertezas sobre sua sexualidade; o assexuado Thomas; Marlene Sapatrucker, personagem que brinca com os estereótipos lésbicos e que tem um affair com Nick; o gay Bruno (ou Brunette), amigo sarcástico de Nick; e até um padre homossexual e pedófilo.

As tirinhas de Will Solier têm um caráter quase militante e ajudam a aprofundar o debate sobre a homossexualidade. O gosto do estudante por quadrinhos começou cedo, ainda na infância. Das tirinhas da "Turma da Mônica" aos mangás japoneses, Will construiu seu repertório para dar vida às suas próprias histórias.

Em breve, Will começa a escrever no blog "Papo de Homem", famoso entre o público hétero e que agora abriu espaço para colunistas gays. Nesta entrevista exclusiva ao site A Capa, o estudante reforça que seu trabalho vai além dos traços de seus desenhos. Sabiamente, diz ele, "os quadrinhos se comunicam com todos os públicos sobre qualquer assunto". Confira:

Como começou sua paixão pelos quadrinhos?
Cara, eu praticamente me alfabetizei com quadrinhos. Sempre gostei de ler de tudo, desde livros de filosofia até revistas de fofoca, mas tenho um vínculo afetivo muito forte com os quadrinhos. Comecei com a "Turma da Mônica/" na infância, passei para os comics da Marvel na adolescência e logo em seguida para os mangás japoneses. Atualmente, leio muitas tirinhas e Graphic Novels. Lógico que acabaria invariavelmente direcionando minha expressão pra este tipo de linguagem. Me divirto muito fazendo o que faço, desenhar é a minha melhor terapia!

Por que resolveu adotar o apelido de Nick Duvidoso?
Queria que ele se chamasse Nicolas, por causa de uma piada interna, mas ouvi várias pessoas dizendo que era grande e difícil, daí diminuí pra Nick. Eu queria criar um personagem que fosse mais complexo, sem esses clichês que a gente vê ao retratar personagens gays (a Biba pintosa, a Barbie musculosa, a Hype escandalosa etc) e juntei uma penca de características de amigos ou conhecidos e juntei tudo no Nick pra representar uma parcela pouco compreendida: os bissexuais. Eles são vistos com olhos desconfiados tanto por héteros quanto por gays, muita gente diz que eles não existem, que são enrustidos, que são indecisos numa fase e outros defendem que a maioria da humanidade é bissexual, ou que os bissexuais são os "safadinhos", que nunca saem de mãos (ou boca) abanando na balada. É justamente essa contradição de opiniões que torna o tema tão interessante. No caso do Nick, essa dúvida toda do nome dele está não só na cabeça dele, que nunca decide qual gênero prefere (e nem se realmente quer escolher um gênero…), como também na cabeça dos outros, que não conseguem compreender suas mudanças repentinas de gostos e posturas em relação às pessoas com as quais ele se envolve.

De onde vem a inspiração para criar personagens gays?
As histórias que mais me atraem são as que conseguem estabelecer uma ligação emocional comigo, seja pela arte, pelo roteiro ou pela postura do autor. No caso dos quadrinhos que faço (mesmo o que são feitos por encomenda), me esforço pra produzir um material que eu gostaria de ler. Sinto muita falta de personagens gays e por isso os crio. Faço isso desde o meu primeiro fanzine: Alex in Wonderland, que publiquei de 2005 a 2009 e que era uma versão gay de Alice no país das Maravilhas (acabei parando de divulgar pra não me misturar a essa febre em torno do filme do Tim Burton). Nesse fanzine eu brincava bastante com os clichês gays e o próprio Alex era um enrustidinho paranoico. No caso do Nick, dei uma reformulada deixando a questão da sexualidade dele em aberto. As situações que eles vivem são criadas a partir de experiências de amigos misturadas às minhas próprias. Na minha mão, bafão vira inspiração!

Além de Nick, nos conte um pouco sobre seus personagens. Quem são eles?
Ah, além do Nick Duvidoso tem o Thomas, que é outro tipo duvidoso que adora criticar as atitudes alheias mantendo sua própria vida em sigilo máximo pra esconder os podres. Tem a Marlene Sapatrucker, uma personagem que brinca bastante com os clichês lésbicos e que tem um affair com Nick, que oscila entre o amor e o desprezo. Há também o padre pedófilo que só confunde mais ainda o Nick com seus conselhos contraditórios. O brilho fica por conta do Bruno (Brunette para os íntimos) que adora gongar as neuras do Nick com tiradas sarcásticas.

De que forma você lida com as histórias retratadas em seus quadrinhos na vida real? Seu cotidiano serve de combustível para essas histórias?
O lado divertido de trabalhar com quadrinhos é que eles te permitem se comunicar em vários níveis. Ao mesmo tempo em que há a parte cômica que aborda a maioria das situações bizarras que eles vivem, pode-se ver também algumas críticas e conceitos nas entrelinhas. Tem gente que se manifesta através da música, fazendo performances, dançando, escrevendo, fazendo militância e discursos – ou não fazendo nada (ficar em cima do muro também é um posicionamento político). Eu uso o humor gráfico pra dizer o que eu penso, especialmente nos questionamentos dos "lugares-comuns" que assombram as relações entre pessoas muito diferentes e a necessidade que algumas pessoas sentem de julgarem umas às outras. Quando um cara gay se acha no direito de julgar e criticar um menino bissexual, um urso, uma Barbie, um cara muito afeminado ou que seja pobre, ele raramente consegue enxergar que a raiz dessas atitudes são as mesmas que geram o preconceito contra homossexuais em geral. Acho irônico quando as minorias segregam umas às outras e tento mostrar o quanto acho isso ridículo (tanto no sentido de "algo desprezível" quanto no sentido de "algo sobre o que rir").

Há poucos personagens assumidos nas HQs. Por que você acha que isso acontece? Há formas de discutir a homossexualidade nos quadrinhos?
Isso é meio complicado de dizer. Vocês do mercado editorial sabem bem que a produção depende muito da demanda. Em outras linguagens artísticas, como o cinema, já existe um segmento sólido de "cinema gay" e até premiações específicas visando este público específico. O único país do mundo no qual você pode ver revistas em quadrinhos que tratem de relações ou personagens homossexuais é o Japão. Obviamente, por ser o país que mais produz quadrinhos no mundo, existem subdivisões pra todos os gostos e esse filão específico, conhecido como Yaoi ou BL (Boys Love) é amplamente consumido, principalmente por mulheres. No Brasil, a prova que esse movimento chegou com força é que em todos os eventos de quadrinhos que eu participei, meus fanzines sempre foram os mais vendidos. Não que fossem muito melhores que outros, mas é que os outros que tratavam de lutinhas de bem/mal tinham que concorrer com os títulos já vendidos pelas editoras. Já o público GLS (e as meninas fãs de yaoi)  eram tão carentes de publicações que lotavam meu estande! Só no ano passado, as editoras enxergaram esse público e publicaram coisas como Gravitation, que como era de se esperar fez um sucesso absoluto. Esse é o primeiro passo para abrir a mente do público e das editoras, já que os quadrinhos se comunicam com todos

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