Eram 18h30 e já havia uma fila de meninas na Livraria Martins Fontes, em São Paulo, quase todas adolescentes, esperando por um autógrafo e uma foto com Ana Angélia Martins, a Morango, a primeira homossexual a se assumir publicamente no Big Brother Brasil. Era a festa de lançamento de “Quebrando o Aquário”, primeiro livro da jornalista, atriz, DJ e ex-BBB.
Angélica chegou discretamente, mas provocou alvoroço. Super acessível, agradeceu a todos, e pediu para a cantora Tamara Angel abrir a festa, tocando a música que compôs sobre um dos contos do livro. Com a fila já grande, Angélica se sentou para autografar os livros das (e dos) fãs. Muitas mães levaram as filhas adolescentes para o evento – um lindo sinal de que as coisas podem estar mudando, e que Angélica tem parte nisso.
Vários ex-BBBs, companheiros de Angélica no programa, apareceram para prestigiar a amiga: Serginho, Joseane, Cacau, Alex…
Por volta das 21h30, depois de centenas de pessoas terem ido conferir o lançamento de seu livro e de dar entrevistas para a TV, Angélica sentou na cafeteria da livraria para um bate-papo com o Dykerama, onde falou sobre sua relação com sua família, como lida com a fama e respondeu a algumas perguntas “picantes”. Veja abaixo:
Como está sua relação com sua família depois do BBB?
Quando saí do BBB, não esperava o espetáculo que minha mãe deu. Você já sai fragilizada, sendo julgada, tem as torcidas na arquibancada – e com que torcida eu saí! (em referência às torcidas de Dicesar e Marcelo Dourado) – e aí ela fez aquele escândalo todo, falou do meu pai, falou mal da Globo, foi em programa de televisão e se contradizendo o tempo todo. Felizmente, porque aí as pessoas viram que não adianta ficar abrindo espaço para aquela notícia. Ela podia ter simplesmente detonado minha carreira, ou as oportunidades que poderiam surgir.
O meu pai, que na verdade foi a pessoa que mais sofreu com esta história toda, falou que não ia se pronunciar para não ficar aquele “bate-rebate”. Isso para mim é que é ser pai, é querer bem. Essa é a diferença entre minha mãe e meu pai, com quem eu não cresci, mas de quem eu tenho uma personalidade muito parecida. O BBB me aproximou demais do meu pai, e hoje a gente tem uam relação de pai e filha, coisa que a gente não tinha. Ele era um desconhecido, hoje ele é meu pai.
Você vai fazer um ensaio sensual em breve. O que pode adiantar sobre isso?
Não posso adiantar muita coisa. Só que será um ensaio ousado com outra pessoa… uma mulher.
Quando pensou no ensaio, você pensou no público feminino que te acompanha, no público masculino, ou não teve nada disso?
Engraçado, eu não tinha parado para pensar nisso… Mesmo. Quando a gente entrou em negociação, a gente já tinha noção do que seriam as fotos, mas eu nunca pensei: ah, vou fazer pro público feminino ou masculino. Não sei se existe isso, por exemplo, eu consigo comprar um Playboy e falar: “nossa, que mulher bonita”, assim como os homens olham de outro jeito. Aquelas fotos não foram feitas pensando não só em homens ou só em mulheres.
Você se considera um símbolo sexual lésbico?
Jamais.
Jamais?
Não… Pra mim símbolo sexual lésbico é a Carmen, do The L Word… (risos). Aquela é uma p… mulher!
Você falou que vai lançar uma linha de produtos. Dá pra falar algo sobre?
Vou lançar uma linha de produtos no máximo daqui a dois meses. Um dos produtos vai ser um acessório lançado com uma grande rede. Só posso falar isso (risos).
Você é uma referência para as meninas homossexuais…
Ai, você acha mesmo?
Acho, com certeza. Como você lida com isso? Você tem a consciência que se tornou uma referência?
Eu tenho uma noção de que sou uma homossexual assumida e que sou diferente do estereótipo de homossexual feminina que normalmente é apresentado em programas de TV, em novelas, aquelas mulheres masculinizadas, mau humoradas, ou que mudam de orientação no meio, casam com homens e ficam felizes. Eu só represento uma parte da população do país, que não é pequena, de pessoas homossexuais, tanto mulheres como homens, que são bonitas, vaidosas, se deram bem na carreira, e que não tem nada a ver com aquele estereótipo que a gente vê. Então isso chama muito a atenção das pessoas, e é uma cobrança muito grande.
A maior parte do meu tempo eu dedico a ler os e-mails e respondê-los. Eu levo muito a sério, e busco entender o que está acontecendo. Independente do que eu fizer, sempre vou ser criticada ou elogiada. Fui colocar silicone: “não, não deve colocar, sim deve colocar”. Recebi o primeiro convite da Playboy: “não aceita!”, “sim, você deve aceitar!”. Sempre haverá opiniões diferentes sobre o que vou fazer, então resolvi não assumir um personagem, eu sou como sou. Quando aconteceu tudo aquilo com a minha mãe, eu não estava disposta a mudar de opinião. Eu nunca vou tomar uma atitude em função do que as pessoas querem.
Eu acho que quando você faz as coisas com o coração, dá certo. As pessoas falam: “Diva, Diva!”, gente, diva é a Lady Gaga, a Madonna (risos). Então, eu represento esta parte das meninas femininas, que gostam de meninas, e torço muito para que outro BBB, que as novelas, cada vez mais mostrem pessoas assim.
E o assédio dos homens, como você lida com ele?
Você acredita que era muito maior antes do BBB? Tem uma parte engraçada, o homem tem o fetiche de ver duas mulheres juntas quando ele se imagina ali no meio. A parti do momento que você fala: eu sou mulher, eu gosto de mulher e SÓ, a maior parte dos caras recebe bem.
Eu recebo muito carinho de homens héteros, casais, pedem autógrafo, tiram foto. Já aconteceu de eu estar no shopping com meu pai, e um homem chegar: e aí, Morango, quando vou te ver na Playboy? Até aí tudo bem, nunca teve algo mais grave. O assédio feminino é maior, o masculino era maior antes do BBB, porque “gay” não está escrito na testa.
Agora são umas perguntas tipo “bate-bola”, rapidinhas… Qual seu maior sonho?
Nesse momento, ser mãe. A maior parte dos sonhos que eu tinha, eu realizei, ou estou realizando.
Maior medo?
(Morango pensa um pouco)… A morte de quem eu amo. Recentemente eu perdi a minha bisavó, ela tinha 96 anos, mas é a mãe da minha avó, que é minha mãe. Eu pensei: “caramba, se isso acontece com a minha avó”…
Viagem dos sonhos?
A viagem dos sonhos ainda vai acontecer.
Qual?
Acho que independe do lugar, depende da companhia com quem você está, pode ser a duas, pode ser com os amigos, não importa o lugar.
Preconceito é…
Preconceito é você julgar mal uma coisa que você não conhece.
Se você fosse homem por um dia, o que você faria?
Gente, deixa eu pensar… Dri, sinceramente, eu faço tudo o que um homem faz, não tenha nada que eu gostaria de fazer que eu não tenha feito. Beijar mulher eu já beijo, outras coisas também… Entrar em banheiro masculino? Ah, boa tarde, me poupe.
Ah, não tem nada, eu faço tudo o que eu tenho vontade de fazer, não tem nada que eu gostaria de fazer se eu fosse homem ou outra pessoa, ou se eu tivesse mais dinheiro etc… Tá tudo bom assim.
Uma mulher sexy?
Tem várias, posso citar várias? Eu acho a Penélope Cruz muito sexy, eu acho a Cléo Pires muito sexy…Ai, tem outras, não dá pra ficar falando todas…
Um homem sexy?
Meu pai, eu acho ele muito sexy… E o meu irmão também, tem um olhar sexy.
Sucesso é…
Atingir os seus objetivos fazendo o que você gosta.
O que você quer fazer profissionalmente que ainda não fez?
Talvez um filme, porque eu sou atriz também… Tem um momento da vida que a gente tem que escolher uma profissão, eu trabalhava muito como atriz, principalmente em teatro, fiz vários comerciais, mas aí a faculdade começou a chamar… É estágio etc, e você não tem mais como voltar. Fazer um filme é um sonho antigo, se acontecer, tá bom.
Duas perguntas mais “íntimas” agora: entre quatro paredes, vale tudo?
Vale… Se você está com alguém que você gosta, com quem você tem realmente intimidade, vale tudo…
Ativa, passiva ou relativa?
(Muitos risos de todos na cafeteria)… Oi, bem? (risos). Criativa! Eu sou criativa! (Aplausos de todos para a resposta).
Obrigadíssima, Angélica!
Obrigada a você, Dri.
Veja no álbum tudo que rolou no evento. As fotos são de Patrícia Ferrini e Aline Ginez.
:: Confira a outra entrevista com Morango, onde ela fala sobre o desejo de ser mãe