Davy Rodrigues, 31 anos, teólogo e hairstylist, lançou seu primeiro livro no dia 22 de maio no Museu do Catete, Rio de Janeiro. "Proibido Amor" (Editora Metanoia) é um romance que poderíamos classificar de inclusivo, pois trata da questão de viver saudavelmente a homossexualidade sem abrir mão da fé cristã e de praticá-la, não no que ela tem de religiosidade, mas enquanto caminho na vida e ética existencial.
O livro é o primeiro de uma série de cinco, nos quais o autor abordará, futuramente, outras confissões de fé como as de matriz africana e judaica, sempre em relação com a vivência sadia da homossexualidade, após os conflitos existenciais entre o entendimento de uma norma pelas teologias destas religiões e a pluralidade das sexualidades humanas. A heteronormatividade é um paradigma que deve ser quebrado, em diferentes níveis, em todas as confissões de fé, pois todas elas reconhecem tal norma como "o certo", embora, na prática, lidam com o que chamam de "sexualidade discordante" de diferentes maneiras.
Segue abaixo a entrevista que Davy Rodrigues me concedeu. Espero que vocês, tanto quanto eu, apreciem a iniciativa corajosa de escrever um livro libertador que nos chama para libertar-nos das amarras e das normas impostas pela religião que se pretende cristã. Vivemos uma conjuntura de crise entre o fundamentalismo religioso cristão e a militância por direitos civis de pessoas LGBT. É preciso tomar postura neste momento delicado e usar do conhecimento que adquirimos ao longo da vida – e já que 2010 é ano eleitoral, do nosso voto – para desconstruirmos as normas que deixam à margem da plena cidadania milhões de pessoas.
Quais as temáticas que perpassam no romance "Proibido Amor", de sua autoria?
No livro Proibido Amor abordo alguns pontos que julgo de extrema importância: homofobia religiosa e social, quebra de paradigmas e paradoxos religiosos, auto-homofobia e a soberania do amor, que quebra qualquer barreira humana quanto a capacidade de compreender as pluralidades da natureza humana.
Como surgiu a ideia de escrevê-lo?
Não são poucas as questões conflitantes entre os "valores" cristãos e a sexualidade humana. Entretanto, tratando-se da homossexualidade o conflito pode ser acalorado com o "desconforto" social causado por séculos – ou falaremos em milênios? – de traduções tendenciosas do livro sagrado do cristianismo, a Bíblia. A ideia surge das injustiças e demonstrações públicas de não-amor feitas por quem professa o nome do Pai de Amor.
Sou Bacharel em Teologia e estudioso das relações entre a Sexualidade Humana e as Religiões. Nasci em 5 de julho de 1979, fui criado em uma família protestante tradicional (batista), de onde extraí os melhores ensinamentos para minha vida pessoal, familiar e social. Fui líder de adolescentes e jovens em algumas das mais importantes igrejas da Convenção Carioca, pregador incansável em congressos e diversas atividades eclesiásticas. Durante alguns anos me dediquei ao trabalho em favor de viciados em drogas e moradores de rua (através da campanha "Madrugada do Carinho"). Porém, diante da descoberta da própria identidade homossexual, passei por inúmeros conflitos que me levaram a uma análise profunda sobre as relações entre as relações humanas versus os conceitos de diferentes pontos de vista das principais religiões que atuam no Brasil. Como resultado, apresento uma proposta literária inovadora: trata-se da elaboração de cinco romances (à princípio), que abordam o tema Sexualidade e Religiões de maneira simples e sem apologias.
De certa forma você retrata sua biografia no livro?
Acredito que os conflitos oriundos de questões conflitantes (como no caso da homossexualidade) nos coloca em qualquer ponto entre o amor ao próximo e o amor por si mesmo. Se meus leitores conseguirem perceber isso no que escrevo, então estarei lá sim.
Como foi que você conseguiu passar do fundamentalismo religioso para uma teologia inclusiva?
Qualquer pessoa que leia sem reservas os ensinos de Jesus Cristo consegue fazer essa transição sem problemas, pois o próprio Mestre é o Pai maior da inclusão.
O livro tem como objetivo o combate ao fundamentalismo religioso cristão, penso eu. Você pretende escrever, na mesma linha, sobre outros fundamentalismos, como, por exemplo, o islâmico e o judaico?
Não me preocupo tanto com esse tal "combate", mas com a verdade no que escrevo. Acredito que estou tocando numa "Casa de Abelhas", por isso o combate pode vir deles mesmos. Mas vou abordar em outras obras os conflitos existentes nessas religiões e em outras também, como catolicismo, candomblé etc.
É possível ser gay, assumir socialmente isso e continuar professando a fé em Jesus Cristo?
Obviamente que sim. Não há nada de contraditório nisso. Ser gay é como ser negro, branco, oriental, nordestino, anão, gordo, magrelo, enfim, somos plurais, tanto quanto Deus, o Criador, nos projetou em sua rica criação.
Como é hoje a sua relação com a Igreja?
Não tenho problemas com eles… mas acredito que devido a "minha" verdade, eles é que não conseguem me aceitar como eu sou. Aliás, esse é um problema da igreja com todas as diferenças. Se pergunte qual foi o presidente da Convenção Batista Brasileira negro, por exemplo.
Qual é a mensagem central de "Proibido Amor"?
O que exponho ao apreciador de romances não é uma análise teológica das relações entre pessoas do mesmo sexo, mas um prisma diferente sobre ter uma orientação sexual por um (ou uma) igual, e permanecer professando a fé na qual o indivíduo obteve sua formação pessoal, familiar e social.
Como os leitores do "A Capa" podem adquiri-lo?
A Metanoia Editora esta negociando com todas as livrarias do Rio de Janeiro e do Brasil, mas por enquanto o livro pode ser adquirido pelo site da editora: http://www.metanoiaeditora.com/ e nesta quinta-feira, dia 3 de junho, o livro estará à venda no estande da Igreja da Comunidade Metropolitana na Feirinha Cultural LGBT no Vale do Anhangabaú, em São Paulo.
Davy, a Verdade liberta?
Sem sobra de dúvida. Toda forma de se aproximar da Verdade liberta. Se eu posso deixar uma mensagem para todas as pessoas é que meu desejo é que todos sejam capazes de amar e se relacionar com Deus a partir da Vida que Ele mesmo nos concede. Que sejamos capazes de percebê-lo em cada detalhe simples do dia-a-dia. Deus é um misto de Tudo e de Nada também. Mas negá-lo é, sem sombra de dúvidas, uma tolice. Atribuir tudo o que existe ao nada ou ao acaso, é acreditar que você veio do nada e para o nada voltará. Se é assim, então que Deus seja o seu Nada. Mas, como em toda lei, não podemos fugir às suas regras. Se sou o que sou, é n’Ele, para Ele e com Ele que o sou (que somos). Deus abençoe a todos!
* Márcio Retamero, 36 anos, é teólogo e historiador, mestre em História Moderna pela UFF/Niterói, RJ. É pastor da Comunidade Betel do Rio de Janeiro – uma Igreja Protestante Reformada e Inclusiva -, desde o ano de 2006. É, também, militante pela inclusão LGBT na Igreja Cristã e pelos Direitos Humanos. Conferencista sobre Teologia, Reforma Protestante, Inquisição, Igreja Inclusiva e Homofobia Cristã. Seu e-mail é: revretamero@betelrj.com.