Nos últimos anos, o Brasil tem enfrentado uma crescente onda de censura às artes, especialmente no que diz respeito ao funk, um gênero musical que se originou nas periferias do país. A polarização política, intensificada por grupos de direita e esquerda, tem feito com que manifestações artísticas, especialmente aquelas ligadas a temas de raça e classe, sejam alvo de ataques. A nova direita, que ganhou espaço no debate público, trouxe pautas que questionam a sexualidade, a identidade de gênero e a expressão racial, colocando artistas da periferia em uma posição vulnerável.
Artistas que costumam criticar a sociedade através de suas obras se veem agora sob um escrutínio intenso, amplificado pelas redes sociais. Para muitos, a Lei Rouanet, que deveria ser um mecanismo de incentivo à cultura, passou a ser vista como uma fonte de escândalo, resultando em liminares que proíbem apresentações e dificultam a captação de recursos. Essa situação não é nova para os artistas das periferias, que já enfrentavam a repressão antes mesmo da ascensão de Jair Bolsonaro à presidência.
Historicamente, o funk sempre carregou estigmas, especialmente após eventos como os arrastões nas praias do Rio de Janeiro em 1992, que associaram o gênero a crimes e violência. A narrativa de que os funkeiros eram os responsáveis por esses atos de violência foi reforçada por veículos de comunicação, contribuindo para uma criminalização do gênero. Essa narrativa se perpetuou ao longo das décadas, com leis e ações policiais que visavam silenciar o funk e seus artistas.
Estudiosos como Guilherme Varella, da Universidade Federal da Bahia, afirmam que a censura às artes está intimamente ligada a questões raciais e de classe. A liberdade artística é frequentemente subjugada a outras normas, refletindo um preconceito estrutural na sociedade brasileira. Exemplos de censura a artistas LGBTQIA+ e a manifestações culturais que desafiam a norma são frequentes, com eventos e exposições sendo cancelados devido a pressões políticas.
Além disso, a luta por espaço e reconhecimento no cenário cultural é ainda mais desafiadora para as mulheres no funk. MC Carol, uma das vozes mais proeminentes do gênero, destaca que as oportunidades para as mulheres são limitadas em comparação com os homens, refletindo um machismo enraizado na indústria da música. Apesar de avanços, ela e outras artistas ainda lutam por igualdade e reconhecimento em um meio dominado por homens.
Com a crescente repressão à liberdade artística, é essencial que a sociedade brasileira amadureça sua compreensão sobre a importância da arte como forma de expressão e resistência. O funk, assim como outras expressões artísticas, deve ser respeitado como um reflexo da cultura e da vivência de uma parcela significativa da população, que frequentemente é marginalizada e silenciada. A luta pela liberdade de expressão e pelo direito de criar sem medo de censura é uma batalha que continua a ser travada nas ruas, nas letras das músicas e nas plataformas de arte do Brasil.