Me lembro quando era pré-adolescente e meu irmão, onze anos mais velho que eu, curtia Legião Urbana e tantas outras bandas de rock nacional. Renato Russo tinha gravado álbuns solo, em italiano (e depois, descobri, em inglês também). Cazuza já tinha estampado a capa da revista "Veja" mostrando o estado debilitado em que se encontrava por conta de uma doença terrível, devastadora, desconhecida e mortal: eram os tempos das primeiras vítimas da Aids.
Uma cena muito clara em minha mente. Estávamos voltando do médico – minha mãe tinha ido a uma consulta – e meu irmão, aquele que mencionei acima, tinha nos levado até o consultório e na volta ele tocava no carro o CD solo do Renato Russo, "Equilíbrio Distante". Músicas que eu adorava (e ainda adoro), uma voz maravilhosa e um comentário do meu irmão: “Nossa, imaginar que ele tá com Aids”. Em 1996, quando Renato morreu, vítima da doença, eu sequer tinha conhecimento do que era a Aids. Sabia, somente, que era algo muito perigoso e que se transmitia sexualmente. Muitos eram os mitos e verdades sobre a doença.
Pouco tempo depois, minha família descobriu que uma pessoa relativamente próxima de nós estava com o vírus do HIV. E quando a encontramos, estava em estado bastante debilitado. O marido havia morrido por conta de problemas decorrentes da doença (num tempo onde pouco se falava de coquetel) e a esposa descobrira que estava também com o vírus. No entanto, por conta dos novos tratamentos, ela conseguiu se recuperar e hoje é uma pessoa que vive normalmente: mãe dedicada, avó carinhosa e uma profissional como qualquer outra. Hoje, o HIV é só um detalhe na vida desta pessoa.
Mas nem sempre foi assim. A Aids causou verdadeiro pânico nas décadas de 1980 e 1990 – e com motivos. O que fez surgir preconceitos, medos e mitos. O próprio movimento gay teve de se repensar por conta da epidemia e, neste momento, a luta por direitos foi posta em segundo plano por uma luta mais importante – a luta pela vida. Somente após 1995, com a uso mais difundido dos novos medicamentos, é que o movimento gay voltou a pensar na luta pela cidadania e pelos direitos humanos. Não é coincidência que a primeira Parada do Orgulho LGBT aconteceu em 1997.
As gerações mais novas que a minha têm uma visão bem diferente do que é a Aids e o HIV, diferente da minha e radicalmente diferente das gerações que viveram – ou sobreviveram – ao momento mais crítico da doença. Por este motivo, talvez, é que o uso de preservativos entre jovens e adolescentes tem se tornado menos comum. Afinal, a Aids não é tão mais assustadora como foi em outras décadas. No entanto, o preconceito em relação aos portadores do vírus ainda é grande e uma carga de moralismo radical recai sobre os que têm o HIV. O que deixa bem evidente as confusões e desconhecimento do povo brasileiro em relação às doenças sexualmente transmissíveis.
Na última sexta-feira, no Centro Cultural São Paulo, estreou a VII Cinema Mostra Aids, que vai até o dia 25 de agosto. Nela, documentários de longa, média e curta duração mostram histórias sobre o impacto da Aids na vida das pessoas. Doença essa que afeta 3 milhões de pessoas por ano.
Para conferir a programação completa da mostra, clique aqui.
Tá dado o recado…
Beijo, beijo, beijo… Fui…