"Pensem bem, eu gostaria de falar para aqueles que serão eleitos delegados. Vocês não estão indo para Brasília a passeio. Muita gente deu o sangue, mas não apenas o sangue, muita gente deu a vida, durante todos esses anos, para que hoje pudesse acontecer essa conferência. Os delegados não estão indo pra Brasília pra fazer turismo, nem sexo. Quanto a laicidade. Não estamos pedindo esmola. Estamos pedindo o cumprimento de algo que está na constituição e que o Estado brasileiro rasga dia e noite."
Domingo, 13 de abril de 2008. Último dia da I Conferência Estadual GLBT de São Paulo. A plenária final, onde seriam aprovadas ou suprimidas as propostas discutidas nos grupos de trabalhos realizados no dia anterior, estava marcada para as 10h. Cerca de 15 minutos antes o microfone estava aberto aos delegados que quisessem se manifestar. A militante Márcia Lima fez uso da palavra, proferiu o discurso acima. Foi aplaudidíssima.
Pouco antes de a plenária começar, foi levantada uma questão de ordem. Não havia cópia das propostas para os delegados, nem um telão onde as mesmas pudessem ser lidas. Diante da inviabilidade de imprimir cópias aquela altura da Conferência, a sessão foi transferida do plenário da ALESP – Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo – para o auditório Franco Montoro.
Nesse meio tempo mais falas e um breve desentendimento. A travesti Bruna Valim reclamava da confecção de um material informativo produzido pela Ong ABCDS – Ação Brotar Pela Cidadania e Diversidade Sexual. O motivo? O texto do panfleto dizia que travesti é "um homem que se veste com roupas femininas e não deixa de ser um tipo de transformistas." "Imagina, nenhuma travesti aceita ser identificada como homem, isso não existe", disparou Bruna. "Esse texto está dizendo que nós somos palhaços da sociedade", afirmou em seu discurso. Marcelo Gil, presidente da Ong, afirmou que o material já havia sido recolhido e será revisado.
Findo o desentendimento e com os delegados acomodados, a Plenária Final teve início por volta das 11 horas. As propostas elaboradas foram postas em votação. O regimento da conferência não previa destaque de esclarecimento ou revisão das propostas. Apenas de supressão. Entre as propostas aprovadas estavam a de financiamento de órgãos públicos para paradas no interior e na capital do estado; o uso de nome social em documentos oficiais; a capacitação de policiais para respeitarem o público GLBT; a inclusão de adolescentes GLBT no conselho estadual da juventude.
A votação em plenária teve duração de aproximadamente três horas.
As chapas
Como faz parte de uma etapa preliminar para a Conferência Nacional GLBT, que acontece entre os dias 6 e 8 de junho, a Conferência Estadual de São Paulo, ficou responsável por eleger os delegados que representarão o Estado durante o encontro do governo com militantes de todo o país. Para isso, os delegados tiveram de montar chapas, com seus delegados-candidatos.
Os presentes formaram duas chapas, compostas cada uma com 27 delegados e 9 suplentes: a "Horizontalidade Colorida" e a "Na luta contra a homofobia, pelo direito de ser feliz". A "HC" era formada por militantes como Sérgio Santos, Miriam Queiroz, Augusto Mathias, Alcione Lourenço, Edson Azevedo, Murilo Sarno e Maytê Gouveia. Já a "Na Luta" era composta por Beto de Jesus, Marisa Fernandes, Julian Rodrigues, Salete Campari, Márcia Cabral, Marcelo Gil, Kika Medina, Lula Ramires, Xande e Dário Neto.
A eleição demorou a começar. Alguns delegados, vindos do interior, haviam deixado seus RGs no alojamento e queriam votar sem documentos que os identificavam. O problema foi resolvido. Membros da comissão organizadora conseguiram um ônibus e estenderam a votação por vinte minutos.
No total, 232 pessoas votaram. Dos votos, 153 (66%) foram para a "Na luta" e 79 (34%) para a "HC". A chapa vencedora ganhou o direito de levar 18 delegados e 6 suplentes, a segunda chapa levará 9 de seus delegados e 3 de seus suplentes. A apuração acabou por volta das oito da noite, quando também encerrou-se as atividades da Conferência.