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Direitos: Transexual que não quer fazer a cirurgia também pode mudar de nome e sexo

A decisão de que transsexuais não são mais obrigadas a fazer cirurgia para mudar de nome e de sexo veio no começo deste mês na 17ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro e representa um grade avanço em se tratando da segunda instância. 
Na primeira instância, em geral, como já expliquei em outros artigos desta coluna, os juízes costumam autorizar a mudança de nome quando a transsexual apresenta laudo psicológico atestando sua condição. Juízes mais conservadores, porém, costumam exigir a cirurgia. 
 
Quando esses casos chegam, porém, à segunda instância, poucos são os juízes que autorizam a mudança de nome sem a cirurgia de transgenitalização. E quando autorizam, é porque a transexual já está na fila de espera e consideram, portanto, crueldade fazer a pessoa esperar anos pra só mudar o nome depois da cirurgia.
 
A novidade no caso do Rio de Janeiro é que os desembargadores (que são os juízes mais experientes) condicionaram a mudança de nome à transexualidade da autora do processo, não importando se ela não fez a cirurgia porque a fila é longa ou porque não quer
 
Nas palavras do relator do processo: “A transgenitalização, por si só, não é capaz de habilitar o transexual às condições reais do sexo, pois a identificação sexual é um estado mental que preexiste à nova forma física resultante da cirurgia. Não permitir a mudança registral de sexo com base em uma condicionante meramente cirúrgica equivale a prender a liberdade desejada pelo transexual às amarras de uma lógica formal que não permite a realização daquele como ser humano”.
 
A decisão é ainda mais “revolucionária” nesta área do direito porque entende que a mudança do nome tem como decorrência lógica a mudança do sexo. Se isso pode representar um grande avanço, ao mesmo tempo pode representar um risco à auto-identificação das transsexuais, que nem sempre desejam ser vistas como mulheres. Apesar de minoritária, a posição encontra referência em transsexuais menos convencionais, em geral são as mais engajadas, militantes e inseridas nos debates universitários sobre a teoria queer.
 
Essa parcela das transexuais não ficaria muito feliz em ter sua certidão de nascimento compulsória e automaticamente alterada para fazer constar sexo feminino. Para elas, um terceiro gênero seria a melhor saída, coisa que ainda não existe no Brasil.
 
A estratégia jurídica de atrelar a mudança de nome à mudança de sexo não é novidade e segue uma tendência antiga do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. A diferença é que este ainda atrela a mudança de nome à cirurgia, quando a parte é transexual. 
 
Para os advogados de transexuais, pode até parecer mais fácil entrar de um só vez com uma ação para mudar nome e sexo. Por outro lado, considerando-se que a decisão final depende da boa vontade de juízes e desembargadores, entrar com uma só ação é extremamente arriscado. Isso porque o juiz pode retardar a mudança de nome, que é uma mudança relativamente fácil, à mudança de sexo, que causa mais polêmica. E sabemos que, em geral, a mudança de nome é a mais urgente, pois nosso RG não mostra o sexo do portador.
 
Apesar das ressalvas feitas antes, impossível não considerar a decisão do TJ-RJ um tremendo avanço para a desmedicalização dos direitos civis de transexuais.
 
Thales Coimbra é advogado especialista em direito LGBT (OAB/SP 346.804); graduou-se na Faculdade de Direito da USP, onde hoje faz mestrado em filosofia do direito sobre discurso de ódio homofóbico; fundou e atualmente coordena do Geds – Grupo de Estudos em Direito e Sexualidade também na Faculdade de Direito da USP; e escreve quinzenalmente colunas sobre Direitos nos portais A Capa e Gay Brasil. www.rosancoimbra.com.br/direitolgbt
 
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