Semana passada, assistia ao programa da Oprah Winfrey e conheci a história de uma mulher que assassinou o pai e ficou presa por 18 anos. Desde os 8 anos o pai assediava e violentava sexualmente ela e a irmã. A mãe era omissa, fingia que não via tais atos. O relato tocante e comovente me fez perceber que essa situação é extremamente delicada e muitas mulheres passam por ela, por isso gostaria de falar um pouco sobre esse tema.
O número de mulheres que passaram por situações de assédio e violência sexual é muito maior do que imaginamos. Só os casos que eu ouço na minha profissão e os que vemos na mídia já são muitos, então imaginem aquelas que não contam a sua história. É uma situação, infelizmente muito comum no nosso mundo, terrível e que transforma a vida de inúmeras mulheres para sempre.
Talvez o que mais nos choca seja a forma como o assédio e a violência sexual acontece: quase sempre dentro do ambiente familiar, cometido por pessoas muito próximas como pai, irmãos, tios ou primos. Aqueles que deveriam ser responsáveis e cuidar das crianças são os que as tornam vítima.
Não podemos dizer que esse problema é de origem cultural, pois ele atinge todas as camadas sociais, independente de religião, educação ou classe social. Quem assedia ou violenta não pode recorrer a nenhuma dessas instâncias para justificar seus atos, porque são injustificáveis perante qualquer sociedade, excluindo aquelas culturas mais primitivas onde o incesto é tido como normal, mas isto não vem ao caso neste momento.
O que podemos então fazer quando nos deparamos com tais situações? Pode a pessoa que foi assediada ter uma vida normal e sadia? São perguntas difíceis de responder, pois cada uma de nós tem um jeito de lidar com a vida e suas adversidades. Mas é claro que se tivermos conhecimento de alguma criança seja assediada e violentada, temos a obrigação de denunciar. É importante que as crianças, que hoje já são mulheres, sejam ouvidas e compreendidas, seja por profissionais ou mesmo por quem as ama.
Porém, o maior entrave, que a maioria das mulheres que passaram por este crime vivenciam, é o medo de se entregarem amorosamente a alguém. Elas precisam lidar com a culpa que as acompanha. A infância é o momento em que aprendemos com os adultos o que é certo e o que é errado. No nosso íntimo infantil, repleto de fantasias, a tendência é que associemos o ato violento com algo que fizemos, assim, passamos a sentir que somos culpadas pelos atos de violência daqueles que amamos. O drama ocorrido na infância deve ser retomado para que estes abusos sejam devidamente analisados e compreendidos e assim tratados na mente de quem os vivenciou, para que a entrega para um amor real seja possível.
Como este é um problema que acomete muitas mulheres, inclusive as homossexuais (aliás, muitas até mesmo justificam, em parte, sua orientação por terem passado por traumas físicos e psicológicos causados por homens), acredito que devemos cada vez mais perceber a nossa condição de mulheres neste mundo, que infelizmente ainda nos trata com imensa desigualdade.
Para finalizar aquelas que se identificam de alguma forma com tal situação, não hesitem em procurar ajuda, pois a dor de carregar uma culpa injusta é cruel e a vida existe para que possamos vivê-la com amor acima de tudo.
* Regina Claudia Izabela é psicóloga e escreve semanalmente neste espaço. Participe, envie perguntas ou comentários para o e-mail claudia@dykerama.com.