O Governo de São Paulo inaugurou o primeiro hospital destinado a atendimento a gays, travestis e transgêneros. No mês da Parada Gay e Caminhada Lésbica, dois eventos que considero tão marcantes (tanto pela visibilidade que promovem quanto pela promoção de uma melhor aceitação social da diversidade sexual como um todo), considerei a abertura deste hospital um retrocesso, uma vez que ao invés de unir, segrega.
Por que segrega? Pois bem, existem controvérsias sobre esta questão, como existe também com relação a ser necessário que exista uma parada para os gays e uma caminhada para as lésbicas. As controvérsias surgem porque começam a suscitar questões como: se nós queremos ser vistos com naturalidade e respeito, por que temos que nos autosegregar promovendo uma parada para mostrar que existimos? Por que temos que abrir boates e bares destinados somente a gays e lésbicas? Por que o governo do estado decide abrir um hospital destinado a cuidar somente de gays, travestis e transgêneros?
Minha opinião estritamente pessoal com relação à parada e à caminhada lésbica é que são dois eventos maravilhosos e que mostram com alegria e descontração que gays e lésbicas existem e não têm medo de se mostrarem e serem como são. Com relação a bares e boates acho que é uma forma das pessoas que têm pensamentos e escolhas semelhantes se unirem. Como estatisticamente dizem que somos apenas 10% da população, acho mais fácil para acontecer namoros, encontros e mesmo bate-papos com afins, do que ir a lugares genéricos.
Porém, se nos acostumássemos com o fato de que precisamos mesmo é nos mostrarmos e sermos como somos em qualquer lugar, talvez não precisássemos mais de lugares estritamente gays. Existem ainda preconceitos por parte de alguns heterossexuais que acham que a demonstração de afeto e carinho entre pessoas do mesmo sexo é uma ofensa à masculinidade ou feminilidade deles, portanto, para se divertir tranquilamente, infelizmente ainda é preciso se esconder. Afinal quantas pessoas já não foram agredidas por exporem sua sexualidade em público? Então, continuamos com nossos bares e afins.
O meu medo e a minha dúvida com relação ao hospital é o envolvimento do Estado, a instituição social como um todo. Tal diretriz pode direcionar nossa caminhada para um futuro que pode suscitar ao preconceito ao invés de acabar com ele.
Acredito que todo o profissional da área da saúde deva ser preparado para o atendimento a gays, travestis e transgêneros e não na criação de um lugar único onde essas pessoas possam se dirigir, porque somente lá é que serão bem acolhidas. Aliás, acho mesmo que tais profissionais deveriam ser excluídos de seus direitos de serem chamados de “profissionais” caso tratem com desrespeito ou preconceito qualquer indivíduo. No caso de nós, profissionais da área da saúde mental, psicologia, o conselho regional determina que o psicólogo que tratar como doença ou com diferenciação a homossexuais deve ser punido.
É estranho pensar que você é uma pessoa que mudou seu sexo de nascença e procura um hospital porque está com uma crise de dor de barriga crônica e você é barrado na porta pois não sabem se te tratam de homem ou mulher? Como assim?
As pessoas não tem que imaginar nada! É provável que uma pessoa que mudou o seu sexo, apresentará na recepção de qualquer hospital sua identidade de nascença, porém, é também óbvio que deve ficar claro ao atendente, que é possível se tratar de um caso de mudança de sexo. Portanto, se quem chega na recepção do lugar e se chama Carlos, mas pede para ser chamada de Carla, esta pessoa tem o direito de ser respeitada e que seja acatado este direito. Agora, cria-se um hospital segregatório para não constranger a quem? A pessoa que está recepcionando ou quem é recepcionada? Queridas leitoras, por favor, estou em dúvida, me iluminem, o que temos que fazer, nos segregar ou tentarmos ser respeitados?
A educação deve existir nos lares e nas escolas, o governo deveria se preocupar com isso e com a qualidade do ensino público. À medida que as pessoas são educadas para a convivência com a diversidade não é preciso excluir. Porém, se eu estiver errada e que digam os gays, travestis e transgêneros, é preciso que o atendimento seja setorizado desta forma e que exista esse tipo de segregação para que a área da saúde pública caminhe para um atendimento humanizado e digno a qualquer indivíduo?
Agradeço as opiniões e fico tranquila que até hoje nenhum médico tenha me tratado com diferenciação pela minha orientação sexual.
* Regina Claudia Izabela é psicóloga e escreve semanalmente neste espaço. Participe, envie perguntas ou comentários para o e-mail claudia@dykerama.com.