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Do que sentir orgulho?

Daqui para frente começa o ciclo de paradas por todo o Brasil, e a de São Paulo não é a primeira, mas com certeza é a mais concorrida e a que mais traz a discussão do título deste artigo: do que sentir orgulho?

Neste sentido, refletindo sobre o que as paradas representam para nós lésbicas, bissexuais, gays, travestis e transexuais, percebemos que passamos um mês comemorando e participando de inúmeras atividades, mas não paramos para pensar o que isso realmente representa e se transforma ou não a sociedade.

Me vejo também refletindo se sabemos o porquê da existência dessas manifestações. E, com isso, relembro a história que nos conta quando tudo isso começou. Foi em Nova York, há 39 anos, quando homossexuais e travestis resistiram à repressão policial no bar Stonewall, em Nova York. Desde então, comemora-se no dia 28 de junho o Dia do Orgulho GLBT. No Brasil, a primeira parada aconteceu em 1995, na cidade do Rio de Janeiro, e no ano seguinte em São Paulo. Atualmente, são mais de cem paradas pelo Brasil.

O chamado orgulho que se criou em 1969 e foi derivado da resistência à violência é o mesmo que vivemos até hoje. São quase 40 anos e me pergunto: O que mudou? Do que sentir orgulho?

Claro que me orgulho dos muitos avanços que conquistamos, mas em relação aos nossos direitos individuais quase nada conseguimos. O Judiciário tem nos dado alguns avanços, como direito a pensão, a inclusão das nossas companheiras nos planos de saúde; o Executivo alguns outros avanços, como o Programa Brasil Sem Homofobia, que prevê mais de cem ações para combate e prevenção da homofobia, os Centros de Referência para a população LGBT e por fim, a I Conferência Nacional GLBT, que acontecerá em Brasília entre dias 5 e 8 de junho.

Também me orgulho de ver a parada com mais de 3 milhões de pessoas, de ter avançado para o interior do Brasil, de ver tantas pessoas negras participando, o que nos mostra que hoje ela não é só nossa, da militância, mais é de todas e todos nós. Me orgulho de estarmos na 6ª edição da Caminhada de Lésbicas e Bissexuais, que começou com poucas de nós e hoje somamos mais de duas mil mulheres.

Mas, infelizmente, não podemos nos orgulhar do nosso Legislativo, que até agora não conseguiu aprovar nenhum dos projetos que garantam proteção à nossa vida, aos nossos bens, ao nosso direito de ir e vir, de cuidar de nossas filhas e filhos, de chorar pela morte de nossas companheiras, de não sermos discriminadas na busca de um emprego. Enfim, tantos direitos, os mesmos que em tese estão previstos e garantidos pela nossa Constituição, mas que em nosso país não é respeitada. Mesmo país onde alguns setores religiosos ainda têm grande influência na formulação de leis e políticas públicas, mesmo vivendo em um Estado laico. E é justamente disso que não posso me orgulhar…

No próximo domingo, a avenida Paulista estará lotada, estaremos todas nas ruas comemorando nosso orgulho e para muitas de nós o dia da parada é o único dia em que saímos do armário e expressamos nossa afetividade sem medo. Este ano o tema da Parada é “Homofobia Mata! Por um Estado Laico de Fato!” Espero que este tema possa nos fazer refletir sobre o mundo que estamos construindo e sobre as nossas ações. Façamos uma reflexão sobre tudo isso: discriminação, intolerância, preconceito, exclusão social. Vamos todas sair às ruas no domingo para exigir nossos direitos e aproveitamos para fazer a nossa parte.

Boa parada para todas nós e até domingo!


* Irina Bacci é coordenadora do Coletivo de Feministas Lésbicas, freqüenta a parada desde 2004 e sente orgulho de ser mulher, lésbica e feminista.

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