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Doce Deleite

Uma platéia praticamente feminina e lotada, em plena quinta-feira, para se deliciar com um ator galã não é comum – e ultimamente também não é raro. Doce Deleite, de Alcione Araújo, em cartaz no Teatro Raul Cortez, traz para boca de cena o global Reynaldo Gianecchini e na platéia um séqüito de fãs que suspiram e reagem “involuntariamente” em cena aberta. Belo e cativante, Gianecchini se desdobra em diversos papéis para provar que não é só um rosto bonito.

Camila Morgado divide a cena com o astro e assume a bronca de segurar o nível artístico da encenação, quando o companheiro não consegue. Camila tem time de comediante, empatia e versatilidade. Sua voz é bem colocada e articulada em todos os momentos a ponto de brincar com suas possibilidades. Canta com facilidade, diferente do companheiro de cena, que mesmo se esforçando fica aquém.

Ok! Uma peça como Doce Deleite não seria representado por qualquer um: Gianecchini é no mínimo corajoso, o galã arregaçou as mangas e foi dar a cara à tapa. O ex-modelo, garoto bombril, galã de novela, marido de “jornalista mais velha”, labuta um espaço entre os atores. Gianecchini é um ator que ainda não achou uma linha de trabalho que torne suas particularidades e possíveis deficiências em algo positivo.

A peça de Araújo parece datada logo na primeira cena, quando vemos o contra-regra contar o borderô, reclamando das meias-entradas, dos convites etc. Para um público que paga R$ 80 o ingresso, a situação é no mínimo contraditória.

O texto é praticamente uma peça a ser encenada no circuito off, ou abrasileirando o termo, poderia ser apresentada na praça Roosevelt, onde as situações dos atores e funcionários retratam com mais veemência os subterfúgios do teatro.

Marília Pêra dirige com mão de ferro seu recém pupilo, e toda essa marcação – benéfica para o ator – é visível em Tia Mariângela, aquela que vai te ensinar a chupar sorvete. O ator se sai bem, brinca com os estereótipos e está à vontade mesmo quando o público suspira fora de hora. É a melhor cena do ator.

O melhor momento da encenação é quando os atores riem de si mesmos em forma de cachota venenosa que disparam entre si. Essas “alfinetadas” fazem parte dos bastidores teatrais, tanto quanto aquelas que o público visualiza.

Marília poderia ter brincado mais com esses momentos – ou intercalado eles – e ousado atualizar a crítica embutida no texto. A diretora – atriz da primeira versão ao lado de Marco Nanini – mantém o qüiproquó do original, mas sabe o que leva o público ao delírio e permite uns “cacos” – talvez – previamente elaborados.

De doutor, idosa, cantora de ópera, bilheteira, primeira atriz e bailarina, Camila provoca risos e equilibra as deficiências da encenação em virtude de um texto longo e por vezes tedioso. Se Giane causa empatia por sua inegável beleza, Camila equilibra a peça com sua competência.

O camarim dos atores é cercado por um voal com dois contra-regras a postos para que o ritmo não caia e os atores não se percam nas diversas trocas de roupas. Doce Deleite tem boas piadas, ora em virtude do texto, ora em virtude da direção, ora pelo talento de Camila, aquela que segundo Gianecchini é o tipo de atriz que é “densa, tensa e intensa”.

O deleite para os olhos fica a cargo do ator que aprende diariamente os percalços e caminhos de um bom comediante. Giane se esforça e seu público o apóia. Mas convenhamos, ele é o verdadeiro deleite.

Serviço:
Doce Deleite
Teatro Raul Cortez
R. Dr. Plínio Barreto, 285 – Bela Vista – Centro. Telefone: 3188-4141.
Aceita os cartões Amex, Diners, MasterCard, Visa. Ingresso: R$ 80 a R$ 100.

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