"… Sou o que quiser, oh Zé Mané!" completaria minha amiga Léo Áquilla em sua música Camaleoa. Aliás, Léo, como vocês devem estar sabendo, seguirá rumo aos Estados Unidos para uma turnê internacional. É escândalo, meu amor…
A música surgiu em um dia que Léo foi a um banheiro público e quando estava entrando deu de encontro com um sujeito que estava saindo e a mediu de cima a baixo. Léo – que não é boba nem nada – voltou e quando o fez o tal sujeito perguntava para o faxineiro do banheiro "Escuta, o que é isso aí? É homem? É mulher?" e Léo, já toda trabalhada no argumento respondeu: "Sou o que quiser, oh Zé Mané".
Aliás, esta pergunta simples, mas carregada de ideologias, está presente em várias situações de nossas vidas. Lembro-me quando minha cunhada estava grávida de seu primeiro filho e não sei quantas vezes ouvi as pessoas perguntarem: "É menino ou menina?". E várias eram as brincadeiras, baseadas em crendices populares, que as pessoas faziam para saber se o bebê seria ele ou ela. O ultrassom confirmou, era menino. E logo todo o enxoval do garotinho foi preparado, todo trabalhando nas cores azul, verde e, no máximo, um amarelinho sem graça. Quatro anos depois, outro menino. A história foi a mesma. Dez anos depois mais uma gravidez (ainda bem que eu tenho o útero seco!). Agora, o ultrassom já dizia outra coisa: era uma racha. A alegria, os preparativos, a escolha do nome… Tudo igual… Só mudaram as cores. As roupinhas, carrinho, berço, tudo nos tons de rosa, vermelho, lilás e por aí vai…
Essa pergunta nos acompanha em outros momentos da vida. Quando vamos comprar um brinquedo para uma criança a loja está estrategicamente dividida em brinquedos para meninos (carrinhos, bolas, armas, super-heróis) e para meninas (bonecas, casinhas, mini cozinhas, acessórios variados). Se você não for ágil o suficiente, o vendedor logo perguntará "Posso ajudar?" e se você responder afirmativamente ele dirá: "É pra menino ou menina?". Na minha infância eu odiava bolas, armas, ou bonecos como os da série "Comandos em Ação", no entanto, adorava o "Pequeno Pônei" (afinal, aquele cavalinho é praticamente uma drag) e a Barbie da minha vizinha. Mas nunca que meu pai ia comprar um deles pra mim, né? Tudo bem, hoje eu tenho…
A gente chega a adolescência e juventude. Época de começar o atraque… Passam os anos mas o enredo trabalhado no erro continua o mesmo. Primeiro que, geralmente, as vendedoras tentam adivinhar pra quem é o produto. Até hoje não entendo porque elas tem essa mania, mas… "É pra você?" logo perguntam. Se a resposta for sim (no caso dos meninos), bermudas, calças e camisetas pretas, azuis, cinza e verdes com estampas de esportes radicais serão postas à sua frente. Se não, vestidinhos rosas brotaram feito flores à sua frente… Mesmo que não seja a primavera.
Depois de tantas experiências, finalmente chegamos à fase adulta. Até dá pra pensar que, mais amadurecidos, as bobagens e ideologias todas tenham caído por terra. Para alguns sim, para muitos não. Conheço homens que jamais usariam uma camisa ou uma gravata rosa pelo simples fato de ser rosa. Ou mulheres que não usam calças (sem serem as religiosas) porque alegam que mulher deve usar saia ou vestido. Uma curiosidade: no Palácio da Justiça, em São Paulo, mulheres não podem entrar vestindo calças, apenas saia ou vestido. Dá pra acreditar? Pelo menos era assim até quando eu trabalhei num dos fóruns da cidade…
Enfim, uma bobagem tola, mas que pode se tornar questão de honra para algumas pessoas ou constrangimento para outras. Eu, que sempre levei a vida tranquilamente e nunca tive receios de assumir quem sou e do que gosto, não tenho problemas com isso. Mas imagino a dificuldade de um homossexual não assumido em comprar um presente para o namorado, afinal, os vendedores de lojas (não sei o porquê) sempre partem da premissa que homens compram presentes para mulheres e vice-versa.
Meu Jesus, quando é que as pessoas vão entender que isso é a mais pura besteira criada pela própria cultura? Aliás, estou lembrando de Jesus e de sua mãe Maria. O manto dela é sempre retratado em azul, tem até uma música da igreja que diz "azul é seu manto, branco é seu véu…". Isso porque, há séculos, azul era cor designada única e exclusivamente para mulheres. Hoje não é mais assim…
Santa Ignorância! Rogai por nós que desejamos um modelito azul… ou rosa! Que não somos nem homens, nem mulheres… Somos apenas gente!
Beijo, beijo, beijo… Fui…