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“É possível fazer política sem fazer negócio”, diz Marcos Fernandes, candidato gay em SP

Marcos Fernandes está filiado ao PSDB desde sua fundação. Ajudou a criar a juventude do partido e passou pelo núcleo de educadores. Durante a adolescência militava no movimento religioso. Hoje é o único homem gay assumido candidato a vereador na cidade de São Paulo.

Em entrevista ao site A Capa, Marcos fala sobre suas propostas para a comunidade LGBT e seus projetos na área da cultura e educação.

Por que decidiu ser candidato?
Sempre fui uma pessoa política, passei por vários cargos no governo e tem um momento que você tem que dar a cara a bater também. Acho que contribuo não só pra comunidade, pra diversidade e pros LGBTs, mas também para a cidade de São Paulo. Há muita coisa para se discutir aqui como a cultura. É preciso integrar a cultura a educação e esporte e trazer o debate da ética. É possível fazer política sem fazer negócio.

Você acredita mesmo nisso? Acha que é possível mudar essa mentalidade da Câmara?
Sim, acredito. É possível. As pessoas não podem deixar que só quem quer fazer negócio saia candidato. O vereador não é eleito para ser oposição ou ser governo, foi eleito pra representar a cidade. Participar do governo significa que ele também tem ações do governo. O que não pode ser é você trocar cargos de pessoas que não estão preparadas para fazer as tarefas que o cargo exige só por troca de voto na Câmara. Isso é muito ruim, acaba com a democracia, acaba com qualquer sistema de governo. O Brasil precisa mudar isso. O que a gente vê é que tem muito essa troca de cargo. Os partidos que pressionam o governo em geral ganham ministérios, secretarias e isso nos três níveis de poder. Isso tem que acabar.

Por que acha que deve ser eleito?
Acho que devo ser eleito porque estou apresentando proposta de participação, de ética na política. O que vai me credenciar pra ser eleito é o quanto as pessoas se sentiram prestigiadas e integrantes desse projeto.

Dentro e fora da área LGBT, quais são suas propostas?
Deixando claro que o papel do vereador é fiscalizador das ações do governo, mas ele é um agente político e pode apresentar propostas para o prefeito. Então quando falo sobre capacitação na área de turismo e cultura não é o guia turístico nem o ator, são as pessoas envolvidas nesse segmento. É o atendimento ao turista, a pessoa que trabalha com tudo que envolve a apresentação de uma peça de teatro, cinema. É esse tipo de profissional.
 
Um iluminador… o pessoal que fica nos bastidores?
Sim. Essa mão de obra é rara, tem pouca disponibilidade e quando tem é por preço alto. O que a gente quer é criar oficinas nas comunidades, que o pessoal seja capacitado pra trabalhar nessas funções.

Na sua opinião, o que falta na área de cultura?
Falta mão de obra e incentivo a cultura. Uma coisa muito interessante criada nessa gestão foi a Virada Cultural. É uma ação que não pode parar por aí. O orçamento da cultura é muito pequeno e a cultura ainda é vista como entretenimento e lazer. Ela pode ser vista como geração de renda. Educação, esporte e cultura. É isso que eu quero levar.

Inclusive pro segmento LGBT?
Sobretudo pro segmento LGBT. É muito complicado falar o que você vai fazer para essa comunidade. Se você tem por principio que tudo que se refere a preconceito e discriminação tem que ser combatido, não preciso toda vez falar sobre isso. Até porque a questão da homossexualidade não pode ser dita só a partir do ponto de vista do preconceito. Nós somos uma comunidade feliz. Fazemos a Parada, as casas noturnas estão sempre cheias, a juventude tomou conta agora da Praça Alexandre Gusmão.

Algumas das suas atividades no inicio da vida política eram na igreja. Hoje você é o único candidato gay assumido na cidade. Como é isso? Ainda tem apoio desse segmento?
Há algum tempo a igreja não apóia claramente nenhum candidato. Tenho alguns amigos religiosos que estão me apoiando. A relação com a igreja sempre foi muito tranqüila. O debate religioso sobre a homossexualidade está com foco errado, mas isso não é tema da campanha municipal…

Como foi quando se assumiu homossexual?
Foi no dia em que eu descobria que eu abria o olho, respirava. Nunca fui diferente. Na minha adolescência sexualidade era ainda tabu. Fui aprender na escola, na 5ª, 6ª série o que era gravidez. Esse tema é mais recente. A Parada trouxe, aqui pra São Paulo e para o mundo, essa liberdade que se tem. Ela colocou a sexualidade em pauta. Na minha adolescência não tinha isso então eu não sabia direito o que era [ser homossexual]. Mas aos 15, 16 anos eu percebia que me sentia mais a vontade com os meninos. Nunca escondi, mas também nunca publiquei. Quando perguntam meu nome eu falo Marcos, não ‘Marcos homossexual’. Minha sexualidade é minha, não é uma bandeira. Não sei em qual momento me assumi. A vida inteira eu fui assim.

Você falou que não faz da homossexualidade uma bandeira, mas ela também será uma das pautas da sua candidatura, não?
A principal pauta da candidatura é a diversidade, não a homossexualidade.

Você trabalhou na Secretaria de Participação e Parceria. Como foi essa experiência? Qual era seu cargo?
Eu era chefe de gabinete da secretaria. A experiência fui muito boa. Trabalhávamos com todos segmentos: mulher, negro, jovens. Fizemos vários projetos interessantes, na CADS também, como a criação do Conselho [Municipal de Atenção a Diversidade Sexual]. Fizemos as primeiras negociações do Centro de Referência, a CADS estava nascendo ainda.

Por que se sente preparado para ser vereador?
O fato de eu conhecer muito bem o regimento da Câmara, o fato de eu ter trabalhado na casa por dez anos e entender muito bem o papel do vereador e ter sido político, estar no mesmo partido desde sua fundação, eu acho que é um diferencial. Acho que ajuda muito. Vou chegar a Câmara discutindo o regimento interno, já sabendo o que fazer. Imagino que quem não tenha essa participação política pode ter boas idéias, mas vai ter mais dificuldades para se adaptar a esse sistema.

Alguns eleitores já se manifestaram que não levam a sério a candidatura de drags. Como você vê essa questão?
Acho que já respondi isso quando falei que o que interessa são as idéias, não o gênero, não a sexualidade. Não tem nada que impeça qualquer drag, qualquer travesti de ser vereadora, deputado, senadora ou senador. O que leva as pessoas é a capacidade, a intelectualidade, a capacidade de agregar.

Se você não fosse candidato e uma drag tivesse propostas com as quais você concordasse ou acreditasse, você votaria nela?
Sim, poderia votar. Sem nenhum problema. Sempre votei em pessoas do meu partido. Sou um cara partidário. Quando Beto de Jesus foi candidato fiquei muito inclinado a votar nele, mas naquele momento eu trabalhava com o deputado federal Franco Montoro e por uma questão ética não pude dar meu voto ao Beto.

Você falou que é um cara partidário. Você esteve na campanha LGBT do Alckmin e também do Kassab. Está apoiando qual dos dois candidatos?
Sou do PSDB. Trabalhei na gestão do Kassab e ajudei a construir o que eu acredito que hoje foi uma boa administração. Tudo que se refere a diversidade eu participei. Fiz parte do grupo que criou a CADS, o Conselho, o Centro de Referência. Não tem como virar as costas e falar ‘ele não presta’. O Kassab é um grande prefeito, mas o candidato do meu partido é o Alckmin.

Um dos principais problemas da população LGBT da cidade é em relação a ataques homofóbicos. Acredita que a cidade precisa de uma lei anti-discriminação?
A cidade pode ter uma lei contra a homofobia. Colocamos isso no programa de governo. Agora pode se acabar com a homofobia, não só com lei, por força de política, mas também pela educação. A educação é mais importante do que lei. Mas acho que todo crime de discriminação pode ser punido.

O Kassab vetou a lei que punia a discriminação por orientação sexual no município. Como você vê isso?
Ele foi infeliz. Foi mal orientado, mal assessorado. Se o projeto tinha alguns problemas, antes da votação poderia ter sido resolvido. O importante é que logo o governo apresentou outro projeto pra corrigir alguns erros e ele está lá na Câmara para ser votado.

Nesse sentido, uma das criticas do eleitorado e de alguns adversários é que Kassab não teve vontade política de fazer com que o projeto fosse votado.
Não é tão simples assim não. Não sei dizer se não houve vontade política, mas a pressão contrária é muito grande e da nossa parte ela é muito pequena. Não gosto de usar esse termo, mas quem são os homossexuais eleitos para brigar pelos homossexuais? Não temos, pelo menos assumidos. A comunidade precisa refletir sobre isso. Ela não elege seus representantes.

Você acha que esse cenário pode mudar nessa eleição?
Acho, acredito que sim. Estamos trabalhando para isso.

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