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Flores Brancas

Luiza (Zeza Mota) é uma cineasta na faixa dos “trinta e muitos anos”, que se vê encantada por Vitória (Luciana Caruso), a interiorana que veio estudar cinema na USP. Elas se esbarram num show, trocam contatos e algum tempo depois resolvem se encontrar. Afinal, num torpedo não cabe tudo o que sentimos.

As expectativas geradas pelas inúmeras trocas de e-mail deixam Luiza e Vitória fragilizadas, com a possibilidade de uma paixão. Aparentemente inviável, um relacionamento entre duas mulheres de mundos tão distintos (Luiza é elegante e parece rebuscada, enquanto Vitória é brejeira e espalhafatosa), soa verossímil em virtude da química que há entre as atrizes.

Zeza Mota é sóbria e contida, contrapondo-se com Luciana Caruso, que soa histriônica em alguns momentos e registra sua personagem num universo juvenil de garotas pop, dessas que à primeira vista parecem fúteis e ingênuas.

“Flores Brancas”, de João Fabio Cabral, é uma surpresa. Não pelo texto, que nada acrescenta, além de engessar em alguns momentos a dinâmica da peça, num formato descompromissado. Não há conflito. O clímax reservado para o final é potencializado pela direção de Fabiana Carlucci e Rogério Harmitt, estes sim responsáveis pelo diferencial que a peça oferece.

A dramaturgia de Cabral escorrega na obviedade ao citar Maria Bethânia e na pieguice ao se referir ao casal Romeu e Julieta. A realidade é muito mais complexa, mas como cada um sabe o tamanho do amor que precisa, talvez flores brancas baste.

Fabiana e Harmitt (este responsável também pelos cenários e figurinos) deram charme ao texto de Cabral, que em mãos menos sensíveis não sairia do lugar comum. O público é pego pela delicadeza e o bom gosto com que a dupla de diretores conduz a história. A trilha sonora selecionada por Fernanda Galetti ajuda a dar um clima cool para a história, fugindo das velhas referências musicais e propondo uma densidade instigante em certos momentos.

As cores quentes usadas no cenário e no figurino e a iluminação simples e eficiente de Ricardo Silva ajudam a complementar um texto frágil, sobre a atração (fatal?) que duas mulheres sentem uma pela outra. A paixão deixa todas as pessoas engraçadas e faz com que perca um pouco os critérios comportamentais. Talvez isto explique a insegurança da mulher mais velha.

O ponto alto do trabalho fica para a temida cena de sexo. Eis aí um dos melhores momentos da montagem, que com sutileza e erotismo retrataram em forma de quadros a primeira noite de “amor” de Luiza e Vitória.

A flor que justifica o título romantiza a cena e reflete a sensibilidade dos diretores, que praticamente tiraram leite de pedra, e só não fizeram de “Flores Brancas” uma montagem emocionante e inesquecível, porque o texto não propunha está possibilidade.

“Flores Brancas” destoa da maioria das peças que abordam o universo homoerótico e merece ser vista. É um trabalho sincero que foge dos clichês e dos estereótipos, presentes em peças do gênero.

Depois da peça talvez você preste mais atenção nas pessoas que esbarram em você.

* Rodolfo Lima é ator e jornalista.

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