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Folha volta a usar palavra homossexualismo; Jornalistas e militantes comentam

Em 1980, o Conselho Federal de Medicina retirou da Classificação Internacional de Doenças a homossexualidade. Em 1990, seria a vez da Organização Mundial de Saúde e, por último, em 1998 o Conselho Federal de Psicologia faria o mesmo e ainda proibiria qualquer psicólogo de "curar pessoas do homossexualismo". Desde então, o movimento e outros setores LGBTs decidiram abandonar o uso da palavra homossexualismo, por ela estar ligada ao conceito de doença e desvio psíquico. Passaram a usar o termo homossexualidade e, até hoje, aconselham os meios de comunicação a fazerem o mesmo.

Porém, há cerca de um mês o jornal Folha de São Paulo, por meio do seu controle de qualidade, anunciou que voltaria a usar a palavra homossexualismo, pegando muita gente de surpresa. Ao entrarmos em contato com a jornalista Ana Estela de Souza, editora de treinamento da Folha, ela nos informa quanto a orientação do jornal nesse sentido. "Nossa orientação sobre isso é simplesmente que se usem as palavras no sentido correto delas. Os termos não têm exatamente o mesmo significado. ‘Heterossexualidade’, por exemplo, é tudo o que assume o caráter de heterossexual; ‘heterossexualismo’ é a prática de heterossexualidade (por exemplo, uma relação sexual entre homem e mulher)".

O jornalista Sérgio Ripardo, ex-editor da Ilustrada Online e ex-colunista de Destaque GLS, da Folha Online, comenta a orientação do jornal em questão. "A área de controle de qualidade do jornal analisou queixas de militantes sobre o uso de "homossexualismo" e concluiu que o sufixo "ismo" não remete à doença. Para justificar, o controle de qualidade citou outras palavras como "budismo", "catolicismo", "espiritismo" e a ausência de questionamentos de que essas religiões seriam doenças. Achei os exemplos meio forçados", diz Ripardo.

A antropóloga e ex-vice presidente da Associação da Parada GLBT de São Paulo [APOGLBT], Regina Fachini, diz estranhar tal orientação e afirma que a atitude pode "além de confundir as pessoas quanto a qual palavra usar". "É estranho um jornal como a Folha decidir voltar a usar esta palavra, pois quem usa socialmente "homossexualismo" são os fundamentalistas", diz. Frente a isso, Regina diz que se pode pensar duas coisas, "quando você lê homossexualismo você pensa: a pessoa é desinformada ou preconceituosa?".

O editor da revista Caros Amigos, Mylton Severiano, conta à reportagem que nunca tinha parado para pensar em tal questão, pois o uso de homossexualismo e homossexualidade foi por um bom tempo palavras "praticamente sinônimas". Porém,  afirma não ver problemas, caso seja uma demanda do movimento LGBT, em recomendar "aos nossos colaboradores que passassem a evitar homossexualismo e adotassem homossexualidade". Sobre a posição do jornal o editor diz que "a Folha deveria levar isto em consideração".

Na questão do uso da palavra e o contexto ao qual estará inserida, a jornalista da Folha de São Paulo, Ana Estela de Souza, diz que o jornalista não pode ficar refém do politicamente correto e deve sim ficar atento quanto ao uso da palavra, "o que um jornalista não deve fazer é substituir indiscriminadamente o termo homossexualismo por homossexualidade. Cada palavra deve ser usada no seu sentido correto". A profissional afirma ainda que "a Folha recomenda que o jornalista reflita seriamente sobre a importância de informar sobre a sexualidade de um personagem da notícia e que tome cuidado para evitar preconceitos e estereótipos".

Com argumento parecido, o jornalista Sergio Ripardo diz que continuou a usar homossexualidade para "não irritar leitores conscientes sobre as sutilezas da língua", também acredita que usar homossexualismo não "seja um desserviço ou vá confundir alguém".  Para ele o mais importante é o contexto em que a palavra será usado. "Um texto homofóbico poderia usar ‘homossexualidade’ e nem por isso deixaria de ser uma afronta aos gays", exemplifica. Ripardo também diz que é preciso tomar cuidado com o patrulhamento excessivo do uso de palavras pois, "perde um pouco o foco e mete ainda mais medo nos leigos de cometer alguma gafe".

Com opinião diferente, Regina Fachini diz que acha curioso o jornal ignorar algo que é uma "convenção social". "É justamente esse o papel da mídia, estar sensível a essas mudanças na sociedade", opina. Para a militante "todo mundo que usa [homossexualidade] rompe com a idéia de doença", e a postura de usar o "ismo" só vai "confundir as pessoas e também disseminar o conceito de doença ligado a palavra".

Visão semelhante à de Regina nutre Mylton Severiano. O editor também acredita que atrapalha os leitores e dissemina o conceito negativo. "Um jornal com o peso de uma ‘Folhona’, um Estadão, um O Globo, enfim, os "jornalões", deviam atender a tais recomendações sociais, por que não? Não lhes custa nada", diz Mylton ironizando.

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