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Fui vítima de discriminação no Carnaval. E agora?

O ano de 2016 começou com tudo.

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Em São Paulo, tivemos um carnaval de proporções nunca antes vistas. Enquanto muita gente se divertia, infelizmente, houve também quem aproveitasse a oportunidade para desrespeitar o próximo.

Relatos de machismo, racismo e homotransfobia não são nada raros.

E, como o A Capa é um portal voltado para a comunidade LGBT, por que não falar sobre casos de assédio homofóbico e transfóbico que covardemente pegaram os foliões e as folionas de surpresa?

Pensando nisso, no artigo de hoje, quero falar sobre o que fazer caso você tenha sido vítima de assédio homofóbico, lesbofóbico, bifóbico ou transfóbico.

Então vamos lá. Primeiro falarei sobre a atuação criminal. Depois, falarei sobre a atuação cível e administrativa, outras duas esferas de atuação que também são possíveis. Caso você tenha sido vítima de uma agressão física, antes de tudo, junte algo como 2 ou 3 testemunhas do ocorrido e procure uma delegacia de polícia mais próxima para fazer o Boletim de Ocorrência, que muita gente conhece por B.O.

Caso a agressão tenha sido grave, chame o 190. E, caso as testemunhas não queiram acompanhá-lo, elas podem, pelo menos, ajudar fornecendo nome completo e telefone de contato.

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Uma vez na delegacia, você tem o direito de exigir o respeito ao seu nome social, de modo a ser chamada ou chamado por ele e de modo a fazer constar o mesmo no Boletim.

No estado de São Paulo, esse direito é garantido pelo Decreto Estadual 55.588/2010, que pode ser acessado clicando aqui. Além disso, se você acredita que a agressão tem motivação intolerante, isto é, pelo simples fato de ser LGBT, exija que isso conste no Boletim. Essa também é uma garantia dada pelo governo estadual e que devemos fazer valer.

A autoridade policial, então, deve encaminhá-lo ao Instituto Médico Legal, onde você será submetido a um exame de corpo de delito, que documentará as lesões sofridas e, algum tempo depois, fornecerá um laudo médico. Uma cópia desse laudo será enviada à autoridade policial e outra pode ser obtida por você mesmo na Polícia Científica.

Se a lesão sofrida for de natureza leve, isto é, se não te deixar incapacitado para trabalhar por 30 dias ou mais, você deve retornar à delegacia para representar contra os agressores. Caso contrário, a autoridade policial não terá sua autorização para começar as investigações, e nada será feito. Se a lesão for média ou grave, a investigação correrá independente de sua autorização. Caso você tenha sido vítima de uma agressão verbal e/ou ameaça, aqui em São Paulo, você pode registrar o Boletim de Ocorrência pela delegacia virtual (para acessá-la clique aqui).

Após registrar os fatos da forma mais objetiva possível, você deverá ir à delegacia indicada no Boletim de Ocorrência Eletrônico para representar contra os suspeitos. E, então, começa a investigação policial.

A investigação deverá seguir seu curso natural e nessa fase você pode contratar um advogado para ajudar a polícia nessa tarefa. Reunindo-se provas de que o crime de fato ocorreu (materialidade) e que indiquem a autoria (quem praticou), você pode abrir uma Ação Penal contra seu agressor.

Fora da atuação criminal, você também tem o direito de processar o agressor e outras partes que respondam por ele nas esferas cível e administrativa. Aqui entra em cena o que chamamos de "responsabilidade objetiva". Isso significa que você pode processar tanto a pessoa que diretamente te discriminou quanto a empresa ou instituição que responde pelos atos dela no momento do crime.

Por exemplo, se você foi vítima de uma agressão (não importa o tipo) praticada por um funcionário público no exercício da função, cabe processar o poder público (município, estado ou União), que ao final pagará o valor a que for condenado pelo juiz.

Se você foi agredido dentro de uma balada, seja por um funcionário ou outro frequentador, você também pode processá-la, afinal ela deve zelar pela segurança de seus clientes.

E quais provas você deve juntar para entrar com uma ação cível e/ou administrativa? Tenha em mente que você precisa provar que a agressão de fato ocorreu e que você sofreu danos por causa dela, não importa quão ínfimos eles pareçam.

Se você apanhou, registre em fotos como os hematomas te marcaram. Você também pode usar a seu favor outras provas, como declarações de testemunhas atestando terem presenciado a agressão e a piora em sua qualidade de vida dela decorrente. Por exemplo, antes você era uma pessoa menos tensa e com sono fácil, mas agora você sofre para se concentrar e para dormir.

São exemplos hipotéticos, mas que efetivamente acontecem com vítimas de discriminação, então leve isso a sério. Não apenas com declarações de testemunhas, mas procure também ajuda médica. Se possível, faça acompanhamento psicológico. (E não dá para se esquivar dizendo que falta dinheiro, pois, pelo menos na cidade de São Paulo, há o Centro de Cidadania LGBT, da prefeitura, que oferece assistência psicológica gratuita para vítimas de discriminação.)

Posteriormente, esse psicólogo pode até testemunhar a seu favor no Fórum – ou apenas assinar uma declaração endereçada ao juiz explicando como sua vida foi afetada pela agressão sofrida. Com provas suficientes, você pode entrar com uma Ação de Indenização para pleitear a condenação dos responsáveis.

Esse valor, caso você ganhe, ao final do processo, será todo seu. Ao mesmo tempo, aqui no estado São Paulo (assim como no Rio de Janeiro e no Rio Grande do Sul), você também pode entrar com uma Representação pela Lei Estadual 10.948/2001, que prevê penas que variam desde simples advertência, passa pela multa (de aproximadamente R$ 20 a 60 mil reais) e, no caso de pessoas jurídicas, chega à suspensão ou mesmo à cassação da licença estadual de funcionamento.

Para quem vive em uma casa com renda familiar mensal de até três salários mínimos (aproximadamente R$ 2.700,00), uma boa opção é procurar ajuda totalmente gratuita na Defensoria Pública. Em São Paulo, ela conta inclusive com o Núcleo Especializado no Combate à Discriminação, Racismo e Preconceito, que é reconhecido por sua atuação muito combativa e inteligente, como quando houve a condenação de Levy Fidelix pelas declarações homofóbicas das eleições presidenciais de 2014.

Para quem vive numa casa com renda familiar superior a esse valor, a opção é procurar um advogado particular. Só não dá para não correr atrás dos seus direitos.

* Thales Coimbra é advogado militante e especialista em direito LGBT (OAB/SP 346.804); graduou-se na Faculdade de Direito da USP, onde, entre 2009 e julho de 2015, fundou e coordenou o Grupo de Estudos em Direito e Sexualidade, e onde cursa hoje mestrado na área de filosofia do direito sobre discurso de ódio homofóbico; também atua como advogado no Centro de Cidadania LGBT Arouche, da Prefeitura de São Paulo; e escreve quinzenalmente sobre Direitos no portal A Capa. www.thalescoimbra.com.br

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