Não importa que tipo de personagem LGBT esteja presente em qualquer produto teledramatúrgico: as pessoas parecem estar condicionadas a reclamar sempre – e negativamente, claro.
Mas por que reclamam? Quando uma série ou novela é lançada, costumamos analisar os personagens, se são verossímeis, afeminados, másculos, enfim, dissecamos-os por completo. Mas o público – boa parte dele pelo menos – parece nunca estar satisfeito: se é um gay afeminado, diz que reforça preconceitos; se é másculo, é higienizado para agradar a família; se é espalhafatoso, quase travesti, nossa, aí é uma guerra.
A questão é: as pessoas, de tanto quererem ficar longe dos estereótipos, não conseguem conviver com nenhum tipo de personagem gay, seja ele qual for. A impressão é que estamos diante de uma paranoia moderna: não parecer com nada e parecer com tudo ao mesmo tempo. Será que esse drama não tem a ver com a falta de identidade? Ou será que esse incômodo com as representações gays na TV está ligado à seguinte questão: de tanto querer ficar em busca de uma identidade, esquecemos de agir com naturalidade e não lembramos que qualquer um pode ser gay ou hétero?
Dos personagens discretos aos assumidos
Apesar do barulho em torno dos personagens LGBT é inegável o fato de que nos últimos cinco anos os gays nas telenovelas saíram do armário. Basta analisarmos a atual novela das 21h, "Insensato Coração", escrita por Gilberto Braga e Ricardo Linhares. No folhetim, há um personagem gay, Roni (Leonardo Miggiorin), no núcleo principal. Mas já andaram reclamando que Roni é uma bicha estereotipada…
Afinal, quem não é estereotipado? As pessoas esquecem que no dia-a-dia todo mundo vive um personagem: do executivo ao gay tresloucado. E por que nas telenovelas ou minisséries teria de ser diferente? Se justamente a construção dos personagens está baseada em tipos que permeiam o imaginário popular e do autor?
Acontece também que parte dos LGBT que critica esses tipos esquece que o mesmo acontece com os personagens heterossexuais. Novela é ficção, portanto, representação fantasiada de uma dada realidade.
Se fizermos um balanço levando em conta a primeira década deste século XXI, vamos constatar que tivemos homossexuais para todos os gostos, tanto na produção nacional quanto na estrangeira. Sem contar que tivemos os seriados "Queers as folk" e "The L Word", um ambientado no mundo gay e o outro no lésbico. Quanto a este último, a crítica dizia que estávamos diante de gays e sapatas bonitas, ricas e chiques. Porém, quem assistiu a uma das duas séries, sabe que ambas retrataram de maneira muito verossímil o cotidiano LGBT.
Esse incômodo quanto à representação da homossexualidade na televisão tem seu pé na homofobia internalizada e no machismo. Também tem uma forte ligação com a questão do binarismo de gênero, que encerra as pessoas entre homens e mulheres, héteros e homos. Talvez se a sociedade conseguisse superar as categorias sexuais e as tais identidades de gêneros, as pessoas não se incomodariam tanto com as representações televisivas em geral.
É preciso dizer que, enquanto vivemos sob o esquema binário, é ótimo que continuemos a ter personagens LGBT na teledramaturgia. Como apontado no título, ruim com eles, pior sem eles. Antes uma representação plastificada da realidade que a invisibilidade que encerra a comunidade gay no gueto e na ausência de direitos civis.
As novelas, ao lançarem o debate sobre a homossexualidade, fazem com que todas as classes sociais discutam o tema e revejam os seus costumes. É isso que faz a democracia ficar melhor e mais tolerante.