Educada, linda e simples — desde sempre — a hostess e DJ Gra Ferreira, 28, conquistou São Paulo e o exigente público gay. Aqui, revela, em entrevista exclusiva, o porquê e a que veio. Uma coisa é certa: a noite paulistana é apenas a sua primeira parada. O resto é só aguardar o tempo passar. A moça é pura conquista.
Filha de uma cozinheira com um chefe de segurança, nascida no início de tarde na Maternidade Nossa Senhora de Lourdes, no Jabaquara, passou a infância na periferia da capital — Brasilândia – e a adolescência no interior, em Santa Bárbara d’Oeste, a hostess e DJ Gra Ferreira, nascida Graciane Ferreira dos Santos, conquistou, em três anos, a noite gay nacional. O segredo? Garra, beleza, boa educação e – muito – bom humor.
Contratada da The Week desde seu primeiro dia, todos os sábados é saudada por milhares de gays que lhe dão beijinhos, fazem acenos, dão presentes e a elogiam e bajulam sem parar. Porém, amigos íntimos, poucos. Pouquíssimos. Conhecidos e que se dizem amigos: milhares. Apenas no Orkut da vida são mais de 1.600.
Charmosa e elegante, a geminiana é pura batalha. Guerreira? Pouco. Ela é gladiadora. Formada em Magistério, trabalhou por dois anos, no interior, em Saúde Pública e em São Paulo foi modelo e ilustrou inúmeros editoriais de moda. Não foi ser manequim em Nova York porque não quis. Nunca se curvou à ditadura da moda e não emagreceu os quilos que a agência de lá exigia. Os gays sempre estiveram em sua vida e pelo visto parece que nunca vão deixar de estar. Com vocês: Gra Ferreira, muito mais que uma linda mulher.
Quais os segredos para ser uma boa hostess?
Bom humor, boa educação e muita disposição. O resto se adquire com o tempo. Conhecer as pessoas, saber quem é quem, saber se virar em situações complicadas, enfim, tudo o que cabe à profissão.
Qual o maior aperto que passou como hostess?
Sempre encaro cada dia como um dia diferente, com situações e pessoas diferentes. Apertos existem, sim, mas existe jeito pra tudo! Até hoje nunca aconteceu nada tão grave que não pudesse ser resolvido, graças a Deus! Mas sempre tem algum probleminha bem comum, como não ter o nome da pessoa na lista, clientes que não gostam de esperar na entrada, aí tenho de dar uma atenção maior, explicar o motivo da demora; pessoas que entram em fila errada e ter de pedir que peguem a fila certa. No fim de tudo, acaba sendo bem prazeroso: conheço pessoas, faço amizade com algumas delas e surgem outros contatos de trabalho por causa disso!
Como surgiu o apelido Gra?
Não sei bem o motivo, mas quase ninguém consegue gravar meu nome, Graciane. Sempre ouvi coisas como Graciele, Graziela e até Gabriela! Aí, sempre que me apresento, digo meu nome e já falo: “Gra, mais fácil de gravar!”.
Quando veio para SP?
Em março de 2001, saí de Santa Bárbara para tentar coisas novas e foi bem complicado, pois estava deixando minha casa, meus pais, meus amigos e cheguei aqui em São Paulo sem nada concreto.
Qual foi seu primeiro emprego em SP?
Numa agência de modelos que estava abrindo as portas, a HDModels, do meu ex- booker, e especializada em modelos negros. Ele me convidou para fazer a parte administrativa. Detalhe, não tinha dinheiro no negócio, pois ele estava começando do zero. Eu sabia que teria apenas casa e comida. Foi uma fase muito boa, porém, bem difícil. Cheguei com R$ 25 que minha mãe ganhou numa máquina caça-níquel (ela adora bingos) e em moedas de R$ 0,25. Jamais vou esquecer essa cena.
Como surgiu a The Week em sua vida?
Logo após meu primeiro emprego, entrei na Foch indicada pelo meu amigo Marcelu Ferraz. A partir daí, o Marcelu praticamente me “empurrava” para as baladas, pois eu detestava sair. Ele foi me apresentando às pessoas, aos lugares, até o dia que conheci o André Almada. Quando nos encontrávamos, ele dizia que um dia eu trabalharia com ele. Até que surgiu a festa TOY e, a partir da segunda edição, eu e o Marcelu fomos convidados pelo Almada para sermos residente da festa. O projeto vingou, logo em seguida veio a The Week, e estamos lá até hoje, desde o primeiro dia.
Se amanhã deixar de ser hostess da The Week, quantos amigos lhe restam?
A princípio e sempre, os amigos que já existiam antes de eu ser a “hostess Gra Ferreira” ou a “DJ Gra Ferreira”! Esses são os amigos que freqüentam minha casa, participam da minha vida, conhecem minha família. Nesses três anos de noite, conheci muita gente, haja vista que cada fim de semana na The Week são, em média, 2.000 pessoas. Hoje tenho grandes amigos que conheci na noite, mas é óbvio que não são muitos. Conhecer pessoas é uma coisa, ser amigo de alguém é outra bem diferente. Sou muito flexível, adoro fazer amizades, estar em contato com todo mundo, mas para ganhar minha confiança é bem mais trabalhoso e complicado. Muitas pessoas conhecem e gostam apenas da imagem da “Gra Ferreira”, mas, no meu dia-a-dia, sou sempre a “Graciane Ferreira dos Santos”, que tem contas pra pagar e problemas para resolver.
Percebeu que poderia ganhar mais dinheiro como DJ?
Por mais que seja difícil de acreditar, o fator “dinheiro” é o que deixo sempre em último plano. Dinheiro é bom? É ótimo, mas, dentro dos meus princípios, não traz tanta felicidade como todo mundo diz não! Amo todos os meus trabalhos, seja como hostess, como gerente de marketing da Foch ou como DJ. E cada um tem sua importância nas minhas 24 horas do dia. Qualquer uma das minhas profissões é bem lucrativa sim, mas tenho de sentir prazer no que faço, me sentir bem, pois se não houver prazer, o negócio não anda.
Amores? Quantos?
Meu pai, minha mãe e o Marcelu. Minhas “três estrelinhas”, da minha tattoo. Amor incondicional, verdadeiro, que ajuda, orienta, que ouve, acolhe e aconselha.
Você já foi muito assediada por mulher?
Sim! Mas de uma maneira mais sutil do que o assédio masculino. A maioria das "cantadas" femininas sempre foi bem mais leve que a dos homens. Mas sempre encarei isso com tranqüilidade, nunca me incomodei com nenhum tipo de assédio, seja masculino ou feminino. Só não gosto quando, nessas "cantadas", existe aquele ar de desrespeito, que sempre aconteceu no caso do assédio vindo dos homens.
Seria capaz de amar uma mulher?
Quem me conhece muito bem já até sabe qual é a frase que uso nesses casos: "Eu gosto de pessoas!". A vida é sempre muito cheia de surpresas para acharmos que já temos certeza de tudo, não é mesmo?
Pretende largar a noite?
Hoje, não! Ainda quero fazer muitas coisas que envolvem a noite. O segredo de se manter bastante tempo nela é querer sempre evoluir. Comecei como hostess já estou partindo para a carreira de DJ e, com o tempo, vamos ver qual será o próximo passo! Sempre encaro a noite com bastante “razão”, partindo sempre do princípio que tudo nela é um ciclo, que tem começo, meio e fim.
Pensa em ser mãe?
Claro que sim! Há algum tempo nem cogitava a idéia, sempre fui uma pessoa extremamente independente e sempre me considerei uma “mulher moderna” e “auto-suficiente”. Mas, com o tempo, tudo muda, principalmente a visão que temos sobre essas coisas. Hoje, me vejo no futuro casada e com meus filhos.
O que é o pior e o melhor da noite?
Nada é pior nem melhor na noite! Óbvio que vemos algumas coisas intoleráveis, mas julgo sempre pelo ponto de vista no qual todo mundo tem liberdade de escolha e, principalmente, que escolhas geram conseqüências; então, se cada um estiver ciente de suas atitudes e suas conseqüências, Ok! Só não concordo quando algumas atitudes acabam prejudicando outras pessoas, direta ou indiretamente.
O que perdeu e o que ganhou com a noite?
Complicado responder isso, mas vamos lá. Na noite: ganhei amigos, oportunidades, mais dinheiro, mais trabalho, reconhecimento, aprendizado e conhecimento!
Perdi tempo para estar mais com minha família. É a única coisa que considero como perda de fato e, muitas vezes, fico triste por isso. Já me ausentei em datas importantes, como aniversários, Natal, Ano Novo, por estar trabalhando. Até pensei em largar tudo para estar mais próxima da minha família. Hoje, tento sempre trazer minha mãe pra cá, levá-la comigo para as festas. Ela adora!
Personagens da noite que você admira?
Marcelu Ferraz, pelo profissional e por estar 24 horas com ele, desde o início da nossa amizade, antes da noite, antes de qualquer coisa. André Almada, pela visão empreendedora que tem, por todo seu histórico evolutivo na noite e pela pessoa incrível que é, e o LJ Murphy da The Week. Se ele não estivesse ali, sincronizado na vibe do DJ, trabalhando a iluminação a cada batida da música, a pista não teria a mesma graça! Ele é uma pessoa incrível, de uma humildade sem tamanho. Já pararam pra pensar o que seria daquela pista da TW sem o Murphy?
O futuro é bi?
Se o futuro é bi?? Hoje, amanhã, depois, o futuro é estar bem resolvido consigo mesmo, assumirmos o que gostamos e o que nos faz felizes, independentemente de homem gostar de homem, mulher gostar de mulher, de homem, e mulher gostar dos dois! O primeiro passo é gostar de si próprio!
Como surgiu e qual trabalho desenvolve com a marca Foch?
Foi por indicação do Marcelu Ferraz. Já estou na Foch há quase seis anos e durante esse tempo já passei por tudo lá dentro. Cuido desde a parte administrativa da empresa até o trabalho de marketing, junto com o André Foch e o Alexandre Escudeiro (sócios da marca).
Beleza abre portas?
Uma vez meu chefe, André Foch, falou uma frase que nunca esqueci: “Quem tem beleza, já está dez passos à frente de qualquer outra pessoa!”. Óbvio que, se esse fator não estiver associado à inteligência e à competência, de nada adianta, tem de saber aproveitar. Mas, por tudo o que vemos no nosso dia-a-dia, feliz ou infelizmente, beleza abre portas sim, principalmente na noite, na qual as pessoas são, teoricamente, julgadas, a princípio, pela sua imagem.
Alguma porta já foi fechada por preconceito de raça?
Nunca sofri nenhum tipo de preconceito por causa da minha cor! Pelo menos, ninguém nunca me disse ou deu a entender que deixei de fazer algo por ser negra! Antes da cor pele, o que vem é a atitude e a postura de cada um!
Quais foram seus mestres como DJ?
DJ Morais e DJ Kiron, dois profissionais e amigos superespeciais, que tenho uma admiração sem tamanho, por tudo o que fizeram por mim, seja me ensinando a tocar, me orientando, me aconselhando, me dando bronca. O mínimo que posso fazer por eles é ser eternamente grata por tudo!
O que você não toca?
O que não faz meu coração acelerar. Estar no comando de uma pista é uma responsabilidade sem tamanho. Quero sempre tocar não só para os ouvidos das pessoas e, sim, para o corpo e o coração delas. É uma sensação incrível quando toco alguma música e alguém faz aquela cara de felicidade espontânea, como se aquela fosse a música da sua vida.
Você é religiosa? Como a fé surgiu na sua vida?
Sou católica, porém, não praticante. Mas minha vida é movida pela fé que tenho em Deus. Minha família é muito religiosa e minha mãe é a pessoa que mais tem fé neste mundo, em Deus, na família, no casamento, acredito que isso é o que faz com que ela seja tão guerreira! E tento me espelhar muito nela e no meu pai, nas piores situações que já passamos, nunca desanimamos, nunca ficamos desunidos, nunca brigamos por nada. Sempre faço minhas orações e agradeço a Deus por tudo o que acontece na minha vida.
A vida do gay é mesmo cor-de-rosa?
Na minha opinião, não. Fico bem chateada quando vejo que muitas vezes, ao se escutar a palavra “gay”, as pessoas logo associam isso somente à parte “cor-de-rosa” da coisa, pensando somente em festas e arco-íris, mas o lado real é bem mais amplo e sério que isso. Quantas pessoas são recusadas num emprego por ser gay? Quantas pessoas sofrem discriminação em locais públicos por ser gay? Quantas pessoas já foram agredidas e mortas por ser gay? Isso não é nem um pouco “cor-de-rosa”!
O arco-íris é mesmo um símbolo para a vida gay?
Adoro o arco-íris. Ele me remete à felicidade. Na verdade, o arco-íris deveria ser um símbolo para a vida em geral! Poderíamos interpretar todas as cores dele, e a mistura entre uma e outra, como se fosse a nossa sociedade e o mundo, óbvio que de maneira saudável, não como, infelizmente, vemos. Sei que é bem difícil o comportamento das pessoas mudar do dia pra noite, e, sendo bem sincera, se mudar, ainda vai demorar muito! Mas temos de acreditar em alguma coisa, não é? Senão, a vida perde o sentido! Ter uma bandeira, representando a união, aceitação e força, é uma simbologia muito forte, sim!
O que o gay tem de preto-e-branco na vida e a mídia não revela?
Muita coisa, e como tem! Ultimamente, a mídia até que tem se mostrado mais aberta em relação ao assunto, mas ainda é pouco. O que temos visto, da forma mais popular, são personagens gays em novelas, mas é sempre tudo tão bonitinho, né?
De tudo o que passou, o que nunca perdeu?
O caráter e a lealdade que tenho pelas pessoas que amo.