O movimento lés saiu fortalecido da I Conferência Nacional GLBT, ou melhor, LGBT. O evento, que ocorreu de 5 a 8 de junho na capital federal, trouxe conquistas e discussões importantes para mulheres que amam mulheres.
A principal delas, conforme noticiado aqui no Dykerama.com, foi a definição da sigla do movimento como LGBT, ocupando o L o primeiro lugar nas letrinhas. Com isso, o movimento no Brasil segue tendências internacionais que priorizam as lésbicas para combater os vários séculos de patriarcalismo e dominação masculina. São exemplos disso a International Lesbian and Gay Association, a Lesbian and Gay Foundation, do Reino Unido, e a National Lesbian and Gay Journalists Association, dos Estados Unidos.
Contra a hegemonia gay
A proposta, votada em plenário na manhã de sábado, em sessão que definiu o regimento interno da conferência, foi vista por alguns como uma tentativa de atrair a Liga Brasileira de Lésbicas para a Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais. A LBL, entidade que reúne mulheres lésbicas e bissexuais de todo o país é uma instituição forte, mas que se mantém independente da ABGLT, a fim de garantir que seu espaço de articulação política seja autônomo e não institucional.
Segundo José Dantas de Oliveira Filho, presidente do Grupo Afirmação Homossexual Potiguar, os motivos não foram somente ligados à visibilidade lês, conforme justificaram os defensores da seqüência que começa do L. “Estou pasmo aqui em Brasilia o movimento gay tem um dos seus piores dias na história. Por questões simplesmente eleitorais lideranças gays fazem acordo para trocar GLBT para LGBT, como se isso fosse a maior conquista desta conferência e a verdade é apenas uma eles querem poder permanecer em seus cargos sejam em governos ou em suas ONGs com orçamento astronômico”, afirmou.
No entanto, deixando-se de lado a discussão política, é inegável que lésbicas ganham mais visibilidade com o L na frente – questão fundamental tanto para a correção de desníveis provocados pelo machismo dentro do movimento. No último encontro da ABGLT, por exemplo, realizado em Maceió, AL, em 2006, somente 6% das organizações presentes eram de lésbicas.
Há um histórico de hegemonia gay no movimento, que, porém, vem sendo quebrado, sobretudo pelas TTs (travestis e transexuais). “Um momento de virada foi o encontro em Maceió”, disse a líder trans Fernanda Benvenutty para o Dykerama. “As TTs encabeçaram uma chapa de oposição e contaram com o apoio de grupos de lésbicas. Ainda que não ganhamos a eleição, nos posicionamos contra a chapa única”.
Recentemente, também foi lançado o Manifesto do Coletivo de Mulheres da ABGLT, que reuniu demandas de mulheres lésbicas, bissexuais e transexuais e visa, entre outros objetivos, “garantir a incorporação do feminismo no cotidiano, nas formulações e nas prioridades da ABGLT”.
Vale lembrar que as lésbicas ainda permanecem encolhidas no movimento LGBT, apesar de estarem presentes em diversos momentos chave. Cabe lembrar que durante a conferência as mulheres que amam mulheres eram majoritárias em alguns Grupos de Trabalho. No de Comunicação, por exemplo, a maioria das participantes eram lês como Elaine Gonçalves, da ONG goiana Colcha de Retalhos, e Rejane Soares, do Coletivo de Negras Feministas do Amazonas.
Cruzes contra a homofobia
Outro momento chave da conferência foi o ato conta a homofobia em frente ao Congresso Nacional, no sábado, dia 7, e que se repetiu no domingo, no Centro de Eventos Brasil 21. Novamente, lésbicas estiveram à frente.
A idéia do ato surgiu em listas de discussão na Internet e contou com a rápida adesão de militantes da Liga Brasileira de Lésbicas, especialmente Jandira Queiroz e Marinalva Santana. Jandira mobilizou-se para confeccionar o material da manifestação. Segundo Jandira, 73 cruzes foram divididas em 50 gays, 20 travestis e três lésbicas, relembrando os assassinatos cometidos somente esse ano, de acordo com dados coletados pelo Grupo Gay da Bahia. “Mas é importante lembrar que as mortes de lésbicas muitas vezes são noticiadas como mortes de mulheres, sem apontar a orientação sexual. Com isso, muitas vezes, elas não entram nessa estatística”, esclareceu a militante.
Ainda que com pouco público, o ato teve repercussão na mídia e marcou, de forma poética, o repúdio contra a violência baseada em orientação sexual ou identidade de gênero.
Na ponta
Por fim, é preciso registrar que as mulheres lésbicas capitanearam os principais processos de realização da conferência. Na comissão organizadora nacional, estavam presentes as fundadoras do movimento LGBT no Brasil Yone Lindgren e Marisa Fernandes. Marisa, juntamente com Alice Oliveira, outra ativista lésbica histórica, foram lembradas no discurso de abertura da conferência do presidente da ABGLT, Toni Reis. A militante paulista está em Brasília há duas semanas, cuidando de perto de todos os detalhes da realização do evento junto com Irina Bacci, que também presidiu a plenária final.
Na regional de São Paulo, Janaína Leslão e Lurdinha Rodrigues, da LBL, organizaram a oposição, garantindo o bom exercício da democracia.
O Dykerama apóia a visibilidade lés
Fazer um site para mulheres que amam mulheres é a maior contribuição que a equipe do Dykerama.com pode oferecer para o movimento. Ainda que em alguns momentos tenhamos usado a sigla GLBT, a partir de agora, sempre, vamos grafar LGBT. Afinal, nosso mundo é lésbico!
* O jornalista Ferdinando Martins participou como convidado da I Conferência Nacional GLBT.