O nome de Jack Kerouac volta à mídia agora por conta da adaptação que o cineasta Walter Sales está fazendo do livro "On The Road", considerada a bíblia da geração "beat", termo utilizado pelo escritor no livro para designar certas atitudes dos personagens de sua obra, um "Road-mance" que vai chegar as telas de cinema a partir das mãos de um diretor que bem entende de histórias que se passam nas estradas. Quem assistiu "Terra Estrangeira" e "Diários de Motocicleta", sabe do que falo.
Mas, por conta do filme um outro assunto volta a tona: a questão da sexualidade do escritor. Jack Kerouac era gay? Bissexual? Ou hétero? Desconfio que nenhuma das perguntas tem resposta. Se você tomar como ponto de partida a vida do escritor, pele menos a primeira metade, vai entender que ele era um ser um tanto além das convenções, seja qual for… Ou melhor, foi, pois em fim de vida renegou quase tudo o que escreveu e morreu reacionário.
Se nos focarmos na obra "On The Road" e nos principais personagens vamos ter alguns caminhos e respostas. Sal Paradise, Dean Moriarty e Marylou. Os dois ultimos formam um casal que permanece unido até a metade da obra. Dean e Sal formam o casal que nunca vai se separar. Mesmo quando estiverem a distancia o pensamento vai continuar ligando estes dois sujeitos ambíguos e altamente amáveis. Dois seres que vivem o amor a flor da pele. Mas falamos do "amar de amor", como diria Paulo Freire, e não esta coisa que se chama de "amor", tão plástico…
Sal Paradise vive em função de Dean, aliás é importante notar que a obra de Kerouac é extremamente misógina, as mulheres presentes na obra não tem relevância alguma, funcionam como uma espécie de apêndice dos personagens masculinos. Até mesmo Marylou que será interpretada por Kristen Stwart, a moça da série "Crepúsculo", mas que também fez "The Runnways".
E se a personagem de Marylou vai ter algum papel na obra é o de atrapalhar a particularidade e intimidade entre Dean e Sal, aliás, não apenas Marylou, todas as mulheres conquistadas por Dean serão um empecilho para Sal. Daí tanta gente levantar suspeita da sexualidade de Kerouac, pois é sabido que Sal é o seu alter-ego. Há pessoas que arriscam a dizer que Dean seria uma especia de alter-ego para o escritor e amigo de Kerouac, Allen Ginsberg, este sim, homossexual assumido e que em algumas entrevistas declarou ter dormido com Jack duas vezes,mas que tudo foi na maior tranqüilidade…
Ao fim da primeira parte do livro, quando Sal volta para a sua casa, a sua dor não é o estar em casa, mas sim estar longe de Dean. O personagem deixa muito claro que o "seu mundo caiu". Passam alguns meses e ele volta para estrada, a segunda viagem que faz ganha sentido quando reencontra o seu amigo, que discriminado por todos é defendido por Sal, que assume muitas vezes que o amigo não presta, mas que não consegue viver com ele.
Triangulo amoroso? Dean, Sal e Marylou chegam a dormir juntos, mas não há sexo entre eles. Em outros momentos não fica claro. O autor corta para os três acordando, deixando no vácuo se eles transaram. Dean é um entusiasta para que Sal transe com Marylou, mas ele não consegue, pois ama Dean. Num terceiro momento, quando Dean abandona os dois, Sal chega a imaginar uma vida com Marylou, mas as coisas não caminham por aí. Marylou sai de cena e Dean e Sal voltam a se encontrar e novamente atravessar os Estados Unidos. O que se pode dizer é que os dois sujeitos se amam, mas não é um amor heterossexual ou homossexual. É amor e ponto. Sentimento que não tem orientação sexual, eis aí a pobreza das categorias sexuais: enquadramento.
Os dois nunca se separaram, fisicamente sim, na mente, não. Ao fim da obra Sal já é um escritor bem sucedido, está a refletir sobre a beleza das estrelas, mas o que realmente lhe passa pela cabeça é Dean: "… Além dos desamparados andrajos da velhice, eu penso em Dean Moriarty; penos até no velho Dean Moriarty, o pai que já encontramos; eu penso em Dean Moriarty".