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João Fábio Cabral

Estréia no próximo dia 5 de abril, no Teatro Crowne Plaza, em São Paulo, a peça “Flores Brancas”, de João Fábio Cabral, 34. A montagem, que tem direção conjunta de Fabiana Carlucci e Rogério Harmitt, narra a história entre mulheres que se conhecem casualmente numa estréia de teatro, quando Vitória (Luciana Caruso), sem querer, esbarra em Luisa (Zeza Mota) derrubando seu celular. Esse encontro inesperado desencadeia muito desejo e sedução, levando-as à descoberta de uma grande paixão.

João Fábio Cabral é autor de outras peças com temática homoerótica, como “Refrão para desconhecidos e íntimos”, que explora a relação entre dois amigos, um gay e um hétero, alterada quando o primeiro envolve-se com um bissexual. De olhar aguçado e sensível, esse potiguar da pequena cidade de Ipanguaçu já revela-se uma das principais mentes criativas da dramaturgia nacional.

Em entrevista do Dykerama.com, João explica de onde veio a inspiração para escrever “Flores Brancas”, critica a falta de apoio ao teatro no país e conta sobre seus próximos planos. Confira!

Dykerama – Por que retratar o mundo lésbico quando o palco ainda é dominado por peças com temática gay?
João Fábio Cabral: Quando começo escrever um texto, não penso muito nisso, ou seja, se nos palcos paulistanos ou brasileiros existe uma certa propensão a algum gênero ou temática como espetáculo de teatro. Não vejo meu ofício como comércio, ao contrário, escrevo por uma necessidade de falar sobre um assunto que me instiga como artista no momento. “Flores Brancas” surgiu assim, queria falar de amor, daí percebi que esse amor poderia ser entre duas mulheres, aí veio aquele cuidado, veio o olhar mais atento para o universo feminino, isso foi importante. Independente do gênero. As últimas peças que assisti não tinham temática gay, nem acredito nisso de temática, seja para qual gênero for, vejo o universo onde tudo acontece, meu desejo é que todas as pessoas assistam, que eu assista uma peça e enxergue nela possibilidades de pensamentos, que me provoque, acredito no teatro, de como ele pode retratar o ser humano, nossa sociedade. Esse é um tipo de liberdade que acredito como pessoa e artista.

Dykerama – Qual foi sua inspiração para escrever “Flores Brancas”?
João Fábio Cabral: O amor, o encanto, “sabe esse frio na barriga, esse calor que sobe pelas costas e fica cochichando nas orelhas da gente”? Eu sempre quis falar desse momento quando encontramos alguém especial, de como isso bate, de como esse encanto se transforma em paixão rapidamente, aí vem todos os receios de ser correspondido ou não, é fantástico quando a gente está assim, eu ach (risos). Isso veio com “Flores Brancas”, espero que venha com outros textos.

Dykerama – O que pretende com a peça no que diz respeito à quebra de preconceitos?
João Fábio Cabral: Mostrar que o sentimento de uma pessoa por outra está acima dessas bobagens preconceituosas, que uma relação não é mais importante se ela for entre um homem e uma mulher ou entre dois homens ou entre duas mulheres. Existe uma pessoa, um ser humano por trás disso tudo, alguém com sentimentos, com princípios, com desejos, com encanto. Amor é amor, seja aqui ou na selva Amazônica.

Dykerama – Como foi o processo de montagem do espetáculo? Como foi o envolvimento das atrizes com seu texto?
João Fábio Cabral: Desde da primeira leitura do texto sabíamos que seria incrível. O processo foi fantástico. Tanto Luciana Caruso como Zeza Mota entraram pra ganhar, sem receios, medos ou algo que as amedrontassem. São duas atrizes lindas e talentosas, não houve pé atrás, ao contrário, a liberdade foi algo determinante na criação delas. Fabiana Carlucci e Rogério Harmitt conduziram o texto de maneira extraordinária e com muita sensibilidade. O resultado foi um conjunto de coisas boas aliado a nossa liberdade de artista, de criador.

Dykerama – Peças com temática lésbica são raras nos palcos brasileiros. A que se deve essa suposta “resistência” do meio teatral e principalmente dos produtores?
João Fábio Cabral: Existe uma resistência em apoiar o teatro brasileiro, seja ele qual for. Se existir apoio concreto, com comprometimento, aí sim, a “temática” será realizada em todas as categorias. Temos excelentes autores no país inteiro, muita gente escrevendo coisas relevantes, muito artista envolvido na realização do nosso ofício. O que falta mesmo é uma política mais séria e comprometida com o teatro no Brasil. Nunca tive esse problema por ser uma peça que também envolve homossexualidade, tenho problema com qualquer gênero, aliás, sempre produzi minhas peças, essa é a primeira vez que temos uma produção de fora. E foi muito tranqüilo, quer dizer, encontrei um produtor a fim de realizar o projeto. Quando fizemos a leitura para o Carlos Mamberti (produtor) ele aceitou de cara, ficou encantado com a atmosfera da peça.

Dykerama – Quais questionamentos pretende trazer à tona com sua peça?
João Fábio Cabral: Que as pessoas esqueçam de uma vez por todas que a orientação sexual de uma pessoa não determina nada de bom ou ruim, olhem com naturalidade a vida e seus desejos, busquem compreender que o mundo tem coisas mais importantes pra serem discutidas ou questionadas, como por exemplo: os cartões corporativos, a dengue no Rio de Janeiro, a criança que é jogada do sexto andar, os desleixos na educação desse país e na saúde pública, a obrigação de ser bem sucedido, a gigantesca diferença social que existe, a falta de apoio ao teatro brasileiro etc.

Dykerama – Sendo autor de outras peças com temática gay, você acredita num teatro essencialmente gay/homoerótico? Como é (ou deveria ser) esse teatro, principalmente quando ele é dirigido ao público como um todo?
João Fábio Cabral: Não enxergo que o teatro tenha que ser assim ou assado, cada artista tem sua própria visão de como ele se insere dentro do ofício e da própria criação. Enxergo que tem que ter comprometimento, que seja bacana, que provoque. Que faça rir, chorar, pensar, que seja bom, e esse bom não é questão de gosto, é de essência. Nunca escrevi peça com temática gay, ou exclusivamente gay, ou exclusivamente hétero, não me apego a isso, escrevo sobre o que acho relevante, se dentro do texto existem personagens gays ou héteros, ótimo, o importante é o assunto abordado, as questões levantadas, de como chega ao público, o resultado não ali na sala do teatro apenas, mas na cabeça dos espectadores. O fuá causado pelas personagens e suas relações, não tenho essa preocupação. Não estou escrevendo na defesa de um gênero, e sim das minhas idéias, de como enxergo o mundo e suas possibilidades.

Dykerama – Você está escrevendo outros textos no momento? O que está preparando para o futuro?
João Fábio Cabral: Sim. Estou escrevendo três peças novas, um roteiro para cinema, espero que consiga terminar até o final do ano. Dia 14 de abril, embarco para Natal (RN) para realizar um trabalho com o Grupo de Teatro PEREGRINOS, onde irei escrever e dirigir um espetáculo. Dia 15 de abril estréia outro texto meu, “Bem De Longe Um Bolero”, que tem a direção de Regis Trovão Rodrigues e no elenco estão Gustavo Haddad, Ana Carolina Lima e Sergio Guizé. No final desse semestre estréia “Um Lugar Que Nunca Tive”, uma produção de Edson Santana e Irene Stefânia, que também fazem parte do elenco, e direção de Juca Rodrigues. Insônia, produtora de “Anúncio Para Homens” – peça que também fala da mulher – está buscando recursos para realização da mesma. “Rosa de Vidro” continua em cartaz nos Satyros 1, tenho planos de escrever a trilogia iniciada com “Flores Brancas”, quero falar mais sobre o ser feminino, fiquei muito feliz com o resultado da peça. Quem sabe 2009 não chega com outras “Flores” (risos).

No segundo semestre iremos voltar com o espetáculo “Distante”, onde também faço parte do elenco, e realizar, junto com meu amigo e diretor Marcos Loureiro, o projeto “Estilhaços Humanos”, onde estarão envolvidos os Grupos Kuringa e Em Nome das Coisas Boas. E finalmente encontrar uma editora ou alguma alma generosa que possa lançar 3 livros meus com 8 peças cada um (risos).

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