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Jovens gays sem medo da AIDS: nova geração está no foco da epidemia do HIV no Brasil

"A Aids é uma doença que afeta milhões de pessoas em todo o mundo. Hoje vamos falar sobre a vida de uma pessoa que tem HIV, uma doença que não tem preconceitos e pode afetar qualquer um. Inclusive eu". É com esse texto de impacto que Fabricio Stocker, de 22 anos, inicia o documentário "O Lado Positivo de Fabrício", onde ele conta a sua história.

Quando se descobriu infectado, o jovem tinha apenas 20 anos e este documentário vai de encontro com os dados mais recentes sobre a epidemia no Brasil, que inclusive ganhou destaque no último boletim epidemiológico divulgado pelo Ministério da Saúde em novembro passado. "É importante ressaltar que se observa uma tendência de aumento na prevalência da infecção pelo HIV nos jovens", diz o relatório.

Para Beto de Jesus, coordenador do Quero Fazer, projeto que incentiva o diagnóstico precoce com ações em São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e Recife, "existe toda uma discussão sobre a vulnerabilidade dos jovens e temos percebido que é uma população com práticas de risco, estão usando menos o preservativo e se expondo muito".

"Percebi que as gerações atuais perderam o medo do HIV, nas comunidades que participo tem muitos caras de 18, 19 anos que já estão infectados desde os 15, 16 anos. Onde faço acompanhamento vejo muita gente aparentando menos de 20 anos em consultas" relata Victor, de 29 anos, que é portador do HIV há dois anos.

A baixa adesão do preservativo pelos jovens tem várias origens, uma delas é a ilusão de que se é forte o bastante e que "nada vai acontecer comigo", ou então, "de estar apaixonado", relata Beto, que já trabalha com prevenção há mais de uma década. Outra face desta ilusão é que "os jovens estão conhecendo a Aids a partir de uma docência de que já tem medicação, os mecanismos de terapia e esse é o conhecimento da doença".

Estes jovens não vivenciaram a perda de amigos e pessoas próximas em decorrência da Aids. Eles não viram ícones como Cazuza e Renato Russo sofrendo por conta da doença. "Eles não vivenciaram o primeiro momento quando as pessoas se infectavam e morriam rapidamente", completa Beto.

No documentário, Fabrício também comenta sobre isso. "Já aprendemos na escola desde a quarta série, o problema mesmo foi achar que isso está muito longe de você, de você se sentir onipotente, meio sou herói e isso nunca vai acontecer comigo".

"Eu acredito que devido a eficiência dos medicamentos e a diminuição dos efeitos colaterais as pessoas perderam este medo, antigamente você tomava o remédio e tinha que ter hábitos mais saudáveis como não beber ou usar drogas, tenho um amigo que toma o coquetel com vodka e vai pra balada", conta Victor, que sempre lidou bem com o HIV, mas que se descuidou "por outros motivos". "Até tinha consciência do risco que estava correndo, mas no meu caso era falta de amor próprio, a baixa-estima me fez ter este tipo de comportamento de risco".

Muitas pessoas acreditam que o fato do Brasil ser referência no tratamento e a medicação garantir uma boa qualidade de vida para os portadores amenizam a doença, mas como bem disse Renato Russo em seus momentos de dor "tomar a medicação é como engolir um cachorro vivo".

A adesão ao tratamento ainda é um fator complicador nesse processo. "Não é fácil você fazer a adesão ao tratamento, ainda existem efeitos colaterais, tem a lipodistrofia, por exemplo," ressalta Beto de Jesus que alerta ainda sobre a necessidade de falar mais abertamente com os jovens sobre isso e também do diagnóstico precoce. "O grande problema é quando a pessoa descobre que está com o vírus quando já está doente. Está tendo um aumento de pessoas com práticas de bareback, a medicação tirou da cabeça das pessoas a eminência do perigo".

Outro problema grave que é enfrentado é a questão da reinfecção, onde a pessoa que já tem o HIV continua a transar sem proteção e pode adquirir um novo tipo de vírus e tornar o tratamento ainda mais complicado. Pessoas que estão com carga viral zero não infectam, quando mais rápido você chega nisso evita de infectar novas pessoas.

Mas há casos em que as pessoas assumem o risco, não se preocupam consigo mesmo. Victor relata que muitas vezes as pessoas não pedem a camisinha na hora da transa. "Acontece muito e já aconteceu comigo do cara nem te questionar se você tem ou não e não querer usar. Então não me senti culpado, o risco foi para os dois, além do que ele poderia ter outra DST, o que é muito comum" relata.

No entanto, quando você tem um comportamento de risco não adianta ir no dia seguinte e fazer um exame, vá daqui um mês e terá um diagnóstico precoce. Se estiver infectado, terá grande chances de ter uma vida melhor.

Quando se descobre com o vírus, a família e os amigos também tem um papel importante para a qualidade de vida do portador. O administrador Claudemir, de 44 anos, perdeu seu namorado em decorrência não só das doenças causadas pelo HIV, mas também pelo preconceito da família do jovem, que faleceu aos 26 anos. Quando sobe da infecção do namorado, foi imediatamente fazer seu exame e deu negativo, contudo o jovem não sabia como tinha contraído o vírus.

"A família dele não me deixou mais vê-lo depois que souberam do que aconteceu, eu tinha notícias dele através de uma amiga. Ele me ligava quase todos os dias e depois de dois meses no hospital ele não aguentava mais, a mãe dele todos os dias fazia ele lembrar das razões que fizeram ele ir para aquele hospital, a mãe dele não aceitava que ele era gay, imagine portador do HIV", conta Claudemir.

"Depois de muito conversar, ele disse que não suportava mais aquela situação, que nem receber as pessoas ele podia devido a mãe proibir e com isso tinha tomado a decisão de interromper o tratamento. Ele faleceu não só da doença, mas do preconceito da mãe que não ajudou ele, psicologicamente, naquele momento tão importante", conclui.

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