Nada com que se assustar. Majdanek não é tão pesado quanto parece. A linguagem cinematográfica escrita pelo autor faz com que a leitura flua e os acontecimentos sombrios fiquem encobertos por momentos de ternura e esperançosos.
Esses momentos "lights" acontecem por conta dos protagonistas, um polonês e um judeu que desenvolvem uma forte relação para sobreviver aos campos de concentração. A história de começa quando o advogado polonês Piotr recebe um convite de um oficial da SS para participar de um congresso em Berlim.
Durante a viagem, o rapaz faz amizade com o judeu Jan Adler. Ao chegar à capital alemã, Piotr descobre-se em uma espécie de armadilha, onde os intelectuais estrangeiros que não compactuam com os ideais nazistas são levados a campos de concentração. A partir daí os personagens procuram apoio mútuo para suportar os maus tratos a que foram submetidos.
Em entrevista ao site A Capa, o escritor Paulo de Tarso explicou o que serviu de motivação para a história. Leia a seguir.
Você começou a escrever aos 17 anos. Quantos anos tem agora e o que, basicamente, você escreve?
Eu tenho mais… de 30 anos (risos). Escrevo poesias, vários contos sobrenaturais, contos eróticos que já até publiquei em sites, crônicas, tenho uma peça de teatro. Romances começados ou já prontos… e muitos títulos para começar. Estórias infantis… e posso também escrever com temas indicados como já fiz em sites.
O que serviu de inspiração para a história de Majdanek?
As inúmeras visitas ao campo de concentração quando eu morei por alguns meses a duas quadras do campo de concentração de Lublin, na Polônia. O número do museu é 67 e eu morei no prédio 47. Além disso a travessia que eu fiz entre a Polônia e a Alemanha. E também importante: a hipocrisia e a cegueira em relação ao óbvio que a sociedade teima em repetir durante a sua história. Mas há outras inspirações não muito claras, como a psicografia por exemplo…
Sim, bem depois. Quando já estava aqui. (Escrevi) no ano passado, pouco mais de um ano desde que entrei no campo pela primeira vez. Viajei pela Europa durante mais de um ano, depois de ter morado em Madri. Resolvi que não ficaria somente em um lugar já que não sabia quando voltaria para lá. Então quando estava na Itália fazendo "mimo", recebi um convite de um amigo que conheci na Espanha, para visitar a sua família em Lublin. Nessa época acampava em plena Roma. Arrumei as minhas coisas e tomei um avião para Krákow e de lá um ônibus a Lublin, na Polônia… cheguei de madrugada e achei tudo estranho. Mas já fui bem recebido por amigos do meu amigo que estavam no centro da cidade me esperando. Não possuo ascendência polonesa. Mas gosto do povo eslavo. Já estive em moscou há alguns anos.
A orelha do livro diz que você cursou um ano de Letras na USP. Você abandonou o curso? Por quê?
Uuuu! Entrei em letras na usp em 1994 e depois entrei novamente em 2005. Além disso deixei um curso de medicina quase no final. Isso quer dizer mais de 5 anos de estudo. O que acontece é que eu sempre achei que faltava algo para mim, alguma coisa a mais que um curso universitário não me daria e que nunca me deu. Mais profundo. Eu encontro isso quando escrevo!
Mas como tudo o que eu fiz na vida, os cursos me acrescentaram inúmeras situações, personagens e conhecimentos para enriquecer várias das minhas estórias.. Existe um médico em Majdanek, não?
Seu livro tem uma linguagem cinematográfica. Você assistiu a muitos filmes sobre a Segunda Guerra Mundial durante o processo criativo?
Tem. Obrigado por notar. Eu amo cinema. E vejo desde criança filmes de drama e sobre a Segunda Guerra Mundial. E até a música que eu disse que os personagens tocavam, eu imaginei como uma cena de cinema. alías, Várias partes do livro são pensadas pra cinema. Quero filmar os meus livros. Sobre os filmes: sim. Assisti várias vezes e comprei alguns. Era preciso me emocionar, chorar um pouco com o que acontecia, tentar entender a causa do ódio, da loucura daquela gente, daquela época. Viver os futuros personagens. Sou admirador do Steven Spielberg: "A lista de Schindler" e "A Cor Púrpura" são filmes que amo e que tenho em casa. A dor da personagem principal de "A Cor…", que é a mesma dor de injustiça de tantos que sofreram na Segunda Guerra, me faz desabar em choro, sempre que revejo o filme.
Você descreveu os horrores da Segunda Guerra sem ter passado por aquela experiência. Seu livro conta a história de um amor gay. Acredita que tem que ser gay para fazer literatura gay?
Boa pergunta. Não. Pois o meu próximo livro será sobre vampiros e, eu acho, eu não sou vampiro! Mas algumas experiências de sofrimento são universais e podem ser aplicadas com inteligência e sensibilidade a várias tipos de personagens. Steven Spielberg roteirizou um filme sobre negros e ele tem ascendência judaica/judia.
Você fez o lançamento de Majdanek n’A Lôca, em São Paulo. Por que escolheu a boate?
Porque eu queria três lugares que tinham a ver com um ambiente alternativo na cidade e underground. Quem me recebeu melhor e me tratou melhor foi quem representa a casa. Ele esteve à minha disposição para qualquer modificação necessária no local. Quero fazer todos os meus lançamentos de uma maneira não tradicional ou convencional. Acho divertido. A minha roupa na noite de autógrafos era uma possível roupa do protagonista. Os temas foram misturados para não serem convencionais. Não se mistura, normalmente, gays e judeus! Você não acha?
E eu gosto muito d’A Lôca. O ambiente é totalmente não convencional: cheio de esculturas fantásticas; uma cadeira que quase fala; o ambiente é "dark". Já existia quase tudo o que eu queria para remeter a noite de autógrafos a um ambiente sombrio e misterioso e a um campo de concentração.