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Mães LBT emocionam ao falar sobre seus filhos e mostrar que suas famílias existem

Não se trata de um fenômeno ou de um núcleo familiar contemporâneo. Famílias formadas por pessoas de diferentes orientações sexuais e identidades de gênero fazem parte da sociedade muito antes que a mídia brasileira cogitou noticiar. 

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Mas ainda é preciso evidenciar tais laços, o amor e as histórias. Sobretudo quando bancadas conservadoras tomam o Congresso e tentam, por meio de projetos tortos, definir família apenas por casais formados por pai e mãe.
 
No Dia das Mães, o A CAPA traz uma reportagem especial para reafirmar que família é a ligação de pessoas que se amam. E lembrar que há inúmeras mães espalhadas pelo país que são lésbicas, bissexuais, heterossexuais, cisgêneros, travestis e mulheres transexuais. 

Conversamos com cinco delas. "A nossa família existe e não pode ficar marginalizada em função de convicções religiosas alheias", diz uma das mães. E os emocionantes relatos estão logo abaixo: 

 
 
“Quando escutam preconceito, dizem: ‘que bobo, o que importa é o amor’”
 
“Eu e a Luna estamos juntas há 6 anos e desde o começo do nosso relacionamento tínhamos o desejo de sermos mães. Iniciamos o processo de adoção logo após o casamento e uma tentativa de gravidez in vitro – que eu perdi o bebê aos três meses. Durante o curso para a adoção, saíamos com a convicção de que iríamos optar pela adoção tardia (crianças acima de 5 anos), indiferente para sexo, raça… A nós só importava sermos mães.
 
 
Nove meses passaram, do curso preparatório até irmos para o Cadastro Nacional de Adoção, até recebermos doze contatos de diversos Fóruns do país falando de crianças. Doze. Ficamos angustiadas – como se escolhe criança? Não escolhe!

Mas quando ligaram falando dos nossos filhos, senti um arrepio diferente que percorreu o meu corpo inteiro. Era a Yasmin, de 8 aninhos, e o Thiago, de 5 aninhos, irmãos biológicos. Em um dos encontros, perguntamos: “Vocês querem que a gente seja suas mamães?”. “Hum hum”, disse Yasmin, sorrindo e tímida. Perguntamos: “Mas a gente é um casal, são duas mamães, tudo bem?”. Ela perguntou: “Vocês beijam na boca?”. Rimos e dissemos que sim.

“Vocês beijam na bochecha também?”, disse Thiago. E foi isso, tudo muito natural. O preconceito está na cabeça do adulto, não na cabeça da criança. O processo de adoção ainda está em andamento, mas estamos confiantes que logo, logo, será finalizado. Hoje, quando eles escutam algum comentário preconceituoso, eles mesmos dizem: “Que bobo, o que importa é o amor da família”.

 
(Helena Paix, mãe de Yasmin e Thiago, esposa de Luna Meyer) //

“Depois que passei pela redesignação sexual, desejo de ser mãe foi mais forte”

“O meu desejo sempre foi o de ser mãe, mesmo que esse filho não fosse biológico. Depois que me casei em Milão e passei pela CRS (cirurgia de redesignação sexual), essa vontade tornou-se mais forte, tão forte a ponto de eu sentir um grande vazio. Tinha crises de choro e sofrimento. 

 
 
O meu marido não sentia essa mesma necessidade, mas visto que eu queria tanto ele acabou concordando em entrarmos para o processo de adoção. O tramite foi bastante difícil, pois tive que expor toda a minha vida desde a infância até os dias atuais, passei por avaliações físicas, psicológicos e entrevistas intermináveis.
 
Conseguimos o aval da assistente social e, depois, o ok do juiz para entrar na fila de adoção. Depois de dois anos – sim, a minha gestação foi de dois anos – chegou a minha filha Lisa. Ela estava apenas com dois dias de nascida e eu vivi todo o processo da maternidade pós-parto. Como vivo fora do país, surgiram ainda várias complicações e eu levei três anos para resolver tudo isso.

 
Só posso dizer que ser mãe é mágico e que a primeira vez que ela me chamou de 'mãe' foi de uma alegria incrível. Ela é uma joia rara e é como se tivesse nascida de mim. Lisa tem uma personalidade forte, mas é uma criança doce, determinada e muito educada. Sempre fala ‘por favor’, ‘muito obrigada’, aliás, ela agradece tudo (risos). Procuro ensinar os valores reais da vida, o respeito pelas pessoas, por tudo aquilo que é diferente e se preparar para o mundo como ele é”.

 
(Cibelle de Oliveira Montini, mãe da Lisa, de 4 anos e meio). //

 

“O que era normal para nossa filha, foi um problema para a escola”
 
“Desde pequena havia determinado que queria ser mãe aos 28 anos, depois que eu tivesse uma estrutura para tal. E ser mãe no sentido de gerar. Conheci o Márcio, pai da Vera, que também queria gerar, e programamos. Quanto Vera nasceu, foi uma maravilha, a realização de um desejo, de educar, de criar, de partilhar, compartilhar, de mostrar várias faces do meu arco-íris. 
 
Ela tinha uns quatro anos quando, na escola, desenhou duas mães de mãos dadas, o Márcio e a companheira dele. Fomos chamados na escola e foi muito complicado para a diretora entender que eu tinha uma companheira.
 
 O que era normal para a Vera, acabou se tornando um problema para a escola. E a gente estava ali para ajudá-los, se precisassem. Nesta época não tinham tantas ONGs, movimento, assistência. Tinha que resolver tudo sozinha, com a minha companheira. Nossa relação é maravilhosa. Para mim, o amor, o respeito e o limite sempre foram fundamentais nesta relação de mãe e filha.

Procuramos ensinar valores como o amor, a ética, a dignidade, o respeito e que ela saiba impor limites. Claro que já houve “arranca rabos”, porque não seria saudável se não acontecesse. Mas sempre tivemos um diálogo franco e aberto. Sem cobranças, pois o mundo já cobra demais da gente”

 
(Regina Steriner Papini, mãe da Vera, de 27 anos, e aguardando ser pedida em casamento por Maúde Salazar) //

 

“Congelamos o sêmen da Julia até eu recuperar a fertilidade”
 
Ser mãe não era um ponto passível de discussão: eu seria mãe um dia, com ou sem companhia. Apesar disso, uma coisa era certa: não queria um pai para meu filho ou filha. Foi com isso tudo em mente que, antes mesmo de me envolver amorosamente com a Julia, sugeri que tivéssemos um filho juntas.
 
 
Em função da transição da Julia e de problemas hormonais meus, estávamos ambas inférteis no início do relacionamento. Foram meses longos e difíceis para a recuperação da fertilidade. Quando enfim a Julia conseguiu retomar a dela, congelamos o sêmen para uma inseminação futura, posto que eu ainda estava infértil. E foi no último segundo que conseguimos engravidar.

A gravidez foi complicada, de risco, e os meses até o parto pareceram se arrastar. Quando nossa filha nasceu, depois de uma cesárea recheada de violência obstétrica, tudo que consegui pensar foi "finalmente! Bem-vinda ao mundo, minha filha". Nossa filha ainda é muito pequena, nossa relação se baseia em provermos todas as necessidades dela, coisa que vai diminuindo com o tempo. Mas é lindo fazer parte da vida dela, tê-la gerado e vê-la se desenvolver a cada dia mais.

Sendo clichê, adorei quando ela me chamou de mamãe pela primeira vez – no dia seguinte a chamar a Julia pelo mesmo vocativo -, quando deu os primeiros passinhos, quando sorri para mim. São os pequenos gestos e ações corriqueiras que fazem tudo valer a pena. Não alimentamos expectativas além de querer que ela seja boa, honesta, que respeite o outro e seja feliz.

 
(Lilian K., mulher cis, que é mãe biológica de Alice, ao lado da também mãe biológica Julia, que é transgênero) //

 

 
“Um dia eu expliquei que a mãe dela amava outra menina” 
 
“A gravidez veio no quarto ano de casamento com o pai de Melissa. Não foi planejada, mas se tornou a parte mais importante de mim. Foram nove intermináveis meses até que eu pude ver aquela menininha pequena e frágil, com seus grandes olhos curiosos. Daí em diante, tudo mudou dentro de mim. Eu queria ser uma pessoa melhor, de quem ela pudesse se orgulhar um dia.
 
O casamento não durou o primeiro aniversário de Melissa. Depois disso, foram quase dois anos de dedicação exclusiva à maternidade para só então começar a pensar em outro relacionamento. Foi aí que conheci a Val. Primeiro a cantora; depois, a pessoa maravilhosa que ela é. Um dia eu simplesmente expliquei a Melissa que a mãe dela amava outra menina.
 
As crianças não nascem com preconceitos e Melissa amou Val desde o começo, e vice-versa. No nosso primeiro ano de casadas, na Paraíba, fomos vizinhas do pai dela, que já estava casado novamente também. Desde então, somos uma família unida e feliz, hoje vivendo em São Paulo, só nós três: eu, ela e Val. Melissa é a nossa melhor parte. É a razão da nossa evolução como seres humanos melhores.

Ela é uma criança adorável, muito esperta e comunicativa. Fala com orgulho da nossa família na escola e se magoa quando algum colega confunde a madrasta com um garoto, por causa da sua aparência. Melissa ama música e se inspira no trabalho de Val. Diz que vai ser cantora também. Que seja. O que nos importa é que seja livre, feliz e respeite o próximo, com o estilo de vida que escolher”.

(Michelle Lira, mãe da Melissa, e esposa da Val) //

"Aos 10, ela me chamou para assistir a um filme sobre homossexualidade"

 
“Pensava e penso que a maternidade faz com que a gente encare a humanidade com mais atenção. Tentamos compreender mais o que acontece, até mesmo para evitar julgamentos errôneos. O caminho percorrido em relação à minha maternidade foi o mais usual: um homem, um relacionamento, uma gravidez. Foi uma gravidez de alto risco, com um parto prematuro (ela foi apartada aos 6 meses de gestação).
 
 
Quando estive com ela, me senti a mais importante das mulheres do mundo. Mas também tive a consciência que ser mãe é ter uma responsabilidade imensa que não cessa mesmo quando o filho chega na idade adulta. Sobre o preconceito (de ser mulher lésbica), nunca reparei se isso acontece. A relação com minha filha é muito aberta e ela soube da minha orientação sexual ainda menina, aos 9 anos. A minha primeira namorada conversou com ela. 
 
Um fato marcante que aconteceu foi quando, aos 10, ela veio me disser que iria passar um filme na TV sobre homossexualidade. E que ela queria assistir comigo, era o ‘Meu Querido companheiro’. O resultado é que a minha filha é muito bem informada, bem resolvida e tem muitos amigos gays e lésbicas. Isso se dá porque procurei ensinar dois valores: 'A sua liberdade termina onde começa a do seu semelhante' e 'Ame e respeite o seu próximo, como você quer ser amada e respeitada'". 
 
(Maria Auxiliadora Evarista (Dodora), de 62 anos, atualmente solteira e mãe da Yasmine Paula Evaristo). 

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