O professor Márcio Barrios foi afastado da escola em que ministrava aulas de inglês depois de ter apresentado aos alunos a música I Kissed a Girl, de Katy Perry.
Um processo de sindicância foi aberto e o professor considera homofóbica a decisão da escola e da Secretaria de Educação do Distrito Federal que entendem o comportamento exposto na música “inadequado”.
Em entrevista ao Dykerama.com, Barrios explica por que ele optou pela música, mesmo com orientações da diretoria para não usá-la, como a educação básica lida com a homossexualidade e quais serão os próximos passos para solucionar o caso.
Dykerama.com: Conte-nos o que realmente aconteceu em novembro quando a escola te afastou por conta do material usado em sala de aula.
Márcio Barrios: O meu afastamento ocorreu devido ao processo de sindicância pelo qual estava respondendo. Em novembro saiu a rescisão do meu contrato. Mas tudo começou quando eu decidi passar a música para os alunos, mesmo depois que a direção pediu para eu substitui-la, pois alegava que eu não poderia passar uma música que falava sobre homossexualidade.
Dykerama.com: A escola havia te orientado a não tocar a música em sala de aula. Por que você decidiu apresentar a música do mesmo jeito? Você esperava ser afastado das aulas?
Márcio Barrios: A aula foi ministrada no final de agosto. Anteriormente eu levei a atividade para a supervisora pedagógica tirar as cópias para os alunos. Ela disse que a música era polêmica, pois falava sobre homossexualidade. Portanto, teria de falar com a direção. A diretora disse que estava agindo como mãe e não gostaria que a filha dela fizesse uma atividade com aquele tema. Eu expliquei que o objetivo da música era fazer com que os alunos identificassem os verbos no passado, pois era o foco gramatical estudado na época. A música era atual, os alunos já conheciam e estava tocando em todas as rádios.
Dykerama.com: Qual foi, de fato, a decisão da escola?
Márcio Barrios: A música não poderia ser utilizada, pois falava de homossexualidade. Então, a diretora me pediu uma cópia da música alegando que iria enviá-la a um especialista na área para averiguar se a música poderia ser utilizada, mas isso nunca aconteceu, pois até hoje espero a análise do suposto especialista. A diretora fez um memorando, anexou a cópia da música e enviou à Regional de Ensino. Daí surgiu a sindicância.
Dykerama.com: Você declarou que sentia um preconceito velado por parte das pessoas que trabalhavam na escola. Você acha que isso influenciou a decisão da escola?
Márcio Barrios: Com certeza, principalmente pela direção, pois o problema com a música foi o ápice de uma perseguição que já estava ocorrendo desde o primeiro ano em que trabalhei no CilB. Eu tinha apresentado a música a uma professora que também iria trabalhar os verbos no passado. Ela até começou a elaborar uma atividade, mas depois de traduzir a música, disse que não concordava, até pela orientação religiosa dela, e desistiu da atividade.
Dykerama.com: O que os alunos acharam da atividade que você preparou? Surgiram discussões sobre consumo de álcool e homossexualidade?
Márcio Barrios: Os alunos participaram intensamente, cantaram, se divertiram. Eles queriam saber o que estavam cantando, o que a cantora dizia. Na música ela diz que estava com um drink na mão, mas nem todas as bebidas são necessariamente à base de álcool. E em nenhum momento na música é dito cerveja, vinho, vodka, enfim. É ridículo dizer que a homossexualidade está relacionada à bebida. Eu apenas disse aos alunos que era normal uma menina beijar a outra e que deveríamos respeitar o que é diferente.
Dykerama.com: O Secretário da Educação do DF afirmou que a música refletia um comportamento inadequado. A Educação Básica lida com a homossexualidade de maneira preconceituosa? A homossexualidade é abordada nas salas de aula?
Márcio Barrios: A diversidade sexual e cultural está prevista nos Parâmetros Curriculares Nacionais e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Portanto, como ele pode alegar que a homossexualidade é um comportamento inadequado? Ele foi extremamente homofóbico. Engraçado! As músicas que falavam de sexo explícito, violência e os funks pornográficos faziam parte do cotidiano da escola, mas ninguém nunca disse que era apologia ou que era proibido. Creio que nem é abordado em sala de aula, pois quando alguém apenas menciona o tema é julgado por fazer apologia. Em nenhum momento levantei bandeira ou impus isso aos alunos.
Dykerama.com: O que você pretende fazer agora?
Márcio Barrios: Bom, o sindicato dos professores já estava ciente do meu caso e já tinha feito uma reunião na escola para esclarecer os fatos. Welton Trindade, do grupo Estruturação, foi quem me deu suporte. Inclusive ele foi o primeiro a colocar a notícia no jornal e em seguida no site paroutudo.com. Depois disso, a mídia me procurou e vieram as entrevistas. O sindicato me procurou e disponibilizou os advogados para cuidarem do meu caso e entrar com o processo judicial.