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Márcio Retamero: “Amai-vos uns aos outros: basta de homofobia!”

Está aberto o debate polêmico em torno do tema escolhido pela APOGLBT para a maior Parada do Orgulho do mundo, a de São Paulo!

De um lado, temos os que consideram a escolha do tema um equívoco; de outro, os que ponderam no atual contexto sócio-político brasileiro e conseguem enxergar no tema escolhido uma oportunidade, talvez pela primeira vez, de enfrentar o fundamentalismo religioso, que tanto mal tem feito às pessoas LGBT e às instituições políticas do nosso país.

Eu estou entre os que enxergam na escolha do tema a oportunidade de tratarmos publicamente, de maneira séria e responsável – e coletivo-democrática – sobre o espinhoso e maléfico fundamentalismo religioso de vertente "cristã". Na verdade, creio que passamos da hora de enfrentar este tema e debatê-lo publicamente!

Lamento os que enxergam na escolha do versículo bíblico cristão um equívoco e até entendo o temor de misturar temas como homofobia e religião ou reivindicação de direitos e religião, mas não creio que a intenção da APOGLBT seja misturar os temas, mas denunciar, usando a Lei do Amor transmitida por Jesus, a prostituição nefanda e nojenta que assola o Brasil nos nossos dias e que tem minado o avanço das agendas de Direitos Humanos em nossa pátria: o casamento nefasto de política e religião, ou melhor, o uso da religião para instalar entre nós um Estado Teocrático de fato, mas não oficial.

É urgente este debate em torno do uso da religião pela política e do assalto pela vertente fundamentalista religiosa das instituições democráticas no Brasil e creio que é exatamente isso que a APOGLBT deseja com a escolha do tema em questão. Se alguém duvida do debate urgente e necessário desse tema, precisa de colírio dos bons ou de coragem para publicamente assumir que alguns desejam a manutenção do atual estado das coisas entre nós, motivados, talvez, pelo tal senso de autopreservação.

Quem viu e ouviu as coisas feitas e ditas durante a campanha presidencial do ano passado e para o Congresso Nacional, não pode dizer que este debate não seja urgente e necessário. Vimos e ouvimos os caciques religiosos impondo suas condições para apoiarem os candidatos à presidência e a aceitação, por parte desses, dessas imposições, se isso foi jogo político para alcançar a cadeira no Planalto, para depois esquecer os compromissos firmados com tais lobos em pele de cordeiro, a conta da dívida virá célere.

Vimos e ouvimos candidatos ao Congresso e ao executivo estadual – com raríssimas exceções – usando e abusando até mesmo dos jargões religiosos para obterem votos nas urnas, tudo isso com a promessa da defesa da "família" e dos "valores cristãos" e a bancada evangélica fundamentalista só cresceu!

Não faz muitos dias e os telejornais mostraram ao Brasil o atual presidente da Câmara dos Deputados, o Sr. Marco Maia (PT/RS), participando de um culto evangélico dentro das dependências do Congresso Nacional. Não faz muitos dias que ficamos sabendo da opinião do senador Lindbergh Farias (PT/RJ) sobre o PLC 122, que embora tenha assinado o desarquivamento do Projeto de Lei proposto pela senadora Marta Suplicy (PT/SP), declarou: "O ponto que preocupa (as lideranças evangélicas) é o que toca a liberdade de culto". Para o senador Lindbergh, será preciso chegar a um consenso com a bancada evangélica (olha ela aí!) para que o PLC 122 possa prosperar, ou seja, já adianta que mais concessões devem ser feitas aos fundamentalistas!

Os dois exemplos acima não bastam para que entendamos de uma vez por todas a urgência do debate em torno do tema que a APOGLBT escolheu para a Parada do Orgulho de 2011? O que é preciso acontecer doravante para nos conscientizarmos disso? Alguém sabe me dizer quais são as razões reais para que o PLC 122 não ter sido aprovado depois de quatro anos em trâmite? Alguém sabe me dizer por que a senadora Fátima Cleide, esta corajosa mulher, cheia de tenacidade, que lutou tanto pelo PLC 122, não ter sido reeleita? Alguém sabe me dizer as reais razões que explicam o fato do casamento civil LGBT ter sido aprovado na Argentina e em Portugal, dois países inegavelmente "cristãos", cuja influência da Igreja ainda se faz sentir?

Não podemos negar: o assalto pelo fundamentalismo religioso das instituições políticas no Brasil tem sido a causa de não avançarmos no campo do Legislativo; este é o nosso maior inimigo político! Não será com as estratégias equivocadas usadas até agora que conseguiremos avançar, uma vez que já está mais que provado pelos fatos (e contra esses não há argumentos!) que, no campo do Legislativo, temos sido derrotados até aqui!

A Revolução Política de 1789 ocorrida na França usou como slogan a liberdade, a igualdade e a fraternidade; não são versículos bíblicos, mas são, na essência, valores pregados por Jesus (basta ler o Sermão da Montanha, S. Mateus cap. 5) e não observados pelos fundamentalistas. Esta é apenas uma, das muitas lições que a História nos dá, no uso de valores que passam pelo cristianismo, embora sejam universais, como o "amai-vos uns aos outros", para a luta política.

Por tudo isso, parabenizo à APOGLBT na escolha do seu tema para a parada do orgulho de 2001! Oxalá as demais paradas do orgulho LGBT do Brasil (mais de duzentas!) sigam a APOGLBT, para que o debate público em torno do espinhoso tema do uso da política pela religião ganhe as ruas, os meios de comunicação de massa, cada casa e cada família desta nação.

Por fim, cito o grande Karl Marx, lido aos pedaços e tão pouco compreendido pelos intelectuais de botequim que adoram passar por marxistas da esquerda militante: "O SOFRIMENTO RELIGIOSO É, AO MESMO TEMPO, EXPRESSÃO DE UM SENTIMENTO REAL E PROTESTO CONTRA UM SOFRIMENTO REAL. SUSPIRO DA CRIATURA OPRIMIDA, CORAÇÃO DE UM MUNDO SEM CORAÇÃO, ESPÍRITO DE UMA SITUAÇÃO SEM ESPÍRITO: A RELIGIÃO É O ÓPIO DO POVO". Atentem para a citação inteira e não somente para a sua última parte e, então, entenderás o que Marx quer realmente comunicar com sua sentença mais que verdadeira!

* Márcio Retamero, 36 anos, é teólogo e historiador, mestre em História Moderna pela UFF/Niterói. É pastor da Comunidade Betel/ICM RJ e da Igreja Presbiteriana da Praia de Botafogo. É autor de "O Banquete dos Excluídos" e "Pode a Bíblia Incluir?", ambos publicados pela Editora Metanoia. E-mail: marcio.retamero@gmail.com.

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