A história das travestis e suas mentiras envolvendo o jogador Ronaldo foi notícia no Jornal da Globo de ontem. Na sala assistindo TV comigo estava Vinicius, meu irmão.
A cada vez que na matéria citavam os nomes de registros, ao invés do nome social de Andréia e Carla, eu me irritava. Me irritava ainda mais quando precediam a palavra travesti com o artigo "o".
Elas são "As" travestis. Não é difícil entender isso, ou é?
Talvez sim… Vendo minha indignação, meu irmão quis saber o motivo de usar "o" ao invés de "a" já que ele era um homem. Opa. Peraí. Expliquei que a identidade de gênero das travestis é feminina e não masculina e, por isto, não era condizente chamá-las com artigos masculinos.
Para ele pouco importou meu argumento. Rebateu dizendo "e o que é aquilo que ele tem no meio das pernas. É um pinto, não é?" É, respondi. No entanto, não é o pênis que determina sua sexualidade/personalidade.
Aí ele veio com outra. "Se ele não é homem nem mulher, ele é o que?" Ela. É uma travesti. Nem homem, nem mulher. É uma travesti e ponto. Ela pode ser o que quiser. A sexualidade humana é vasta e diversa. Vai muito além do "papai e mamãe" e do homem que gosta de mulheres e vice-versa. Além disso, como já disse Shakespeare "há muito mais entre os céus e a terra do que sonha nossa vã filosofia".
Meu irmão continuou o debate afirmando que quando um bebê nasce ele é simplesmente menino ou menina. Homem ou mulher. E aí entendi que não estava apenas discutindo com o meu simpatizante irmão, que tanto me apoiou quando estava saindo do armário que para ele todos são iguais e devem ser respeitados, me dei conta que estava lutando contra algo mais forte e enraizado. A heteronormatividade.
Finalmente percebi que este fundamento é dicotômico e dual. É minúsculo pensar que pelo simples motivo de termos nascido com um pênis ou uma vagina, devemos nos comportar e viver conforme a nossa genitália e desempenhar papéis pré-estipulados e pré-estabelecidos. As vivências, sexualidades e experiências humanas não podem ser limitadas de acordo com o órgão sexual que carregamos, ou deixamos de carregar, no meio das pernas.
É esse tipo de pensamento restrito que não "entende" (não quer e tem preguiça de entender) que existem homens que gostam de homens e mulheres que também gostam de mulheres. E pior, que nem sempre o sexo biológico com o qual nascemos condiz com nossos desejos.
No final, meu irmão disse que eu estava tentando "impor" respeito e que as pessoas não entendem isso tão fácil. Era preciso explicar e debater mais o assunto. Perguntei então, quando e de que maneira ele ouvia falar de travesti na televisão, se no local onde ele trabalha alguém tinha discutido isso de maneira séria. A resposta foi de que lá, no seu serviço, só falam sobre sexualidade/homossexualidade para fazer piada.
Sim, caros e caras. O bê-á-bá dos GLBT, aquilo que para nós é arroz e feijão, é motivo de chacota. Não há novidade nisso, eu sei, mas particularmente não vejo muita graça nisso. Acho que cabe a nós mudarmos essa situação.
Continuemos então os trabalhos de forminguinhas.