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“No Brasil ainda tem muito artista dentro do armário”, diz Vange Leonel

Entre 1991 e 1992, a Globo exibiu, na faixa das 19h, uma de suas novelas de maior audiência, "Vamp", de Antonio Calmon, que voltou ao ar no ano passado no canal pago Viva. Quem não se lembra dos versos de "Noite Preta" na inesquecível abertura com Claudia Ohana?

A música, que ecoou por rádios de todo o país, catapultou o nome de Vange Leonel, que anos mais tarde assumiria publicamente sua homossexualidade. Na mesma época, Vange viria a fortalecer seu vínculo com a militância LGBT, que começou ainda em 1981, quando ela fez parte do grupo LF (Lésbico Feminista), uma dissidência do SOMOS.

Mas o sucesso de "Noite Preta" e, consequentemente, de "Vamp", não atraiu Vange aos holofotes do mainstream, pelo contrário, ela diz que não se adaptou à intensa rotina de shows e entrevistas na TV, levando a se dedicar à carreira de escritora. Além de duas peças de teatro, Vange lançou três livros e ainda assinou, durante nove anos, a "Coluna GLS" da extinta Revista da Folha.

Nesta entrevista à revista A Capa, Vange comenta a repercussão de "Noite Preta", fala de seus novos projetos e é taxativa quando o assunto é a homossexualidade no meio artístico: "No Brasil ainda tem muito artista dentro do armário."

Como foi o sucesso na época de "Vamp"? Você se incomodou com o fato de ter ficado mais conhecida graças ao tema da novela?
Foi delicioso emplacar "Noite Preta" como tema de abertura de uma novela tão bacana como "Vamp". Não me incomodou nem um pouco ficar mais conhecida através da novela. O que me incomodou, e por isso eu abandonei a carreira, foi o esquema do showbiz como um todo. Amo cantar, mas não me adaptei ao dia-a-dia de cantora.

Como a música "Noite Preta" foi escolhida para a abertura da novela?
Eu e Cilmara Bedaque (minha parceira na música e no disco) soubemos que a Globo ia estrear uma novela sobre vampiros e achamos que "Noite Preta" seria ideal pra constar na trilha de "Vamp". Falamos para o pessoal da gravadora mandar a música para a TV Globo. A abertura já estava pronta (era outra) com música do Enigma, acho. Mas quando o Boni ouviu "Noite Preta", decidiu refazer a abertura com a nossa música.

Com o sucesso de "Noite Preta", você poderia ter se tornado uma artista mainstream, ou isso nunca te interessou?
Fale um pouco sobre esse duelo: fama, comércio X arte, underground. Não tenho nada contra ser mainstream. O que aconteceu foi que eu não me adaptei à vida de shows, TVs, rádios e turnês. E quis também me dedicar mais completamente à escrita. Depois que me aposentei como cantora, tive 3 livros publicados ["Lésbicas", 1999; ""Grrrls – Garotas Iradas", 2001; e "Balada para as Meninas Perdidas", 2003] e 2 peças montadas ["As Sereias da Rive Gauche" e "Joana Evangelista"].

Você prefere trabalhar com música ou com textos, literatura, jornalismo?
Atualmente prefiro escrever, tanto textos jornalísticos quanto "baixa literatura" (risos). E estreei em fevereiro uma coluna mensal na revista Fórum.

Quais seus projetos no momento?
Publicar minha tradução do "Ladies Almanack", livro da minha escritora favorita, Djuna Barnes. O livro, publicado originalmente em 1928, é um pastiche modernista sobre uma turminha de amigas lésbicas.

O que acha das atuais cantoras novas da MPB, como Vanessa da Mata, Tiê, Céu, Roberta Sá, Ana Cañas? E sobre a atual MPB em geral?
Não gosto de falar assim, no geral… Cada uma é uma. Da MPB atual, gostei muito do trabalho do Bruno Morais.

Você acha que no Brasil ainda existe intolerância com artistas gays ou lésbicas?
Acho que no Brasil ainda tem muito artista dentro do armário.

Sua coluna na "Revista da Folha" representava um espaço afirmativo para a comunidade LGBT. O que pensa sobre a mídia gay hoje?
Acho que existe uma tendência da mídia gay especializada em diversificar os assuntos. Afinal, LGBT também se interessam por política, economia e outros assuntos não necessariamente ligados a essa temática. Você também é ativista dos direitos gays e participou da 1ª Parada Gay de SP, em 1996. O que mudou desde então? Acredita que a manifestação ainda serve de espaço para o protesto? Entrei para o grupo LF (Lésbico-Feminista), uma dissidência do SOMOS, em 1981. Sempre fui ativista e sempre colaborei com a APOLGBT. Hoje, os eventos paralelos à Parada (debates, mostras etc) me atraem mais que a própria manifestação em si.

*Matéria originalmente publicada na edição nº44 da revista A Capa – Abril de 2011.

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