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O começo do fim da invisibilidade

O Superior Tribunal de Justiça acaba de proferir decisão histórica, ao determinar o prosseguimento da ação em que um casal formado por um brasileiro e um canadense buscou o reconhecimento de constituírem uma união estável.

Vivendo juntos há 20 anos e casados no Canadá, buscam a obtenção do visto de permanência para fixarem residência no Brasil. Tanto o juiz de São Gonçalo como o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro haviam fulminado a ação, alegando “impossibilidade jurídica do pedido”, ou seja, que a ação não poderia ser proposta por falta de previsão legal.

A decisão não significa que o STJ reconhece a existência do vínculo entre ambos e nem declara que se trata de uma união estável. Mas toma uma posição sobre tema envolto em preconceito e alvo de tanta discriminação que leva o legislador a omitir-se. Daí o significado do julgamento, pois impõe a inclusão das uniões homoafetivas no âmbito de proteção do sistema jurídico como uma realidade merecedora de tutela.

Pela primeira vez é admitido, por um Tribunal Superior, que as pretensões envolvendo pares homossexuais merecem ser apreciadas pela justiça. Aliás, neste sentido já vem se manifestando, de forma cada vez mais freqüente, tanto justiça comum como as justiças especializadas de vários Estados. Inclusive as demandas propostas pelo Ministério Público perante a Justiça Federal têm eficácia erga omnes, o que levou o INSS a expedir Resolução Normativa para a concessão de direitos previdenciários aos parceiros do mesmo sexo.

O próprio Supremo Tribunal Federal, ao menos em duas oportunidades, já manifestou postura francamente favorável ao reconhecimento das uniões como entidade familiar. Os Ministros Celso de Melo e Marco Aurélio, em decisões monocráticas, mostraram indignação ante ao descaso social a tal segmento da população. Fora disso o Superior Tribunal Eleitoral, pelo voto do Ministro Gilmar Mendes, declarou a inelegibilidade da parceira de quem ocupa cargo político.

Mas às claras que o grande mérito da decisão foi impor o cumprimento da lei. Afinal a Lei 11.340/06, de combate à violência doméstica – a chamada Lei Maria da Penha – definiu entidade familiar como “qualquer relação íntima de afeto” e, repetidamente, refere que tais relações independem de orientação sexual.

Assim, ao determinar o prosseguimento da ação, o STJ cumpre sua função maior que é de assegurar a vigência da legislação infraconstitucional.

Além disso, claramente o Poder Judiciário manda um recado ao Poder Legislativo: falta de lei não significa ausência de direito.

É chegada a hora de acabar com a invisibilidade de quem só quer ter o direito de ser feliz.

* Maria Berenice Dias é advogada especializada em Direito Homoafetivo – www.mariaberenice.com.br.

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