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“O fantasma do silêncio sempre ronda quem não escreve best sellers”, diz Trevisan

"Rei do Cheiro", livro de João Silvério Trevisan, foi eleito o romance do ano pela Associação Paulista de Críticos e Artes (APCA). Ao site A Capa Trevisan disse que está "muito feliz" e que isso mostra que "as pessoas estão lendo Rei do Cheiro".

Em uma outra entrevista ao site A Capa, na ocasião do lançamento do livro, João Silvério reclamou e disse que poucas vezes foi resenhado pela grande imprensa. Sendo assim, questionamos se agora isso irá mudar. Para ele, um grande passo foi dado neste sentido.

"Rei do Cheiro" conta a história de um fabricante de perfumes da rua 25 de Março que se torna um dos principais empresário do ramo. Como pano de fundo, Trevisan faz um retrato do surgimento dos novos ricos e uma crítica feroz aos governantes atuais.

No momento o país assiste ao escândalo do governo do Distrito Federal, onde o governador José Roberto Arruda disse que pegou os R$ 50 mil reais para comprar panetones beneficentes. "Meu romance está cheio de personagens malandros, mas essa do panetone me superou", conta João Silvério Trevisan.

Confira a seguir a entrevista com o escritor.

O que você acha de ter o romance escolhido como melhor romance do ano pela APCA.?
Fiquei muito feliz. Significa que as pessoas estão lendo Rei do Cheiro. O fantasma do silêncio está sempre rondando os escritores que não escrevem best sellers, como eu.

Em entrevista ao A Capa, você revelou que poucas vezes foi resenhado pela grande imprensa. Com o prêmio, isso muda?
Não sei se a grande imprensa vai prestar mais atenção daqui por diante. Mas com certeza foi dado um passo nesse sentido.

Ganhar um prêmio como esse faz com que o livro venda mais?
Teoricamente, sim. Mas a competição no mercado é tão grande que nunca se tem certeza disso, pela quantidade de livros lançados.

Sente-se gratificado?
Claro, pela distinção e pela divulgação. Mas agora espero ganhar algum prêmio em dinheiro. As pessoas acham que não, mas a premiação financeira faz toda diferença na carreira profissional de um escritor.

Gostaria de saber sobre o seu filme, "Orgia ou o Homem que deu cria". Você declarou que ele seria relançado. Já está disponível?
Ainda não, infelizmente. Estão sendo resolvidos problemas burocráticos. Considerando que o filme foi produzido quase 40 anos atrás e sua carreira comercial foi interrompida pela censura, estão ocorrendo entraves para seu registro na Ancine, sem o qual não é possível o lançamento em DVD.

Ainda acha que ninguém está lendo o "Rei do Cheiro"?
A considerar o prêmio, com certeza deve ter gente lendo (risos). Mas um escritor sempre quer ser muito mais lido do que é. Eu escrevo para criar um diálogo com meu tempo e com meus contemporâneos. E sempre sonho com um diálogo mais amplo possível. Acho que não é sonhar demais.

Acredita que os livros digitais irão ocupar o lugar dos livros de papel?
Acredito e espero que ocorra o mais breve possível. Vai ficar tudo mais simples, inclusive pelo fato de cortarem menos árvores para produzir celulose.

No momento estamos vivendo sob as denúncias de corrupção do governo do Distrito Federal. "Rei do Cheiro" faz uma crítica densa à questão de segurança pública e dos governantes da atualidade. Acredita que o tema do livro tenha influenciado na premiação?
Recentemente, em Salvador ocorreram ações de quadrilhas muito semelhantes às do PCC em São Paulo, que utilizei em Rei do Cheiro. Agora, eclode a revelação de mais um ciclo de corrupção, com o chamado mensalão do DEM. A corrupção é um tema que perpassa todo o meu romance. Num momento em que o Brasil vive um clima de ufanismo, tais ocorrências evidenciam a atualidade do meu romance, que vai na contramão dessa percepção, a meu ver discutível. Não creio que esses fatos possam merecer prêmios. Mas se o prêmio da APCA ao meu romance foi dado graças à importância do diálogo que estabeleci com meu tempo, então eu me sinto perfeitamente contemplado.

E qual a tua opinião sobre o caso de corrupção do governador Roberto Arruda? Acredita que ele recebeu R$ 50 mil reais para comprar panetone?
Como dizia o velho ditado, mudam as moscas mas os doces continuam os mesmos. Meu romance está cheio de personagens malandros, mas essa do panetone me superou. Em se tratando de pilantragem, nossos políticos têm uma imaginação acima de qualquer suspeita. Acho que deviam deixar a política e tentar a vida como roteiristas em Hollywood.

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