Há muito tempo não escrevo nesse blog tamanha as reviravoltas e situações ocorridas na minha vida ultimamente. Depois que a gente se casa de verdade, assim, com responsabilidade de adulto, vêm as outras coisas todas, água, luz, telefone, aluguel, projeto da casa própria, IPVA, carreira profissional, vocês sabem como é. Resumindo, a gente fica chata.
Ou seja, a leveza de escrever um artigo sobre a vida das sapas, sobre o dia a dia e o tititi, esvai-se com a dureza das planilhas do trabalho e do orçamento doméstico. No entanto, enrolada com terminologias de gestão, administração e coisa e tal, senti falta de pensar e falar sobre esse universo lindo que é o nosso mundo lésbico.
E por onde começar? Pelo moço do recenseamento que esteve lá em casa. Nunca imaginei que fosse me sentir tão emocionada com a visita de um rapaz do IBGE, mas fato é que, quando ele tocou o interfone, tive palpitações fortes, falta de ar, tremeliques – minha mulher idem – parecia que estávamos recebendo o Papa lá em casa.
O moço entrou no meu apê e eu só pensava em dizer a ele o quanto eu era lésbica e era feliz, e responsável, e que eu tinha um cachorro, e tinha uma vida igualzinha a todos as outras pessoas que ele iria entrevistar, e o censo tinha que registrar tudo isso. O moço, educado, começou a fazer as perguntinhas, algumas chatas, até chegar aonde eu queria: dizer que éramos uma família gay.
A experiência durou apenas alguns minutos, mas, eu, a cada dia, leio os jornais à procura dos resultados desse levantamento, fico me procurando em cada manchete sobre o censo do IBGE, como se minha participação fosse a mais importante de todas. Até agora, não vi nenhuma matéria sobre as famílias gays, mas sei que as notícias aparecerão em breve.
De qualquer forma, a experiência com o moço do IBGE me trouxe de volta aquela coisa gostosa que a gente sente quando se descobre – e se resolve – gay. Trouxe de volta aquela emoção incontrolável da descoberta, do prazer novo, da decisão de ser quem você é e pronto. E acima de tudo, o moço do recenseamento me trouxe uma outra certeza: na medida em que o tempo passa, conquistamos mais espaço e respeito na sociedade.