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“O judiciário é altamente homofóbico”, diz a desembargadora Maria Berenice Dias

Se hoje o Rio Grande do Sul é um estado que desponta em decisões favoráveis aos LGBT, boa parte dessa vanguarda se deve a atuação constante em prol dos direitos humanos por parte da desembargadora Maria Berenice Dias.

Berenice foi a primeira mulher a se tornar desembargadora no estado gaúcho, quando empossada, no ano de 1996, ela teve a ousadia de falar sobre a difícil trajetória de uma mulher na magistratura em seu estado. Outro fato curioso de sua biografia é ter sido a única mulher a ser indicada no "Projeto 1000 Mulheres para o Prêmio Nobel da Paz 2005".

Em 2006, foi a embaixatriz do Brasil na I Conferência Internacional de Direitos Humanos LGBT do I World OutGames, realizado em Montreal, Canadá. Berenice também escreveu livros, tais como "A Lei Maria da Penha na Justiça", "Homoafetividade – O que diz a justiça" e "União Homossexual – O Preconceito e a Justiça".

Em uma conversa sincera, durante a I Conferência Nacional GLBT, ela afirma com todas as letras que "este crescimento dessas religiões fundamenlistas, eu vejo com muita preocupação e um certo medo. São muito perversas, muito excludentes".  Se o estado é laico de fato, ela responde, "não, não é. Temos muita influência da igreja católica e agora das evangélicas".

No evento, ela fez o anuncio que após se aposentar irá abrir um escritório de advocacia para defender a homoafetividade. A notícia foi recebida com fervor pelos presentes. Confira!

Não é uma contradição: um governo que reconhece as transexuais e, ao mesmo tempo, um legislativo e judiciário que ignoram?
Essa é a dificuldade. As vezes avançamos na área da saúde, como está acontecendo agora com essa possibilidade da cirurgia de redesignação, e por incrível que pareça, ainda há um número muito grande de decisões judiciárias que, mesmo após a cirurgia de readequação genital não alteram o nome na identidade. Acho isso um absurdo, uma agressão contra o direito a cidadania e ao próprio direito a identidade. O fato é que a pessoa não pertence àquele sexo. Inclusive há jurisprudência no Rio Grande do Sul, que admite a troca de nome e da identidade do sexo mesmo a quem não fez cirurgia de redesignação sexual. Ou seja, se registra o sexo social da pessoa, é que a pessoa ostenta e tem que se apresentar. E, não passar por situações aviltantes: embarcar em um avião, abrir uma conta no banco, todas essas circunstâncias em que as pessoas tem que ter uma identidade, um nome e uma cara.

O judiciário brasileiro é homofóbico?
Com certeza! São conservadores, altamente discriminatórios, e os juristas têm aquela postura de querer punir a pessoa que age de uma forma que o próprio juiz acha indevida, e a maneira de punir é não reconhecer os direitos. Claro que temos decisões aqui e ali reconhecendo os direitos.

Em seu discurso, a senhora falou sobre a possível criãção de um estatuto GLBT. Pela manhã a senadora Fátima Cleide declarou que isso no Senado é inimiaginável. O que a senhora pensa a respeito?
A guerra para aprovação é outra coisa. Mas, enquanto ele existe como um instrumento jurídico, com um corpo legal com princípios, regras e normas ele pode servir de subsídio. É o que acontece com o estatuto da família que está tramitando e não sabemos se vai ser aprovado. Principalmente por que insere as uniões homossexuais. Mas, ele já está sendo citado, tem várias decisões judiciárias que se baseiam nesse estatuto.

E quem deveria fazer esse estatuto?
Tem que pegar pessoas engajadas desse movimento que sejam voltadas a área do direito e começar a fazer um trabalho sério de estruturação do estatuto (LGBT). Como já temos antecedentes, não fica tão difícil, eu até me disponho a participar. Agora que estou me afastando da magistratura tenho um pouco mais de tempo.

Qual a sua visão sobre as bancadas evangélicas?
Somos um país laico e este crescimento dessas religiões fundamentalistas eu vejo com muita preocupação e um certo medo. São muito perversas, muito excludentes. Em primeiro lugar eu não entendo por que crescem tanto, tenho muito medo disso de nós chegarmos num engessamento ainda maior de direitos.

O estado brasileiro é laico de fato?
Não, não é. Nós temos uma influência muito grande da igreja católica e agora das evangélicas. Para você ter uma idéia, a referencia à orientação sexual na Lei Maria da Penha passou por que foi "contrabandeada", sem ninguém perceber, pois muitos parlamentares aprovam as leis sem ler.

Seria esse o caminho para o PLC 122?
É uma tentativa, mas esse projeto está explícito. Está expresso que se defende a livre expressão da orientação sexual.

Gostaríamos que você falasse sobre a sua aposentadoria e o seu novo escritório
Eu trabalho desde os 18 anos, tenho 45 anos de serviço público. Eu já poderia ter me aposentado, mas achei que tinha algo para fazer lá dentro. Agora eu acho que serei mais útil lá fora. O que eu tinha para fazer no judiciário… Sinto que estou com a minha missão cumprida. Agora acho que será mais proveitoso do lado de fora. Usar a minha experiência para ir buscar o desenvolvimento dos direitos humanos.

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