Sempre fui apaixonado por games, desde da época do Atari até os atuais jogos multiplayers [jogos online com diversos jogadores], e instalei há alguns meses um destes jogos no meu PC. Seu nome é MU ID-PLAY, um típico “Massive Multiplayer RPG”, ou seja, um jogo onde é possível jogar com várias pessoas ao mesmo tempo e só funciona conectado a Internet. Escolhi este jogo pois, além de poder fazer o download gratuito dele (o fabricante tem um sistema diferente de obter lucro), sua jogabilidade é fácil e os gráficos são bem construídos, dando-se total liberdade na escolha de personagens, compra e troca de armaduras, luvas, botas, magias e diversos outros acessórios (são mais de 2000 itens). É tão interessante que até a possibilidade de se “casar” com outro jogador é possível, desde que os personagens sejam do sexo oposto. Opsss!, sexo oposto? Temos um problema! Pelo menos para mim, afinal, mesmo sendo um jogo, não tem nada a ver comigo casar-se com alguém do sexo oposto (mesmo no mundo do “faz de conta”). Por este motivo sempre joguei solteiro (e meu namorado também, nós dois somos Magos – Dark Wizard), passando a recusar convites de personagens mulheres a respectiva união. Para nossa felicidade, isso não durou muito tempo. Como jogamos em um servidor brasileiro, onde o administrador fala nossa língua e tem acesso a todas as configurações do programa, em uma conversa informal com ele, falei que o game era ótimo mesmo não permitia “casar homem com homem” (Mago com Mago). Para meu espanto, ele disse que era possível sim, e que se nós desejássemos, marcaria o primeiro casamento gay no servidor. E ainda explicou: disse que ele tinha tirado esta opção para a garotada não fazer casamentos gays de forma banal ou com a intenção simples de “zoar”. Mas como nosso caso era especial, já que somos casados na vida real há mais de 3 anos, nada mais justo do que nos casarmos também dentro do jogo. Ainda não acreditando na possibilidade, o grande dia foi marcado e amigos mais próximos, convidados. Eu (meu jogador se chama Anak28SP) cheguei cedo em Devias e me dirigi ao templo, sentei no banco e aguardei os convidados. Meu amor (jogador ALEX_BR) estava em Lorencia entregando os últimos convites. Em seguida a cerimônia começou, o templo encheu de convidados, nós nos casamos, teve queima de fogos com direito a diversos jogadores nos felicitando pela união e coragem. Sem falar que diversos GMs (uma espécie de coordenadores internos) avisaram que, se algum outro jogador nos discriminar, por sermos gays, era para avisar que a conta deles seriam bloqueadas ou até mesmo apagadas. Resumindo a história toda, hoje nós somos casados também no jogo e estamos viciados nele. A primeira vista, pensei que o jogo reproduzia uma realidade social heterossexista. Aquela forma de pensamento limitada onde, na cabeça das pessoas, só existe uma forma de relacionamento sexual e afetivo: o relacionamento heterossexual. Talvez, se fosse outro servidor ou outro administrador, isso jamais teria sido possível. Assim, como se vivêssemos em outro país, talvez já pudéssemos ser casados na vida real. E, essa mentalidade, e o reconhecimento das uniões homoafetivas, poderia se estender a muitas outras pessoas que, mesmo não concordando com a homossexualidade, deveriam compreender que a diversidade existe e que o relacionamento homossexual é idêntico e tão importante quanto um relacionamento heterossexual. Afinal, somos cidadãos e, antes disso, seres humanos livres para amar e ser amado por quem quer que desejamos. Inclusive dentro de um jogo! Quem quiser se aventurar neste servidor, ver as fotos do nosso casamento, além de baixar o jogo, instalar e jogar, procura por MU ID-Play no Google. E boa sorte! Quem sabe não nos encontramos por lá? *Fabrício Viana é bacharel em Psicologia e autor do livro que fala sobre a homossexualidade chamado “O Armário – Vida e Pensamento do Desejo Proibido” – Site do livro: www.oarmario.com
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