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Onde está o L Word brasileiro?

O seriado L Word virou mania mundial entre as lésbicas. Da Dinamarca à Nova Zelândia, passando por todas as Américas, quem é minimamente conectada sabe desse fenômeno da televisão a cabo norte-americana, acompanha suas personagens prediletas, baba pelas moças lindas que fazem sexo a três por quatro em cada episódio.

Não só as lésbicas mas o público em geral também tem acompanhado essa salada melodramática temperada com bissexuais, transgêneros, predadoras, artistas, feministas, milionárias, golpistas etc, etc, agora até uma assassina! TLW, como já ficou conhecido, já foi comentado em meios tão disparatados quanto as revistas de fofocas, as de moda, a sisuda Times, o intelectualérrimo New York Times, para não falar nos sites e blogues mundo afora.

Em suma, um fenômeno cultural e tanto.

Li os comentários que a produtora Ilene Chaiken fez no livro “The L Word – Welcome to our planet” sobre a criação da série e só pude aplaudir sua iniciativa. Como você talvez já saiba, ela era uma profissional com vários trabalhos na televisão e em 2000 apresentou um resuminho do que gostaria de fazer aos chefões do canal Showtime.

Foi sumariamente recusada.

Em 2001, no entanto, após o sucesso das séries gays Will & Grace, Queer as folk, Queer eye for a straight guy, a percepção da homossexualidade pelos tomadores de decisão da mídia mudou completamente. Ilene refez o projeto e voltou a bater na porta dos mesmos executivos, que dessa vez aceitaram a ideia de um novelão lésbico sem qualquer crítica ou restrição. E sem arrependimento, pelo que temos visto.

Não vou comentar a série, que tem resenhas suficientes pela internet inteira. O que gostaria de observar são os ingredientes que a tornaram um sucesso – e que podem ser copiados!

1. O seriado foi produzido por uma lésbica assumida. Ilene colocou-se para os executivos do Showtime como alguém do segmento que pretendia abordar, e que portanto entendia mais do assunto do que eles. Esse posicionamento fez com que eles respeitassem suas escolhas quando ela insistia, por exemplo, que essa ou aquela atriz jamais convenceria como lésbica;

2. O seriado tomou como ponto de partida falar de lésbicas. O grande diferencial de L Word é ter mulheres homossexuais e bissexuais como protagonistas, não heteros com quem se misturem. A visibilidade conquistada pelo programa é resultado direto de seu pioneirismo e coragem;

3. Ilene Chalken é uma produtora executiva profissional. Apesar de TLW ser seu trabalho de maior destaque, ela já havia ganho um Globo de Ouro pelo filme Dirty Pictures. As pessoas que ela escolheu para trabalhar com ela – assistentes, diretores, produtores – também são todos profissionais. Rose Troche, sua parceira na produção executiva, ganhou pontos por ser lésbica assumida também, mas foi convidada por ter dirigido Go Fish e uma série grande de filmes e seriados. Ou seja, nada de amadorismo ou improvisos aqui, ninguém foi tentando aprender com o andar da carruagem;

4. Todas as atrizes também são profissionais. Como conta a produtora, houve um esforço grande para selecionar atrizes competentes e convincentes para os papéis (além de lindas). Antes de contratar Laurel Holloman (Tina), por exemplo, Ilene a filmou (e às outras candidatas) ao lado de Jennifer Beals (Bette), para testar a química entre as duas na tela. Ninguém foi escolhida por ser a namorada da diretora…:

5. O seriado tem histórias! Cá e lá há concessões para o politicamente correto, explicações semi-didáticas, a inserção meio forçada do ícone do feminismo Gloria Steinem, mas o que predomina são as narrativas. As coisas acontecem no seriado, há tensão, drama (e dramalhão), confrontos, ação. Nada de discursos sem fim, nada de chatice.

Há um monte de besteiras nesse seriado também, vícios da telinha, descontinuidades, uma superficialidade como só a televisão consegue emplacar, além de um merchandising descarado. Fora todo o americanismo inevitável de algo que se propõe a mostrar as lésbicas de Los Angeles. Ainda assim é inegável sua contribuição para a nossa visibilidade, e de nos prover com algo para assistir e discutir e reclamar.

Agora eu pergunto: por que não seguir a receita? Será que não tem uma profissional que entenda de televisão e seja lésbica assumida nesse nosso país? Será que, agora que as americanas já abriram o caminho com sucesso, não é possível convencer os nossos executivos televisivos a bancarem uma série lésbica?

Será que, com as mudanças culturais todas a que estamos assistindo, não é possível encontrar profissionais que escrevam, dirijam, filmem, produzam, atuem em histórias interessantes sobre lésbicas?

Não seria mais interessante, ó moça criativa e cheia de idéias que me lê, parar de postar opiniões sobre quem matou a chata da Jenny e começar a pensar em produzir um L Word brasileiro?

* Laura Bacellar é escritora e editora, atualmente responsável pela Malagueta (www.editoramalagueta.com.br), a primeira editora de livros para mulheres que amam mulheres.

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