Um cartaz, entre milhares, me chamou muita atenção na última Parada do Orgulho Gay em São Paulo. O cartaz dizia: "Gays Idosos também são (muito) gostosos!" Ricardo Rocha Aguieiras era o portador do cartaz. O portal G1, no dia seguinte a manifestação, noticiou. Ricardo declarou à jornalista Juliana Cardilli: "Eles sofrem duplo preconceito, por serem idosos e por serem gays. Uma das coisas mais cruéis é lutar a vida toda para se libertar e ter que voltar para o armário quando envelhece, por não ter como se manter e também pelo preconceito". Alguém duvida que Aguieiras tenha razão? Há cinco anos Aguieiras vai à Parada LGBT de São Paulo levando seu protesto. De lá pra cá será que alguém notou e tomou alguma atitude para com esta esquecida "fatia" do público LGBT?
Um dia eu assisti pela TV um conhecido deputado estadual do Rio de Janeiro e que também é pastor, declarar em seu programa: "Homossexuais não são felizes. Querem a juventude para sempre. Vejam se eles cuidam das "tias", e acrescentou, "os gays idosos são esquecidos pelos outros do seu grupo". Raramente eu concordo com um pastor fundamentalista, no entanto, neste dia, entristecido, tive que concordar com metade de sua fala, a que diz que os gays idosos são esquecidos pelos outros. Tenho lidado com isso; tenho visto isso dia a dia e tenho me preocupado com esta questão.
Faz parte do meu trabalho visitar hospitais e asilos e também faz parte do meu trabalho, como pastor de uma comunidade, enxergar meus paroquianos e cuidar deles. Dia desses, fui procurado por um homem no telefone, que me contou ter 73 anos de idade. Conversamos bastante e ele me contou, aos prantos, que em breve terá que ir para um asilo, pois a família há muito não tinha mais laços com ele. Contou que, embora tenha 11 sobrinhos e 4 irmãos vivos, vive completamente só. Os amigos que não faleceram, alguns já estão no asilo, outros, são reféns da família homofóbica. Pedi para que ele fosse à igreja num dos cultos e ele me disse que tem medo de ser rejeitado por ser "velho". Passaram dois fins de semana que com ele falei e até agora, não apareceu mesmo, nem telefonou mais. Será que ele já se internou no asilo?
O que o Ricardo Aguieiras declarou é difícil de engolir porque é a verdade: é muito cruel que homens e mulheres que um dia lutaram para se assumirem, que tiveram amigos e relacionamentos afetivos, muitos são viúvos e viúvas, terem que voltar para o armário quando chegam a uma determinada idade. Sim, é cruel demais!
Parece que gays idosos são invisíveis não é verdade? Mas eles existem e a maioria sofre com sua condição. Muitos tomam coragem e até vão a determinados lugares gays, mas eu já vi muitos gays, ao perceberem a presença de um idoso no recinto, fazerem chacota, pois esquecem que um dia, serão idosos também, pois a roda viva da vida sempre gira!
Eu sei que em lugares como Rio de Janeiro e São Paulo, existem determinados ambientes "especializados" em gays idosos, mas o Brasil não se resume ao eixo RJ – SP. Li aqui mesmo no "A Capa", que até um documentário sobre a sociabilidade dos gays da "terceira idade" está sendo produzido. Contudo, estou certo que é uma minoria que freqüenta tais lugares, pois a parca aposentadoria, muitas vezes, é gasta nos primeiros dias de pagamento com as contas, que são muitas e salgadas. É fato que Aguieiras tem razão!
Até em nossas igrejas inclusivas eles são muito poucos! Digo "até" porque muitos pensam que é isso mesmo que resta para um idoso: ler a bíblia, freqüentar uma igreja e rezar. Mas isso também é uma mentira, pois se fosse verdade, nossas igrejas estariam abarrotadas deles e não estão! Sabe onde os tenho encontrado? Nos hospitais, nos asilos; os que têm acesso a internet me escrevem contando de sua solidão e dor; alguns telefonam como o senhor que contei. Tais idosos, quando estão em tais lugares, fazem de tudo para esconderem sua identidade, pois temem o duplo preconceito, uma vez que, pelo menos um deles, eles já sentem diariamente. Não é fácil descobri-los e, quando conseguimos, a conversa é travada ao pé do ouvido, com muito cuidado para que ninguém ouça o que estamos falando.
Pense! Se já é problemático ser idoso neste país, imagine ser um gay idoso! Não me lembro exatamente onde assisti uma matéria sobre as pioneiras travestis cariocas. Lembro-me sempre de duas mostradas: uma que vive com a mãe, no subúrbio carioca e que está em torno dos 60 e poucos anos e outra, cabeleireira, dona de um salão de beleza em Copacabana. A primeira disse ter muita saudade dos seus dias de glória: viajou pela Europa, estrelou muitos shows, muito glamour, enfim. A segunda mostrou fotos do seu tempo de juventude nas ruas de Copacabana; hoje, além de trabalhar muito no seu salão, passa os dias na paróquia do bairro: "sou carismática" (ela estava se referindo à renovação carismática católica), "vivo na igreja". Elas são felizes, elas mesmas declararam, mas são exceções.
No meu diálogo com o movimento homossexual brasileiro, raras vezes ouvi dos líderes alguma palavra sobre os gays idosos. Posso contar nos dedos de uma mão. Não estou aqui para fazer crítica negativa à militância somente, mas preciso dizer algo que está engasgado faz tempo: a militância também se esquece dos gays idosos! Nas propostas que o movimento faz ao poder público, sempre de muita importância, reconheço, não vejo os gays idosos contemplados, embora muitos dos líderes visivelmente já passaram dos 50 anos de idade. Por que esse esquecimento com os que são mais velhos? Por que não contemplá-los também em nossas propostas? Por que não existe uma real preocupação, que se mostra em atitudes efetivas para com a esquecida e invisível população LGBT idosa?
Nas Paradas do Orgulho, contamos nos dedos a presença dos homossexuais idosos. Ricardo "salva a pátria" quando aparece com seu cartaz de protesto em São Paulo. Aqui no Rio de Janeiro ainda não vi nada parecido e não preciso ser vidente nem profeta para saber que acontece o mesmo em outras cidades brasileiras. Já pararam para pensar por que eles não comparecem?
Gays idosos existem e estão vivos! Eles também têm sexualidade, também têm desejos e também sofrem, como todo ser humano, com a solidão e o esquecimento. Viver invisível até para seus pares é cruel demais! Voltar pro armário depois de uma vida fora dele é outra crueldade sem tamanho! Precisamos, urgentemente, não apenas notá-los, enxergá-los, mas fazer algo por eles. Precisamos de políticas públicas que os contemplem e de uma militância que exija isso do poder público. Precisamos, como homossexuais cristãos, amá-los e ir ao encontro deles, cheios de fraternidade no coração, afetos nas mãos e atitudes que façam a diferença. Não podemos nos calar e fazer de conta que eles não existem e que nada temos a ver com isso. Solidariedade e não "pena"; amizade e não "tapinhas nas costas"; afeto real e não superficial; verdadeiro envolvimento com essa causa, não apenas uma declaração de intenções ainda que boas intenções!
Você que é jovem e que talvez esteja lendo desinteressadamente este artigo, lembre-se que "tudo é vaidade" e que a roda viva da vida gira para todos; girará para você também! É preciso que plantemos boas sementes se queremos boas colheitas. Envolva-se nisto!
O Governador e o Ministro
Como vocês já devem saber, o Governador do Mato Grosso do Sul, André Puccinelli (PMDB), durante reunião com empresários do seu estado, chamou o Ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, de "viado (sic) fumador de maconha". Foi além, numa criminosa declaração, disse que se o ministro co