Estreou na última sexta-feira (10/09) o longa-metragem francês "O Refúgio" (Le Refuge), dirigido por François Ozon (O tempo que resta), que é considerado um dos principais diretores do cinema francês da atualidade.
O ponto de partida do filme se dá quando um dealer chega ao apartamento que pertence a Louis (Melvil Poupaud) e Mousse (Isabelle Carré), que esperam ansiosamente por uma quantia considerável de heroína. Nos minutos seguintes, a câmera do diretor foca nas expressões drogadas e tensas do casal.
O clima e o enquadramento mudam quando Louis tem uma overdose e Mousse acorda um dia depois em um hospital. Assim que abre os olhos, a garota é informada que seu parceiro faleceu e que ela está grávida. Curiosa para saber se a criança é parecida com o namorado morto, ela decide ter o filho. A partir daí, o filme toma outro rumo.
Mousse resolve se afastar do clima metropolitano de Paris e se isola numa cidade litorânea da França para se acalmar. Sua calmaria, contudo, será interrompida com a chegada do irmão gay de seu namorado, Paul (Louis Ronan Chois), que está a caminho da Espanha e resolve fazer uma visita.
No início, Mousse o trata rispidamente, pois a garota vive os dias a lidar com a abstinência da heroína a base de xaropes feito com metadona, que servem para evitar o aborto no clímax da ausência da droga. E é justamente nesse clima de tensão que Paul interfere para trazer a tranquilidade e o companheirismo, coisas que Mousse há tempos não encontrava.
A jovem também passa a lembrar do ex-namorado, por quem ainda nutre amor, em todos os momentos em que olha o cunhado. Por conta disso, passa a nutrir um amor fraternal por ele, mas ciente de que não poderá ir em frente. Porém, a protagonista tem outros planos para o cunhado…
Mais do que tratar da história de uma mãe que tenta ficar limpa para ter o seu filho, o diretor François Ozon está mais preocupado em focar as expressões e os momentos em que elas se dão. Dor, ausência e apreensão estão em todos os momentos de Mousse, e a sua ansiedade expressa não deixa enganar a vontade que sente diariamente de uma nova dose. Mas Paul surge para lhe dar amor, compreensão e acaba por preencher a ausência da droga.
Dois momentos retratados no filme expressam tais sentimentos: o primeiro é quando Mousse vai ao quarto de Paul para acordá-lo e nota que há quatro pés na cama do rapaz. Quando os dois acordam, ela não esconde o ciúme e faz com que o amante de seu cunhado vá embora. O segundo momento é responsável por um dos clímax mais belos do cinema recente: é quando Mousse, Paul e o namorado dele vão à boate.
Os três dançam juntos embalados por músicas eletrônicas, que devem ter sido escolhidas a dedo pela produção do filme, pois casam perfeitamente com a cena. Em dado momento, Mousse se retira para descansar e tomar cerveja. Em seguida, vai à procura dos dois e os encontra num beijo profundo (ela se resume a ficar a observá-los). Entristecida, ela retorna sozinha para a pista e continua a dançar.
Paul é para Mousse tudo aquilo que ela não conseguiu ser, ou não se lembra mais: ternura, liberdade e amor. O rapaz também representa a incapacidade que ela sabe ter de dar amor para a criança que está por vir. Sem a droga e sem o namorado, Mousse não consegue reencontrar o seu lugar no mundo e vive angustiada neste vácuo que virou a sua vida.
Sem clichês e estereótipos, no fundo, o diretor retrata personagens que, de uma certa maneira, vivem à margem da sociedade e do status quo: a jovem mãe viciada, os amantes homossexuais que não podem ficar juntos e famílias que não se encaixam no padrão reprodutivo. O desfecho é para lá de emocionante e surpreendente.