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Pesquisador conta detalhes da vida íntima de Tom of Finland, ícone da arte homoerótica

Se estivesse vivo, o artista finlandês Touko Laaksonen, mais conhecido como Tom of Finland, completaria hoje 89 anos. Ícone máximo da arte homoerótica, Tom influenciou gerações e seu trabalho refletiu em diversos segmentos da sociedade, entre eles (e principalmente) a moda.

Se antes suas ilustrações de homens fortes e viris, vestidos com roupas de couro ou jeans, eram consideradas "pornográficas", hoje elas têm um papel de destaque na história da arte contemporânea. Para contar um pouco sobre a vida e obra de Tom of Finland e também para homenageá-lo pela data, a reportagem do A Capa foi atrás de Vicente Galvão Parizi, 57, psicólogo, psicoterapeuta e mestre em Ciências da Religião pela PUC-SP.

Parizi pesquisou sobre o artista com o objetivo de entender a auto-imagem do gay contemporâneo. Nesta entrevista, ele opina sobre a importância do finlandês para a cultura e identidade gays e fala, entre outras coisas, de sua vida íntima recheada de fatos curiosos e polêmicos, entre eles o de que Tom gostava de transar com soldados nazistas – o que explicaria seu fetiche por homens de farda, tão lindamente retratados em suas criações. Leia a seguir.

Por que você, como psicólogo, se interessou por Tom of Finland?
Em 1999, o Conselho Federal de Psicologia publicou uma resolução que estabelecia que a homossexualidade não poderia ser mais considerada uma doença. Portanto, se não é doença, nem distúrbio nem perversão, como nos posicionarmos ante a questão e como atender aos clientes que nos procuram?

Parti tanto da experiência de meus clientes quanto da minha própria. Como profissional, é claro que passei por várias terapias, com diversas pessoas e em diversas abordagens. Nunca me senti realmente compreendido. Senti o mesmo diante de meus clientes. Pensar em complexo paterno, fixação em fases primitivas do desenvolvimento, perversão, narcisismo etc, não ajudava ninguém na diminuição da angústia. O Tom apareceu porque ele foi um artista que reflete essa luta entre o gay e a sociedade: ele se assumiu, que se recusou a sentir vergonha, que se expôs francamente (e expôs todas as suas taras) e conquistou um lugar ao sol dessa forma.

Qual foi o foco da sua pesquisa?
Eu estava trabalhando sobre a questão da auto-imagem dos gays. Como psicólogo, pensei inicialmente na imagem interna. Porém, a imagem interior se reflete no exterior, eu devo mostrar ao mundo uma imagem que seja fiel ao que penso de mim mesmo, certo? Ora, a imagem mais comum dos gays é o cara forte, sarado, musculoso, vestido em roupas justas e com malão. Ou seja, o "homem de Tom" está andando por todos os lugares onde está presente a cultura gay. À medida que fui lendo a biografia de Tom e entendendo o que ele buscava representar com seus desenhos, percebi que minhas reflexões sobre o homem gay contemporâneo podiam ter como eixo central esses desenhos. Acho que o trabalho ficou bom, inclusive foi publicado na revista "História & Perspectivas", da Universidade Federal de Uberlândia. Quer dizer, teve um aval acadêmico.

O que representou Tom of Finland para a cultura e identidade gays?
Acho que a questão central é sempre a auto-imagem. Nos anos 40 e 50, a imagem vigente para os homossexuais ainda era o dândi elegante e decadente preconizado desde o século XIX por Oscar Wilde (e seu Dorian Gray) e Marcel Proust (e o Barão Charlus). O homossexual era descrito como elegante, refinado, amante das artes e mais sensível que o comum dos mortais. Mas esse tipo efeminado não falava à fantasia e ao desejo de Touko, e ele começou a desenhar (e propor) um novo estereótipo: o gay macho. Tom foi um dos que, através de sua arte, começou a mostrar ao mundo em geral e aos gays em particular que os homossexuais podiam ter aspecto masculino, corpos fortes. Outro aspecto importante é que a maioria dos desenhos retratava situações ao ar livre e durante o dia. Tom propõe machos que parecem machos, gostam de machos, e que não se escondem.

Penso que esses desenhos trazem à tona desejos profundos de homens que foram obrigados a reprimir sua sexualidade e neles encontram a liberdade. Esse ideal de um novo protótipo homossexual parece adequado ao ativismo pós-Stonewall, quando os homossexuais desejavam sair da clandestinidade e ocupar um lugar no mundo. Para isso, precisavam vencer o preconceito, e uma das formas de fazê-lo era abandonando protótipos anteriores, como a "bichinha" lânguida, cheia de trejeitos, feminina. O "orgulho gay" exigia homens vitoriosos, fortes, seguros. Tom é o mais legítimo representante da subcultura gay que desafiou a invisibilidade e as indignidades da era pré-Stonewall.

Durante os anos 60 e 70, muitos homens gays passaram a frequentar academias, trabalhando e modelando seus corpos, "criando-se" de acordo com o imaginário hipermasculino dos "homens de Tom" e usando roupas que pudessem salientar ou exagerar tanto seus dotes naturais quanto seus novos músculos.

Você acredita que sua importância extrapolou os limites da cultura queer?
Sem dúvida. Por exemplo, quando ele ainda morava em Helsinque, muitos motociclistas, tanto gays quanto héteros, tiveram acesso aos seus desenhos e também viam Tom andando de moto e nos bares com as roupas que tinha criado. Então, muitos passaram a customizar suas próprias roupas e acessórios de acordo com as mesmas especificações. E assim, desde o início, uma das mais importantes mudanças na auto-imagem dos homossexuais do mundo todo esteve associada a outros grupos, como motoqueiros do Hell Angels.

Outra coisa muito marcante é a questão da imagem masculina. Sua influência fora da comunidade gay é tão forte que entendo os "homens de Tom" como um modelo sexual para todos os machos. Na segunda metade do século passado, uma grande mudança ocorreu na auto-imagem homossexual no mundo todo, redefinindo um novo protótipo gay: o hipermacho tão bem definido por Tom of Finland. Essa imagem parece ter falado aos homens em geral e passou a ser o überman, o grande modelo masculino do final do século XX e início do XXI.

Tom of Finland influenciou também o mundo da moda, inclusive inspirando criações de roupas, perfumes, entre outros produtos. Qual a importância disso para o entendimento da figura do artista?
Nos anos 60, Tom realizou trabalhos para empresas e revistas de moda, inclusive sendo contratado por uma companhia de roupas de natação para homens. Naturalmente, criou modelos sempre muito sexy, e valorizando a exibição do pênis por baixo da roupa.

Então, suas roupas são sempre muito justas, a cor preferida é o preto e os materiais escolhidos o jeans e o couro. Os modelos são os trabalhadores do campo, operários de construção civil e militares. O desenho busca aumentar os ombros, as calças justas acentuam o sexo, botas. As camisas em geral são de uniforme ou listradas, ou ainda t-shirts brancas. Foi Tom quem praticamente inventou o boné de couro dos motociclistas, a partir de transformações que introduziu no quepe dos oficiais nazistas.

Estilistas que confessaram a influência de Tom em sua moda são Tom Ford, Jean-Paul Gaultier e o novaiorquino Raymond Dragon. No São Paulo Fashion Week Primavera-Verão 2005, Alexandre Herchcovitch afirmou inspirar-se em Tom para encher a passarela de estilizados caminhoneiros, estivadores, maquinistas de trens, cowboys, pedreiros e lenhadores.

Em breve será lançado no Brasil o livro "XXL", que traz algumas ilustrações de Tom. O que você pode nos contar sobre ele?
O livro não traz apenas algumas ilustrações de Tom, mas pretende ser a mais completa publicação feita até hoje. Tom desenhou muito e distribuiu seus desenhos para jornais, revistas, cartazes, além de particulares (amigos, co

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