No começo do século XX a literatura brasileira foi presenteada com aquela que é considerada obra marco do modernismo brasileiro: "Macunaíma", escrito por Mário de Andrade e publicada originalmente em 1928. O livro marcou por várias questões: sua linguagem inovadora e repleta de neologismos e por colocar como personagem principal um sujeito, que dá nome a obra, que não gosta de trabalhar, se aproveita de todos e que tem como frase "ai que preguiça". Assim, Macunaíma pode ser considerado o anti-herói que marcou a literatura brasileira no século XX.
Pode-se afirmar que este inicio de século de XXI ganhou o seu anti-herói da literatura: Zé Carlos, personagem central da obra "Porponopeia", de Reinaldo Moraes, que foi lançada em 2009. A obra de Moraes começou a ganhar fama pelo famoso boca -a – boca e em meados de 2010 a primeira edição do livro estava completamente esgotada e foi aí que a imprensa hegemônica resolveu se debruçar sobre o livro e alçá-lo para a lista dos melhores do ano de 2010. Com isso o livro ganhou uma segunda edição, prêmios e destaque nas prateleiras das principais livrarias do Brasil.
Apesar do livro enquanto produto ter saído da marginalidade e ganhado amplo destaque, o grande lance da obra de Moraes é justamente esse: é a margem que dá o tom em toda a obra que conta a vida de Zé Carlos, um cineasta falido, esquecido e que, para ganhar algum dinheiro se vê obrigado a fazer filmes pornôs de segunda categoria e vídeos institucionais sobre frangos embutidos. Mas, o que constitui a personagem de Zé Carlos? Assim como Macunaíma representava um sujeito brasileiro que migrava do campo para o centro urbano, Zé Carlos representa o sujeito moderno deste século XXI: individualista, hedonista e fragmentado.
Outra característica que aproxima a obra de Reinaldo Moraes a de Mario de Andrade é a criação de palavras. É impressionante a maneira como Moraes consegue transformar dialogo debatidos pelos bares da rua Augusta em palavras. Na verdade, o escritor se utiliza do som acústico das palavras para transcrevê-las. Ou seja, Moraes transcreve as palavras não em sua norma culta, mas da maneira como a falamos, o que faz com que o seu livro tenha uma linguagem inovadora e muito particular.
Por fim, tanto "Macunaíma" quanto "Pornopopeia" inauguraram séculos e épocas que marcaram/ vai marcar um ciclo. Ainda não dá pra saber se o livro de Moraes vai abrir espaço para outras obras e autores experimentais e que tratem do lado maldito (aqui no sentido positivo desta palavra) e libertador da vida. Mas, "Pornopopeia" já cumpre o seu papel de levar para as livrarias e para as listas dos mais vendidos um retrato debochado e pra lá de realista do nosso tempo, onde o que vale é o prazer agora e não o que faremos amanhã.