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Programação acertada

Comento atrasado, mas antes tarde do que nunca. A programação da Feira Cultural LGBT organizada pela APOGLBT no feriado de Corpus Christis no último dia 11 foi bastante acertada. No ano passado a Associação já dava sinais desse caminho.

As atrações dessas edições, ainda que não movimentem uma massa espetacular e tenham causado certo estranhamento, representam uma parcela pequena, mas não menos significativa da comunidade gay. Em 2008 o Montage foi o destaque da feirinha. Esse ano, Tetine ao lado de Madame Mim, DataBase e Multiplex se apresentaram no evento.

Digo que a programação foi acertada porque de certa forma, ela me representou. Tenho um gosto bastante eclético – que vai de Claudia Wonder a Claudia Leitte e passa de filmes cults a terror trash e comédias românticas -, mas preferência por alguns artistas que não gozam de grande espaço, tanto de divulgação quanto de mídia.

As atrações da feirinha desses dois anos não têm um enorme apelo de massa, como é o caso, por exemplo, da Silvetty Montilla, mas estavam lá, ocupando um espaço que é importante ser pluralizado. As drags não ficaram muito felizes com a mudança e em ter que dividir o espaço.

Um amigo defendeu que tudo bem colocar os expoentes da cultura underground, mas que estes mereciam 10 ou 20% do tempo da programação, porque "não é disso que as bichas gostam". Acho um tanto quanto arriscado e perigoso pensar assim, porque valoriza uma expressão em detrimento de (muitas) outras.

É pensar na maioria que alimenta e aumenta Ibope de jogo de futebol, que faz, por exemplo, que outros esportes tenham menos visibilidade e espaço na mídia. Que seja exibida uma Olimpíada, mas que nem seja comentada a existência da Paraolímpiada. É justificar que como os gays "são minoria" ocupem cerca de 1% do tempo total de uma novela, quando ocupam, e que não seja exibido o tão comentado e esperado beijo gay.

Quando falamos do que "a massa" prefere estamos falando mesmo de gostos reais ou de círculos viciosos, fabricação de produtos culturais, manutenção de valores dominantes e influência/dominação de indústria cultural e entretenimento?

Um número maior de pessoas não gosta da música de uma Claudia Wonder porque a música é ruim, não tem valor estético/artístico ou porque somos "programados" desde cedo a "gostar" do que dá mais lucro para a indústria fonográfica ou não fomos apresentados a alternativas que englobem opções mais plurais de gostos musicais?

Não gosto do som do Montage porque é ruim, simplesmente não gosto ou porque para mim, através, do rádio, da tv e dos locais por onde me chegam informação esse som não aparece e para acompanhar eu teria que me movimentar e correr atrás, ao invés de ficar sentado no sofá com o dedo no nariz?

La Prohibida, por exemplo, atração do Prêmio da Diversidade, teve uma recepção fria e um tanto quanto mal educada do publico paulistano. Poucos sabiam do seu cunho ativista e já conheciam sua música antes de ela aportar no Brasil. Tive a sorte de assistir ao documentário Gay… e daí?, no MixBrasil do ano passado em que ela era uma das personagens que falavam sobre a situação dos gays na Espanha. Um exemplo de inteligência.

Se pararmos para pensar no "gosto" da maioria em se tratando de orientações sexuais e identidades de gêneros e na manutenção de valores por instituições "dominantes", como mídia, religião, Estado e indústria cultural, seríamos todos homens e mulheres e heterossexuais. Porque é o "que a maioria quer".

E aí, pra que então fazer um feira/festival da diversidade se não for pra de fato incorporar esse valor e não deixar que uma cultura se sobreponha a outra, por mais que ela tenha "menos adeptos", "venda menos", "dê menos audiência" ou "gere menos mídia"? Não estamos falado de representação?

Felizmente, parece que alguém lá na Associação deve estar pensando nisso. E é por isso que, nesse sentido, estão no caminho certo.

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