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Psicólogo Pedrosa Responde: Namoro um evangélico casado e pai de família

Tenho um relato, é o seguinte. Faz um tempo tenho um namorado ou quase, ele é casado por questões religiosas. Logo no início da sua vida adulta resolveu se casar para esconder a sua homossexualidade da família e da sociedade. Nesse período, ele teve uma filha, já tem 10 anos de relação. Hoje ele tem 31 anos e eu tenho 23, nos conhecemos a quase dois anos, mas nos últimos oito meses, ele pediu um tempo, pois estava com problemas familiares e financeiros. Compreensivo, mas estamos sempre nos falando, nos encontrando. É como se nada tivesse acontecido, mas na verdade ele esta se reprimindo, já percebe que gosta muito de mim, mas tem medo de expor isso a família descobrir e fazer retaliações.

O maior medo dele é ter a rejeição da filha pelo fato de assumir a homossexualidade e pela questão religiosa. Em várias conversas falo que a felicidade não depende do outro, mas se pode construir. Se reprimir não existe felicidade, mas angústia. Outra coisa, ele não precisa expor isso a ninguém, somente ter uma postura formal e viver a vida. Só para o senhor ter uma noção da situação, aliás da lavagem cerebral feita pela igreja que ele frequenta, diziam que o HIV surgiu da relação homossexual, Loucura né, mas mostrei a ele os fatos e hoje ele sempre agradece por eu apresentar e expor os fatos de forma correta. Gostaria de um conselho ou mesmo um posicionamento, sei que ele gosta e muito de mim, por isso insisto. Atenciosamente. Gê (São Paulo – SP)

Obrigado pelo contato. A situação deste seu namorado é similar a de muitos gays que para fugir das punições homofobias casam com uma mulher e constituem uma família. Ficam muito bem escondidos dentro do armário. Trata-se de uma estratégia de sobrevivência. Agindo desta forma, escondendo sua homossexualidade, não serão preteridos pela família, poderão fazer uma carreira profissional  (a homossexualidade pode ser um complicador na ascensão profissional e na promoção), enfim, serão aceitos pela sociedade.

Este quadro vem mudando vagarosamente nos últimos dez anos. Por causa das paradas gays, da maior exposição da homossexualidade na mídia e maior visibilidade dos homossexuais no mundo todo os jovens gays adolescentes vêm assumindo a sua homossexualidade muito mais cedo do que as gerações passadas. Mas, ainda vivemos num país homofóbico. Pesquisa realizada recentemente pela Datafolha indica que só 2% dos brasileiros assumem publicamente a sua homossexualidade.

Outra pesquisa, também da Datafolha, mostrou que 49% dos brasileiros rejeitam a união civil homossexual e 52% dos brasileiros acham que os homossexuais não devem adotar crianças. Dados do Grupo Gay da Bahia revelaram que a cada dois dias um homossexual é assassinado no Brasil. Só no ano de 2008 ocorreram 190 assassinatos de brasileiros vítimas do crime homofóbico entre gays, lésbicas e travestis. O Brasil amarga o lamentável título de campeão mundial de assassinato de homossexuais, seguido pelos Estados Unidos da América e pelo México. A Fundação Perseu Abramo, em 2008,  buscou através de pesquisa investigar a percepção dos brasileiros sobre práticas sociais discriminatórias em razão da orientação sexual e foi apontado o preconceito contra 92% de gays e lésbicas.

Daí a importância de apoiarmos a PLC-122/06, que é um projeto de lei que tramita no parlamento em Brasília que visa criminalizar a homofobia. Caso este projeto de lei seja aprovado será um grande passo no combate da homofobia no Brasil. As pessoas irão pensar duas vezes antes de demitir um funcionário gay ou agredi-lo, por exemplo, pois estão sujeitas a prisão.

Talvez esta triste realidade de perseguição aos homossexuais explique o medo que os gays e o seu namorado tem de assumir abertamente a sua homossexualidade. No caso do seu namorado ele ainda está sobre controle dos dogmas religiosos que condenam veementemente a prática homossexual. Mas, penso que os homossexuais não devem desanimar diante deste quadro.

Quantos mais gays tiverem o peito de assumirem publicamente sua homossexualidade melhor, pois quanto maior a visibilidade gay menor será a homofobia. A decisão de sair do armário é muito pessoal e cada caso é um caso. Alguns conseguem, outros não. Temos que respeitar a decisão de cada um.

Sobre a questão de que o HIV surgiu da relação homossexual isto é uma inverdade, uma bobagem. Muitos dos argumentos das igrejas para condenar a homossexualidade são bem frágeis por isso chegam a apelar para ideias absurdas como esta, que numa linguagem popular poderíamos chamar de baixaria.

Finalmente, meu caro Gê, você me pede um conselho. O que eu poderia te dizer é que não sei se vale a pena você insistir neste relacionamento. Analise os complicadores: ele é casado, tem uma filha, tem medo das retaliações da família e é muito ligado numa religião. Será que não é o caso de você partir para outra parada, buscar novos horizontes? Reflita.

Boa sorte!

* João Batista Pedrosa é psicólogo (CRP 06/31768-3) e autor do livro Segundo Desejo (Iglu). Envie suas dúvidas e perguntas para pedrosa@syntony.com.br. Acesse também seu site http://www.syntony.com.br/.

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