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Religão x Gays: O que cada segmento religioso pensa sobre os homossexuais

O debate religião x homossexualidade envolve bastante polêmica e está sempre causando alvoroço na mídia. A cada notícia veiculada, percebemos que é uma discussão que está longe de encontrar um desfecho, muito pelo contrário, a cada novo tópico, carrega o rótulo de extremamente inflamável: de um lado, aqueles que contestam a homossexualidade no cerne religioso, condenando os gays e usando a Bíblia como referência para explicar os motivos da demonização. Do outro, os indivíduos que lutam por uma melhor interpretação da Bíblia e que pregam o respeito e a liberdade dos homossexuais, alegando que discriminação não faz parte da proposta de amor pregada pelo mesmo livro que os homens usam como referência para os ensinamentos de Deus. No meio disso tudo, os que apenas observam o debate.

A discussão da homossexualidade pela religião trafega por duas mãos bem distintas. Há a possibilidade de condená-la, alegando ser um pecado digno de morte, como é o caso de algumas religiões de cunho oriental. Outras religiões, não tão rigorosas, condenam a prática, mas não sugerem penas capitais. Porém, há também aqueles que mesmo imbuídos do discurso religioso, pregam o amor ao próximo e fazem uma interpretação mais contemporânea dos estudos bíblicos, alocando tais interpretações no contexto em que a Bíblia foi escrita, importando-as para os tempos atuais e dando-lhes uma nova roupagem.

O filme Orações para Bobby aborda a questão religião x homossexualidade através dos conflitos estabelecidos dentro do âmbito familiar.

NO CINEMA
Orações para Bobby, dirigido por Russel Mulcahy, apresenta uma estrutura narrativa bem didática para a discussão do tema religião x homossexualidade. É uma adaptação do livro homônimo lançado por Leroy F Aaron, sem tradução para o português. No filme, Sigourney Weaver é Mary, mãe dedicada e religiosa, que preza pelos valores ditos cristão dentro do seu lar. Tanto ao jantar, como nas reuniões de família, os diálogos entre ela, o marido e os filhos navegam na maré dos ensinos bíblicos.

Cena de Orações para Bobby

 

As coisas começam a ficar tensas em casa ao ser informado pelo filho mais velho que Bobby (Ryan Kelley), seu querido e companheiro das sessões domésticas de cinema, é gay. A partir daí, a busca intensa por salvar o seu filho do pecado mortal leva a família a mergulhar numa tragédia dolorosa. Bobby, ao não suportar a pressão e se distanciar da mãe, torna-se ainda mais frágil do que realmente o é e suicida-se.

A partir da dor que Mary vai começar a mudar o seu pensamento e entender os ensinamentos bíblicos por outro viés. Ela busca ajuda em leituras, grupos de apoio a homossexuais e no reverendo de uma igreja que no passado, foi visitada pelo jovem Bobby em um momento de angústia. É numa destas idas a igreja que o filme talvez apresente o seu melhor diálogo. Tensa, Mary busca respostas do reverendo, tentando entender os motivos que o leva a aceitar a homossexualidade com tanta leveza e respeito. Ao citar passagens bíblicas na discussão, é contemplada por interpretações opostas daquilo que ela carregava como verdade.

Através da dor, Mary parte em busca de redenção, manifestando-se como representante do direito dos homossexuais. Foi preciso o acontecimento trágico para que ela e toda a sua família compreendessem melhor o assunto e se distanciassem dos ditames religiosos rigorosos apresentados na maior parte do filme.

A HOMOSSEXUALIDADE NO DISCURSO RELIGIOSO
O tema é polêmico e data de tempos remotos na história das civilizações: além de instituído na Babilônia e Canaã, na Grécia antiga, era muito comum o amor entre homens. Os exércitos de Tebas e Esparta, por exemplo, faziam sacrifícios para Eros, deus do amor, e posteriormente se relacionavam, antes de adentrar nos sanguinolentos combates.

Para os judeus, a homossexualidade é um pecado e em tempos remotos, foi punida com pena capital (morte). O livro de referência é o Torá, que segundo os seguidores, previa a penalização dos homossexuais, que durante muito tempo, foram perseguidos, principalmente na expansão do cristianismo. Numa das cenas iniciais do filme, durante o aniversário da avó de Bobby, enquanto um dos filhos de Mary brinca com uma bolsa e simula postura afetada, a avó alega que "as bichas deveriam ser enfileiradas e fuziladas". O preconceito não parte apenas da mãe do personagem Bobby, mas de quase todos os membros da família. Curiosamente, o pai, que de acordo com os padrões normativos da sociedade, representa o elemento machista da relação, parece ser o mais tranquilo, buscando compreender melhor a situação de Bobby.

No seguimento cristão, o catolicismo reprova a homossexualidade e utiliza os livros bíblicos Gênesis, Levítico e as Cartas de São Paulo como respaldo para tal reprovação. O Protestantismo, apesar da não aprovação por alguns representantes, em comparação aos
católicos, são mais maleáveis. A Dinamarca, país com alto índice de população protestante, foi um dos primeiros locais a reconhecer os direitos da união homossexual. Para o Espiritismo, o espírito não tem sexo e um mesmo espírito pode, em diferentes encarnações, habitar um corpo de um homem ou mulher. Doutrinadores como o médium Divaldo Franco se posicionam sem condenar os homossexuais, informando que o que será observado é a conduta moral, independente da sexualidade do indivíduo.

O Islamismo considera a homossexualidade um desvio de conduta, e em países como Irã e Arábia Saudita, os homossexuais eram punidos com a morte. Outras nações, como o Paquistão e a Algéria, condenam a homossexualidade com prisão, multas ou punição corporal.

Religiões neopagãs como a Wicca não se posicionam contra a conduta homossexual. No caso do budismo, não há grande problematização do assunto: a religião prega apenas o distanciamento de práticas mundanas.

No geral, as religiões debatem o mito fundador da natureza, momento em que Deus criou o homem e a mulher, um para o outro, com o intuito de procriar.

De acordo com a pesquisadora Regina Soares Jurkewicz, também professora da disciplina Fenômeno Religioso no Instituto Superior da Diocese de Santo André, em São Paulo, boa parte da discussão acerca da homossexualidade no discurso religioso coloca os seus esforços em averiguar o que a Bíblia tem a dizer sobre o tema. É o que a personagem Mary, do filme Orações para Bobby, faz boa parte do tempo. Ela busca, tanto antes, como depois da trágica morte do filho, respaldo nos ditos da Bíblia para sanar as dúvidas que vão surgindo ao longo da trama.

Mais recentemente, os temas união homossexual e adoção provocaram intensos debates na mídia. É outro polêmico tópico do assunto. Segundo Luís Correa Lima, da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, a Igreja Católica já divulgou que as uniões homossexuais seriam nocivas para o progresso da sociedade e inserir crianças em uniões deste tipo através da adoção, significa uma prática de violência contra as mesmas, pois se aproveita seu estado de fraqueza para introduzi-las em ambientes que não favorecem o seu desenvolvimento humano.

Na seara dos teólogos que defendem a homossexualidade, temos o anglicano Norman Pittenger, que discursa sobre a dignidade da honra do homossexual, similar a qualquer heterossexual. Ao afirmar o caráter não pecaminoso da homossexualidade, Pittenger segue o mesmo pensamento de cunho espírita, religião que no Brasil, encontra em Chico Xavier um nome bem representativo: o que é observado perante Deus é a conduta moral de cada um, independente se a sua relação é homossexual ou heterossexual. Curiosamente, o pensamento do teólogo católico John McNeill vai de acordo com o expressado por Pittenger, principalmente ao dizer que as regras morais valem para as pessoas de conduta homo ou hétero, importando apenas que as pessoas tenham relações com responsabilidade, respeito e ternura.

*Matéria originalmente publicada na Revista A Capa #58

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