O prefeito de Duque de Caxias, José Camilo Zito (PSDB-RJ), não permitiu que a quarta Parada Gay de Duque de Caxias, que seria realizada no domingo (11/10), fosse realizada. Cerca de 150 mil pessoas ficaram concentradas na Avenida Brigadeiro Lima e Silva, centro da cidade, para participarem do evento.
Segundo ativistas locais, o embargo não foi comunicado em nota oficial e sim verbalmente pelo Secretário de Segurança de Duque de Caxias por volta das 13h, momentos antes de a manifestação começar.
Em declaração à imprensa o prefeito disse que a parada gay "provoca cenas obscenas em via pública" e disse não ter nada contra a homossexualidade. Zito, como é chamada o prefeito, também disse que o cancelamento se deu porque a população de Duque de Caxias e as igrejas da cidade estão insatisfeitas com a realização do evento.
Carlos Minc, ministro do Meio Ambiente, esteve presente na manifestação. Para o ministro o episódio é perigoso e leva o Brasil de volta a tempos obscuros. "Soube que o prefeito autorizou a Marcha por Jesus e acaba de proibir uma das maiores manifestações populares do país. O tempo do obscurantismo ditatorial já acabou", declarou.
O ministro ainda afirmou que se ficar entendido que houve homofobia irá enquadrar o prefeito. "Se entendermos que houve uma discriminação por parte do poder público de valorizar eventos em detrimento de outros farei questão que esta municipalidade seja autuada na Lei 3406, que condena estabelecimentos comerciais e gestores públicos que cometam discriminação por conta orientação sexual".
Claudio Nascimento, superintendente de Direitos Individuais, Coletivos e Difusos da Secretaria Estadual de Assistência Social e Direitos Humanos, também esteve presente na Parada de Duque de Caxias e tentou negociar que se diminuísse o número de carros e do som, mas não obteve sucesso.
"Proibir o povo de praticar sua cidadania e sua livre expressão é retroceder tudo que caminhamos até então no que tange à democracia. A Baixada Fluminense tem os maiores índices de assassinatos de homossexuais. Manifestações, como esta que foi embargada, são mecanismos de visibilizar a homofobia. Além disso, tal postura demonstra um não-alinhamento com as políticas pró-LGBT que estão sendo implementadas pelo Governador Sérgio Cabral", disse Claudio.
Proibidos de realizarem a 4ª Parada gay de Duque de Caxias, os presentes estenderam a bandeira do arco-íris de 124 metros e fizeram uma caminhada silenciosa em forma de protesto frente a censura imposta pela prefeitura local.
Caso de justiça
Claudio Nascimento disse que irá notificar hoje a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e o Ministério público (MP) a respeito da atitude do prefeito de Duque de Caxias. Ao jornal "O Dia" Claudio afirmou que “cabe ação civil pública a favor da liberdade de expressão”.
O pré-canditado a governador ao Estado do Rio de Janeiro, Fernando Gabeira (PV-RJ), disse que a atitude de Zito é autoritária. Para Gabeira, a atitude do prefeito passou uma negativa do Rio para o mundo. “É preciso aceitar as evoluções em curso, caso contrário é melhor se candidatar em algum outro país, como a Coreia do Norte, onde ele seria mais feliz”, criticou.
O prefeito Zito voltou a criticar a parada gay como “obscena” e sugeriu que ela seja feita outro lugar. “Que Parada Gay de 2010 seja realizada na vila olímpica do município. Não adianta pressionar porque a lei municipal não vai ser desrespeitada, tanto que vamos buscar um lugar mais adequado para eles se exibirem”, garantiu.
ABGLT condena embargo
Em documento oficial a Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT) diz ao prefeito que causou "decepção" a notícia do embargo.
Lembram ao prefeito que ele feriu o direito básico dos cidadãos de irem e virem e da liberdade de expressão. E que a “Parada LGBT de Duque de Caxias reúne 150 mil pessoas. É a segunda maior das 22 paradas realizadas no Estado do Rio de Janeiro e apoiadas pelos respectivos governos municipais e pelo Governo do Estado”.
Confira a seguir a carta na íntegra:
Embargo da 4ª Parada LGBT de Duque de Caxias
Senhor Prefeito
A ABGLT – Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais – é uma entidade de abrangência nacional que congrega 220 organizações congêneres e tem como objetivo a defesa e promoção da cidadania desses segmentos da população. A ABGLT também é atuante internacionalmente e tem status consultivo junto ao Conselho Econômico e Social da Organização das Nações Unidas. Neste sentido, a ABGLT vem acompanhando e monitorando a realização das mais de 185 Paradas LGBT que ocorrem anulamente em todo o Brasil.
Assim, causou-nos decepção a notícia do embargo por vossa excelência da realização da 4ª Parada LGBT de Duque de Caxias, alegando, segundo reportagem do jornal O Globo, que a parada “provoca cenas obscenas em via pública”, ao mesmo tempo que afirma que “não tem nada contra o ‘homossexualismo’”.
Cabe relembrar neste caso as disposições da Lei Orgância do Município de Duque de Caixas:
Dos Princípios Fundamentais
Art. 1°. O Município de Duque de Caxias, em união indissolúvel ao Estado do Rio de Janeiro e à República Federativa do Brasil, constituído dentro do Estado Democrático de Direito, em esfera de governo local, objetiva, na sua área territorial e competencial, o seu desenvolvimento com a construção de uma comunidade livre, justa e solidária, fundamentada na autonomia, na cidadania, na dignidade da pessoa humana, nos valores sociais do trabalho, na livre iniciativa e no pluralismo político, exercendo o seu poder por decisão dos munícipes, pelos seus representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Lei Orgânica, da Constituição Estadual e da Constituição Federal.
Parágrafo Único. A ação municipal desenvolve-se em todo o seu território, sem privilégios de distritos ou bairros, reduzindo as desigualdades regionais e sociais, promovendo o bem-estar de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
Além de ter sido desrepeitada a Lei Orgânica Municipal, também foram feridas as garantias constitucionais da livre manifestação, do direito de ir e vir, da não discriminação e da igualdade perante a lei, entre outras.
As Paradas LGBT representam uma das maiores mobilizações sociais da atualidade no Brasil. Têm suas características próprias, sendo, ao mesmo tempo, alegres e também reivindicativas do fim da desigualdade de direitos, do preconceito, da discriminção e da violência vivenciados pela população LGBT.
A Parada LGBT de Duque de Caxias reúne 150 mil pessoas. É a segunda maior das 22 paradas realizadas no Estado do Rio de Janeiro e apoiadas pelos respectivos governos municipais e pelo Governo do Estado. No âmbito nacional neste ano, o Ministério da Cultura apoiou 54 paradas LGBT, o Ministério da Saúde apoiou ações de prevenção da Aids em 55 paradas LGBT e o Ministério do Turismo também apoiou várias paradas LGBT. O papel do governo, em qualquer esfera da Federação, é o de garantir a igualdade de todos os segmentos da população, inclusive no que diz respeito a manifestações públicas. Se uma prefeitura permite a realização de uma Marcha para Jesus (relembrando que o estado é laico), ela há de permitir que os demais setores da população, inclusive o setor LGBT, também possam se manifestar. Não se pode governar com dois pesos e duas medidas.
Queremos manifestar nossas congratulações a Sharlene Rosa e toda a equipe do Grupo Pluralidade e Diversidade de Duque de Caxias, ao Movimento LGBT fluminense, ao Ministro Carlos Minc e o Superintendente de Direitos Individuais, Coletivos e Difusos, Cláudio Nascimento, bem com os milhares de pessoas que persistiram e realizaram a Caminhada LGBT em Duque de Caxias, independente da proibição do governo municipal. O desrespeito aos direitos fundamentais há de ser contestado pelo protesto. A proibição da realização da 4ª Parada LGBT de Duque de Caxias é por si só a comprovação da injustiça e da desigualdade de direitos que ainda enfrentamos no Brasil, e é um incentivo para continuar com nossa forma peculiar de reivindicar nossos direitos.
Esperamos que no ano que vem possamos estar juntos – sociedade civil e prefeitura municipal – na 5ª Parada LGBT de Duque de Caxias, unidos na promoção da cidadania e dos direitos humanos da população de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais, rumo a uma sociedade mais justa, igualitária e solidária.
Atenciosamente
Toni Reis
Presidente