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“Tenho certeza de que os LGBTs reconhecem nosso trabalho”, diz Marta

A candidata pelo Partido dos Trabalhadores (PT) concorre mais uma vez a uma vaga à prefeitura de São Paulo. Marta foi prefeita da cidade de São Paulo em 2000. Em 2004 foi derrotada por José Serra quando tentava se reeleger. Depois disso, foi trabalhar no governo federal como Ministra do Turismo, e por lá ficou por um ano e meio. Sempre que questionada se iria concorrer à prefeitura paulistana, dizia que não. Porém, as pesquisas pré-eleições mostravam Marta na dianteira das intenções de voto, com praticamente todo o PT paulistano pedindo a sua candidatura, Marta não teve como recusar.

Marta Suplicy têm seu nome associado às questões das mulheres, isso porque nos anos 80 apresentava na Rede Globo, o TV Mulher, programa onde falava até de orgasmo. Com a comunidade gay, a candidata se tornou parceira ao apresentar em 1996, quando ainda era deputada federal, o projeto de lei que tornava legal a união civil entre homossexuais. O projeto foi engavetado. A candidata é reconhecida por sempre ter apoiado e participado das Paradas do Orgulho Gay.

Em entrevista exclusiva ao A Capa, a candidata fala um pouco sobre o seu primeiro mandato, sobre o que pretende fazer, caso eleita, e de que maneira pretende fortalecer a CADS. Confira a seguir a entrevista na íntegra.

Quais as suas propostas para o fortalecimento da CADS?
As questões da orientação sexual, identidade de gênero e de respeito a LGBTs envolvem o direito à cidadania e de modo muito direto isso quer dizer acesso e permanência na escola, atendimento eficiente na saúde, emprego e renda, moradia digna, possibilidades de vivência cultural, socialização e lazer. A Coordenadoria dos Assuntos da Diversidade Sexual (CADS) tem de agir para que essas ações fluam. Temos claro que é preciso lançar e implementar o Programa São Paulo sem Homofobia. Seguindo, inclusive, diretriz da Conferência Municipal LGBT realizada em março deste ano. 

Setores do movimento LGBT paulistano alegam que a senhora não quis bancar a criação da CADS em sua gestão. Outra parte do movimento dizque foram problemas políticos internos que impediram a criação da Coordenadoria. Tal questão até hoje não ficou esclarecida. O que houve de fato?
É preciso olhar estas questões dentro do contexto. Assumi em 2001, quando a Parada de São Paulo estava ganhando impulso e a discussão da criação da CADS não estava amadurecida. Não se cria nada numa "penada" apenas. É preciso que funcione e, para isso, é necessário criar entendimentos. É preciso fazer de modo amadurecido. A CADS não foi criada em nosso governo, mas isso não impediu que déssemos efetivo apoio, por exemplo, à Parada de São Paulo. O combate à discriminação foi prioridade na minha administração e muitas ações foram realizadas, sobretudo de sensibilização e formação de profissionais de saúde e educação. Fomos pioneiros em estender os benefícios de pensão a companheiros e companheiras de servidores municipais e abrimos espaço no Orçamento Participativo para a temática LGBT. Avançamos até onde podíamos, e, agora, que estamos num outro momento e contando com a CADS, temos como continuar o trabalho em outro patamar. É importante destacar que vamos contar e somar esforços com um trabalho muito importante, desenvolvido atualmente pelo governo federal, que praticamente acaba de promover a Conferência Nacional LGBT. A realidade da organização dos ativistas hoje é diferente até em nível nacional. Melhorou interlocução, acesso e respostas.

Como avalia a atual gestão no que diz respeito às políticas destinadas à população LGBT?
Não vejo que tenha havido, nos últimos quatro anos, um planejamento estratégico que apontasse as maiores necessidades e lacunas, muito menos os caminhos a serem trilhados para a superação das mesmas. E isso não é uma questão pontual. Faltou planejamento em praticamente todas as áreas do governo municipal. Muitos eventos foram realizados, mas não algo que "amarre" as iniciativas, que lhes dê consistência. Falta a São Paulo um efetivo Plano de Combate à Homofobia, por exemplo.

O atual prefeito, Gilberto Kassab, vetou na íntegra um PL que previa sanções no âmbito do município paulistano às atitudes/ataques homofóbicos. O que pensa a respeito?
O prefeito se equivocou ao vetar o projeto. Várias cidades e estados têm leis semelhantes. Para tentar remediar a situação, o prefeito enviou um outro projeto para a Câmara, que está lá, parado. Ou seja, não há prioridade real da administração com a questão LGBT. Por que a base do governo não vota o projeto do prefeito, como vota tantos outros? Onde está o compromisso verdadeiro com a cidadania deste setor da população?

É a favor de se instituir na grade curricular das escolas municipais o ensino da diversidade sexual?
Minha posição pessoal – mas que pode e deve ser discutida com os gestores e profissionais de educação – é que não adianta aumentar infinitamente a grade curricular. Acho que a preocupação humanista e a consciência da cidadania deveria ser aplicada pela escola desde a mais tenra idade até o término da escolarização. Mas isso tem que ser feito de modo a permear todo o conteúdo e todas as atividades do ensino. Além disso, antes de ser homofóbica, não podemos esquecer, a escola é machista: trata de maneira diferente meninos e meninas, ensina-lhes que têm lugares distintos na sociedade. A escola precisa, isto sim, fazer um trabalho sério com relação a toda diversidade: social, de classes, cultural, geracional, racial, de gênero e sexual. O trabalho é amplo.

A cidade de São Paulo tem sofrido ultimamente com inúmeros ataques homofóbicos. Nesse sentido, há alguma proposta para diminuir tais ocorrências?
Combater a violência contra cidadãos LGBTs, garantindo integridade física e moral, é dever da Polícia, que está sob responsabilidade do governo do Estado. O que é possível fazer é trabalhar de forma articulada com o Estado e também junto às propostas, hoje discutidas com o governo federal, para aumentar a eficácia das ações preventivas e ao mesmo tempo sensibilizar toda a sociedade. Na Prefeitura, de modo prático, podemos sensibilizar e capacitar a Guarda Civil Metropolitana para ser, dentro de suas atribuições, mais uma aliada no combate à homofobia, por exemplo, ao auxiliar na segurança preventiva e comunitária.

Há proposta no sentido de criar uma Secretaria destinada aos LGBTs?
A estrutura atual da Prefeitura conta com questões específicas em Coordenadorias, como é o caso das mulheres, da população negra, das pessoas deficientes, etc. Para avançar em resultados, creio que a questão passa hoje menos pela formulação de um órgão e mais na promoção de políticas públicas que tragam resultados efetivos. Já falamos em fortalecimento da Coordenadoria dos Assuntos da Diversidade Sexual (CADS).

Em 2000, a senhora esteve no clube noturno A Lôca para fazer campanha, hoje em dia faria novamente tal ato?
Estive na casa a convite de uma candidata lésbica a vereadora pelo PT. Não tive e não tenho preconceito ou limitações para ir onde quer que seja para dialogar com a população. 

Em recente entrevista, o escritor João Silvério Trevisan fez o seguinte comentário em relação a sua gestão no que diz respeito ao segmento LGBT: "O PT na cidade de São Paulo foi um dos mais avessos à comunidade homossexual paulistana, por incrível que pudesse parecer a todos(as) nós que lutamos para eleger Marta. Ambiciosa por uma carreira política de longo alcance, a então prefeita preferiu nos dar as costas e mostrar-se mais palatável aos eleitores evangélicos e conservadores".  Gostaria que a senhora comentasse tal declaração.
Meu compromisso como mulher e cidadã com causa LGBT é reconhecido e vem desde os tempos da TV Mulher, do meu trabalho como psicóloga, como deputada e continuará sempre. Fizemos muito como prefeita e fizemos muito no Ministério do Turismo, com várias iniciativas voltadas à promoção do turismo deste segmento. Tenho certeza absoluta de que os LBGTs paulistanos reconhecem nosso trabalho.

Se um candidato à prefeitura ou a outro cargo do executivo for assumidamente homossexual, isso pode ser fundamental para a vitória ou para derrota?
Já disse, em outras ocasiões, que preconceito demora muito para ser desfeito. Estamos hoje lutando para o reconhecimento de que homossexuais são cidadãos que merecem respeito e devem ser tratados com os mesmos direitos e deveres dos que não são homossexuais – a maioria. Mas, o fato é que seu exemplo é hipotético. Não tivemos situação parecida para balizar uma resposta do eleitorado. Prefiro acreditar que hoje se valoriza mais o caráter, a honestidade e, sobretudo, as propostas concretas do candidato ou candidata.

Durante a I Conferência Nacional LGBT, em muitos momentos o seu projeto de lei, que prevê a legalização da União Civil homoafetiva, foi citado. Quais os fatores que você atribui a não aprovação do mesmo?
O projeto de lei em prol do reconhecimento da união civil entre pessoas do mesmo sexo foi apresentado há mais de uma década, quando o tabu era maior. De lá para cá, não vimos sua aprovação no Congresso acontecer, mas vimos que ele cumpriu um papel importante, ao colocar, de maneira corajosa e inovadora, o debate não só no Congresso Nacional, mas na sociedade. E vimos o Judiciário avançar muito desde então. Tanto que o projeto, hoje, já está até superado, em alguns pontos, por diversas decisões judiciais mais avançadas. Mas esta é uma questão importante: a votação de um projeto que consolide direitos. Acho que é preciso votar os avanços que já têm um entendimento pacífico na Justiça. A gente acaba liberando a pauta da Justiça, e confere o direito que é visto como líquido e certo à população homossexual. 

Você eleita, o Orçamento Participativo (OP) voltará?  Nesse caso, a demanda LGBT dentro do OP, também? Em sua opinião, por que acabaram com o OP?
O Orçamento Participativo foi mesmo muito importante. O nosso programa para a próxima gestão vai continuar valorizando a participação popular. Temos a questão do conselho de representantes, e os de saúde, habitação, e hoje também há ferramentas mais avançadas de comunicação virtual. Se eleita, vou retomar, com certeza, a participação popular e a demanda LGBT estará contemplada. Vamos ouvir o segmento, como fizemos no OP. Podemos evoluir em relação ao que fizemos.

Para finalizar, gostaríamos que a senhora, caso eleita, nos fale como será uma prefeitura da Marta Suplicy no que diz respeito ao segmento LGBT?
Aberta, transparente, acolhedora. Prometo diálogo e respeito, como foi no governo anterior, só que com mais instrumentos de participação. Juntos, vamos trabalhar contra toda forma de preconceito e discriminação e pela inclusão do segmento nos espaços da cidade, nas comunidades.

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