Série expõe preconceitos que persistem após o fim do mundo e levanta debates sobre representatividade LGBTQIA+
Na segunda temporada de The Last of Us, a homofobia ganha um destaque incômodo e revelador dentro do universo pós-apocalíptico da série. Mesmo após a devastação e o caos, onde se esperaria um novo começo livre de velhos preconceitos, o ódio contra a comunidade LGBTQIA+ persiste, representado pelo personagem Seth, um bartender que profere insultos lesbofóbicos em público contra Ellie e Dina, o casal central da trama.
Esse episódio não é apenas uma cena isolada de intolerância; a narrativa insiste em revisitar Seth, tentando humanizá-lo e até transformá-lo em um aliado no decorrer da temporada. Essa escolha criativa tem gerado debates sobre o quanto a série realmente compreende o peso do preconceito e como ele se manifesta em grupos fechados, como a comunidade de Jackson, Wyoming, onde a história se passa.
Preconceito seletivo em um mundo dividido
The Last of Us constrói seu universo em torno de grupos insulares, altamente militarizados e fragmentados, marcados por lógicas de “nós contra eles”. No entanto, é curioso notar que, apesar desse tribalismo exacerbado, outras formas de preconceito como racismo e sexismo parecem quase ausentes, enquanto a homofobia é evidenciada de forma explícita. Isso cria uma contradição difícil de ignorar, especialmente considerando que o apocalipse é ambientado em 2003, época em que essas discriminações ainda eram muito presentes.
O fato de a homofobia ser o único preconceito claramente explorado na série, enquanto outros são deixados de lado ou minimizados, revela uma visão rasa e limitada sobre como as dinâmicas sociais e opressões funcionam em contextos extremos. Ignorar a interseccionalidade das opressões enfraquece o mundo ficcional, tornando-o menos crível para o público que vive essas realidades cotidianamente.
O impacto para a audiência LGBTQIA+
Para o público LGBTQIA+, especialmente para quem buscava uma representação mais respeitosa e empoderadora, a insistência em mostrar que Ellie precisa engolir o preconceito e até apertar a mão do agressor é dolorosa e frustrante. A mensagem implícita de que o preconceito é algo que simplesmente sobreviveu ao apocalipse e que, de certa forma, deve ser tolerado para manter a coesão social dentro da comunidade, não contribui para uma narrativa de resistência ou superação.
Além disso, a escolha de dar a Seth um arco redentor, sem que ele passe por uma transformação real ou que as consequências de sua atitude sejam duras, pode ser interpretada como um alívio narrativo que minimiza o impacto da homofobia, como se fosse um problema menor dentro do universo da série.
Reflexões sobre representatividade e construção de mundos
The Last of Us parte de um cenário onde a diversidade visual é valorizada, com grupos de sobreviventes compostos por pessoas de diferentes gêneros e etnias em papéis de liderança e combate. Contudo, essa diversidade parece incompatível com a presença contínua da homofobia, que acaba se tornando um elemento isolado e quase simbólico do conflito social.
Ao não explorar de forma mais profunda as raízes e consequências dos preconceitos, a série perde a oportunidade de enriquecer seu universo narrativo e provocar reflexões mais complexas sobre identidade, pertencimento e resistência. Para a comunidade LGBTQIA+, que busca histórias onde possa se ver representada com respeito e autenticidade, essa abordagem rasa pode parecer um retrocesso.
Em um momento em que a cultura pop avança na discussão sobre diversidade e inclusão, é essencial que produções como The Last of Us revisem suas escolhas narrativas para que os personagens LGBTQIA+ não sejam apenas vítimas ou símbolos de preconceito, mas protagonistas reais de suas próprias histórias de luta e sobrevivência.
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