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Você é gay ou bicha?

A pergunta que dá título a este texto pode parecer uma coisa atrasada e batida, mas não é. Duas recentes matérias aqui do A Capa levantaram esta polêmica, isso porque ambas carregavam a palavra "bicha" em seus respectivos títulos: "Bichas do rock" e "Bichas invadem a novela Ti ti ti". Choveram comentários. A maioria contra o uso da palavra e poucos favoráveis.

Mas, qual é a origem da palavra bicha? Segundo o pesquisador James Green, em seu livro "Além do Carnaval", não existe uma definição certa para a sua origem, existe uma hipótese: o termo apareceu no inicio do século XX e acredita-se que é uma adaptação da palavra francesa "biche", que significa corsa, feminino de veado. A palavra "biche" também era usada para se referir à jovem mulher francesa. Já no Brasil, a palavra "biche", que viraria "bicha", seria usada no começo do século XX para designar as prostitutas.

Ou seja, percebemos que a origem da palavra bicha tem a sua raiz ligada às mulheres. Porém, não há estudo que aponte o momento histórico da apropriação da palavra entre homossexuais. O que se sabe é que os homossexuais começaram a se tratar por "bicha" desde o início do século XX. Com a explicação, podemos levantar uma hipótese para a aversão das pessoas pelo termo: sua conotação feminina. Por conta de um machismo cultural que marca homossexuais e héteros, ninguém quer ser referenciado como feminino ou passivo.

E a palavra gay? Essa é usada desde o começo do século XX nos Estados Unidos. Inicialmente o termo servia para designar homens que faziam sexo com outros homens. Foi nos anos 60 que o movimento passou a utilizá-la para denominar orientação sexual homo.

Qual é o problema com a palavra bicha?
A outra resposta quem fornece é João Silvério Trevisan em sua obra "Devassos no Paraíso" – leitura obrigatória, diga-se -, que após o boom da Aids houve uma metamorfose na cultura homossexual no Brasil. Passou-se a idealizar o homem másculo, viril e saudável. Os homossexuais queriam se distanciar da imagem da bicha feminina, que tanto figurou os anos 60 e 70, e surge aí a famosa "Barbie". Toda trabalhada no músculo.

Já a palavra gay chegou como muita coisa chega ao Brasil: importada e sem qualquer referência histórica com os homossexuais brasileiros. Ou seja, antes de ser algo pejorativo, a palavra bicha é para definir o sujeito que vive fora da sexualidade aceita pela sociedade, e quando este opta por ser chamado de "gay" está na verdade se higienizando, da mesma maneira que muito gays depreciam aqueles que são passivos e femininos. Machistas e higienistas.

Sendo assim, a palavra bicha se torna um "xingamento" até mesmo entre os homossexuais, quando, na verdade, deveria ser o contrário. É notório que as duas últimas gerações tem optado por chamar os amigos de bicha, beesha e bee. Menos preconceito e menos machismo. Não que este último esteja desaparecendo.

Portanto, o problema não está no fato de usar ou não a palavra bicha para denominar gays masculinos e femininos. Sim, elas também são bichas. O problema está no machismo que ainda assola os homossexuais. O problema está em ainda se achar que a "bicha" é aquela feminina e passiva. Quando na verdade bich@s som@s tod@s n@s.

O repúdio pela palavra bicha nada mais é do que reforçar todo o preconceito com o qual os homossexuais são vitimas. Ou como diria Judith Butler, tal preconceito é "atender os objetivos reprodutivos de um sistema de heterossexualidade compulsória". É preciso entender que as masculinidades e as feminilidades "não são naturais, mas uma ideia cultural" (Simone de Beauvoir). Os Dzi Croquettes nunca fizeram tanto sentido.

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