O estudo norte-americano da PrEP (profilaxia da pré-exposição ao HIV) chegou ao Brasil em 2014 e, neste ano, há centenas de pessoas participando. A promessa é que, com apenas um comprimido de Truvada todos os dias, você fica livre do contágio ao HIV.
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No Brasil, o estudo sobre os retrovirais é feito pela FioCruz, no Rio de Janeiro, e pela USP, em São Paulo. E o objetivo é encontrar de quais formas a PrEP possa ser adotada pelo Sistema Único de Saúde e seja utilizada como mais uma ferramenta ao combate ao HIV/Aids.
Na Conferência sobre Retrovírus e Infecções Oportunistas (CRIO), em Seatle, Estados Unidos, o nível de eficácia foi de 86% – ou seja, para cada 20 infecções que poderiam ter ocorrido, 17 foram impedidas pela PrEP.
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O assunto ainda causa polêmica, sobretudo quando é encarado como uma substituição do preservativo ou prática do bareback. E o A CAPA conversou com um dos participantes, o DJ e sócio do sex shop Atirados, Bruno Chagas. Aos 28 anos, ele toma todos os dias o comprimido e fala sobre a experiência, efeitos colaterais e mitos.
Leia:
– Falar sobre a PrEP envolve mitos e preconceitos. Em sua opinião, qual é a principal informação que precisa ser passada e desmistificada sobre a PrEP?
Muitos associam o uso do PrEP com a prática de bareback (sexo sem camisinha). É importante deixarmos claro que o PrEP é apenas um adicional na prevenção e não uma substituição.
– O que te motivou a participar do estudo da PrEP no Brasil?
Eu fiquei sabendo sobre o PrEP em uma sauna, a qual frequento. O cartaz dizia: "Um comprimido por dia pode prevenir o HIV". Na hora eu me interessei e procurei o estudo já no dia seguinte. Me considero um militante na luta pela descoberta da cura da AIDS e sempre procurei estar por dentro de projetos e estudos deste tema. Acho de extrema importância que pessoas se tornem voluntárias de estudos como esse.
Sim. Foram algumas consultas com médicos e psicólogos, além de uma bateria de exames. Depois de duas consultas eles me classificaram como apto a me tornar voluntário do estudo. Eu confio plenamente no estudo e nos profissionais envolvidos. Por isso, decidi, em dezembro do ano passado a começar a tomar.
– Qual é a rotina que você tem com o medicamento? Sentiu algum efeito colateral?
Eu tomo um comprimido do Truvada por dia. E eu não sinto nada. No meu caso, não observei nenhum efeito colateral. Entretanto, tomar um comprimido por dia não é tão simples. É preciso disciplina e certa "coragem". Afinal, você está tomando uma medicação.
– Apesar do tratamento, o "medo" de se contaminar ainda é presente durante o procedimento ou no sexo? Como lida com ele?
Como eu faço PrEP em conjunto com o uso do preservativo, me sinto completamente seguro e não há medo. Antes eu sempre temia, mesmo usando preservativos. Posso dizer que sou mais feliz e mais seguro tomando o Truvada. Durante estes 8 meses, esqueci de tomar apenas um dia, então não tem como falhar.
– A sua vida sexual mudou depois da PrEP?
Me sinto apenas mais seguro e sem neuras.
– O que os parceiros dizem sobre isso? Aceitariam transar sem camisinha?
A camisinha continua fazendo parte, no meu caso. Outras pessoas realmente deixam de usar, mas isso é uma questão individual. É importante deixar claro, que o Truvada previne apenas o HIV e mais nenhuma outra DST. Acredito que o uso do preservativo em conjunto com o Truvada seja o ideal para aqueles que queiram se sentir mais seguros.
– Tem conversado com outras pessoas que também passam por esta experiência? O que elas dizem?
Infelizmente não é um assunto tão comum em conversa com amigos. Conheço poucas pessoas que fazem PrEP e todas elas não gostam muito de falar a respeito. Eu sou um dos poucos que gosta de falar abertamente sobre o assunto. Mas é unanime que todos se sentem mais seguros e felizes. Acredito que no estudo que eu sou voluntário existem cerca de 500 homens participando.
– Uma curiosidade: muda a coloração ou consistência do esperma?
Não, não muda.
– Da sua experiência, o que tem de melhor e pior na PreP?
O melhor é se sentir mais seguro. Já o pior é ser visto como "promíscuo". Acredito que algumas pessoas pensam isso de mim, mas eu não ligo.
Não sei se é a melhor, mas torço para que o governo adote o PrEP assim como acabou de adotar a PEP. Acredito que haverá uma grande diminuição de pessoas contaminadas pelo HIV. O Truvada ainda não é regulamentado pela ANVISA aqui no Brasil e é um medicamento comercial e caro.
Nos EUA há uma quantidade grande de gays fazendo PrEP, inclusive subsidiado por planos de saúde. Penso que todas as formas de prevenção devam ser adotadas. Eu torço para que em um futuro próximo o Truvada esteja acessível para todos aqueles que queiram usá-lo como um aliado na prevenção.
– Tem alguma informação que você acha importante a gente passar para os leitores?
Existem muitos gays, inclusive os mais jovens, que deixaram de usar o preservativo nos últimos anos. Não condeno aqueles que adotaram esta prática e acredito que é uma escolha individual e que não deve ser julgada pela sociedade. Entretanto, esses gays precisam tomar conhecimento de que existe uma nova maneira de prevenir o HIV fazendo o PrEP. O termo "PrEP" ainda é desconhecido de muitos jovens gays.