Ang Lee já tocava no tema de forma delicada muito antes do maravilhoso O Segredo de Brokeback Mountain. Em 1993, O Banquete de Casamento encantou plateias ao tratar o tema da homossexualidade de maneira divertida, intensa e sem apelos típicos dos estereótipos sobre o assunto. Passeando por temas que vão desde choques culturais aos conflitos da homossexualidade não assumida, o diretor investe na comédia para neutralizar o drama vivido pelas personagens e os conflitos internos oriundos da condição omissa de viver trancado no armário.
O roteiro é assinado por Ang Lee em parceria com Neil Leng e James Schamus. No enredo, Wai-Tung Gao (Winston Chao, excelente), vive um relacionamento intenso com Simon (Mitchell Litchstein, carismático). Os pais de Wai-Tung moram em Taiwan e desejam que o filho case e tenha filhos, sem ao menos desconfiar que o bem sucedido Winston é homossexual e mora com outro homem.
A sua mãe quer fazer de tudo para que o filho case. Envia-lhe uma ficha para que ele preencha e logo depois, ela inclua em uma rede de relacionamentos. Visando afastar ao máximo uma presença feminina em sua vida, Wai-Tung solicita uma mulher com dois doutorados, cantora de ópera e 1,79 m de altura. Não vai demorar muito para a mãe encontrar e a enviar para o filho. Após perceber que a namoradinha arranjada não deu certo, a mãe de Wai-Tung, acompanhada do pai, cansado, recém infartado, segue para o país para umas férias de duas semanas. A relação de Simon e Wai-Tung, desta forma, vai passar por alguns ajustes, visando apresentar para os recém-chegados um estilo de vida contrário ao que o casal está acostumado a trilhar.
Além das mudanças na casa, incorporando detalhes da cultura oriental, como tapetes e retirada de itens que remetem ao universo homossexual, como vídeos pornôs e afins, Simon e Wai-Tung precisam arranjar uma namorada para disfarçar a situação: é ai que entra Wei-Wei. A personagem Wei-Wei (May Chin, hilária) é construída de forma a dar possibilidade que os plots e situações da proposta inicial do roteiro se desenvolvam de forma natural, com bastante verossimilhança. O roteiro prefere manter informações sobre a vida de Simon, parceiro de Wai-Tung, às escuras, aprofundando na relação da chegada dos pais do oriental e os contratempos que marcarão esta inusitada visita.
Wei-Wei precisa aprender sobre o universo de Wai-Tung: compreender que ele é um yupiie, um jovem bem sucedido profissionalmente nos Estados Unidos, ler suas revistas, entender o seu espaço. A mesma coisa vai precisar fazer Wai-Tung, ajudando, inclusive, Wei-Wei, que está desesperada por um casamento para conseguir o tão desejado Green card.
A direção de Ang Lee consegue deixar o casal Gao, pais de Winston, ainda mais naturais na performance. Ambos carismáticos, ganham a simpatia do espectador ao passo que segredos são revelados durante o enredo.
O Banquete de Casamento toca, com delicadeza, em questões como aborto, infidelidade, imigração e novos padrões de família, muito antes do queridinho Minhas mães e meu pai, dirigido por Lisa Cholodenko, em 2010, indicado ao Oscar e super comentado pela crítica. Diríamos que Ang Lee faz uma versão contrária, intitulada Meus pais e minha mãe: o leitor, claro, vai precisar assistir para compreender o que digo.
No que tange a outros aspectos da técnica, O Banquete de Casamento consegue sair na média, com o ritmo da edição de Tim Squyres e a fotografia discreta de Jong Li. Com 103 minutos de duração, o filme perde o ritmo em alguns momentos, mas nada que atrapalhe a diversão e a fluência do roteiro. Para os curiosos, o diretor Ang Lee aparece rapidamente em uma cena, no banquete de casamento.
"O Banquete de Casamento" – Nota 8 – Filme disponível em DVD.
*Leonardo Campos escreve quinzenalmente neste espaço sobre cinema e lançamentos em DVD. É pesquisador em cinema, literatura e cultura da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e professor de literatura.